Crítica
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Sinopse
Madeleine choca filhos e netos durante a sua festa de 92 anos ao dizer que definiu o dia exato de sua morte. Depois disso, uma série de conflitos familiares transforma esse período de aceitação do luto num verdadeiro campo de batalha familiar.
Crítica
Na festa de seus 92 anos, em meio às atenções parciais de parentes que adiam seu discurso por motivos banais, Madeleine (Marthe Villalonga) anuncia que decidiu morrer por não suportar mais as inúmeras restrições que a idade avançada lhe impõe. A celebração se torna, assim, um prenúncio de luto para aquela família retratada pelo diretor Pascale Pouzadoux como outra qualquer, sem apelos significativos ao desenho de singularidades, afinal de contas o que parece lhe interessar sobremaneira, desde o início, é o impacto do comunicado, especificamente na filha mais velha, Diane (Sandrine Bonnaire). A Última Lição flerta constante e perigosamente com o piegas. A flagrante necessidade de apresentar motivos pelos quais devemos, de certa forma, aderir totalmente à causa da idosa, às vezes é excessiva. Enquanto a privação da direção do automóvel se dá numa cena sutil, a reiteração da incontinência urinária noturna se equilibra com dificuldade entre a sensibilidade e a apelação.
Há boas intenções evidentes na construção de uma personagem carismática que não parece disposta a voltar atrás numa questão tão polêmica quanto sua morte antecipada. Isso é reforçado pelos registros da juventude de Madeleine, lampejos em que ficamos sabendo do passado de ativismo dela, no qual pregava ser indispensável cada um resolver o destino do seu corpo e, por conseguinte, definir a hora de morrer. Todavia, Pascale Pouzadoux demonstra seguidamente a fragilidade de sua encenação que não corrige as inconstâncias de um roteiro que permite às personagens, por exemplo, vivenciar em episódios subsequentes a consternação diante da morte iminente e a euforia decorrente de um passeio de cadeira de rodas. A Última Lição não estabelece um percurso muito claro que dê conta, especialmente, da compreensão de Diane quanto à decisão difícil tomada por sua mãe. De uma hora para outra ela resolve fazer a vontade da mulher que lhe deu a luz, sem mais aquela.
As coisas entram um pouco mais nos eixos quando Pascale Pouzadoux praticamente relega à figuração os demais membros da família, felizmente dando menos atenção ao dilema do neto que está prestes a sair de casa e mesmo ao caçula extremamente revoltado com a resolução curiosa da mãe. Ao focar-se basicamente na terna relação estabelecida entre Madeleine e Diane, A Última Lição ganha bastante no quesito emocional, proporcionando ao espectador eventos genuinamente bonitos, como a visita que aproxima, depois de muitos anos, os amantes de um passado longínquo. Fica a impressão de que com menos pessoas para lidar, Pouzadoux consegue desenvolver o essencial, mergulhando mais fundo, sem tanta solenidade e desespero, na complexidade do desejo de Madeleine. Percebemos, então, que para uma mulher tão vívida quanto ela, morrer não é entregar os pontos diante dos sintomas da velhice, mas fazer jus a quem sempre foi, algo que a decrepitude não lhe deixa mais.
No que tange à Diane, a interpretação de Sandrine Bonnaire é imprescindível para deflagrar minimamente os diversos estágios do luto precipitado. A depender do trabalho esforçado, porém inseguro, de Pascale Pouzadoux, a tendência seria unificar o manancial de sentimentos tão e somente na dor da perda. A despeito de descuidos eventuais de produção que depõem contra o todo, pois ocasionam ligeiro artificialismo em determinadas cenas, vide as com vídeos familiares sem as óbvias marcas do tempo, A Última Lição até que atinge algum grau de beleza, sobretudo ao deter sua atenção na comoção das duas protagonistas. Enquanto uma luta para entender as motivações alheias, precisando para isso despir-se inclusive do egoísmo a fim de deixar as coisas simplesmente acontecerem, a outra se esmera para garantir a liberdade de morrer ao se dar conta de que a vida não mais lhe traz felicidade. Mesmo diluída nas fragilidades da dramaturgia e da direção, a dicotomia vida-morte surge, moderada, mas com expressividade.
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