Crítica


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Sinopse

Localizado na Noruega, o fiorde de Geiranger é um dos pontos turísticos mais espetaculares da região, mas também é um local propício para cataclismas. Após anos no centro de alerta do local, o geólogo Kristian sente que alguma coisa não está normal. Os substratos estão mudando. Em plena alta temporada turística, quando um deslizamento das montanhas próximas provocam uma onda gigante, os moradores e visitantes terão apenas dez minutos para garantir escaparem até um lugar seguro.

Crítica

Segundo dados oficiais, há mais de 300 ‘montanhas-vivas’ na Noruega. Ou seja, formações que estão em constante transformação, em expansão e/ou se comprimindo. Esses movimentos podem ser gigantescos e percebidos há distâncias consideráveis, mas, na maioria das vezes, se dão de modo tão discreto que apenas os instrumentos mais apurados conseguem registrar suas ocorrências. E como há uma infinidade de lagos e, principalmente, fiordes no país, é bem provável que, no caso de um deslizamento de terra, sejam neles que esses excessos irão parar, gerando transtornos que não serão facilmente contornados. Por isso, a incidência de um tsunami – mais comumente associado a regiões litorâneas, como no sudeste Asiático – no norte da Europa não é uma realidade que possa ser encarada de forma leviana. Não se trata de uma questão de ‘se’, e sim de ‘quando’. E é justamente sobre isso que trata, com bastante propriedade e incrível recriação de detalhes, esse A Onda.

Kristian (Kristoffer Joner) é um geólogo que, após anos de cuidados excessivos no trabalho que realiza de monitoramento de montanhas na região onde mora, no interior norueguês, finalmente encontra uma oportunidade de mudar de vida ao ser chamado para um novo emprego em uma estação de petróleo. O filho mais velho, Sondre (Jonas Hoff Oftebro, de Ragnarok, 2020), reluta, enquanto que a caçula, Julia (Edith Haagenrud-Sande) é mais entusiasta. No entanto, quem vê na mudança uma chance única de recomeçarem, tanto enquanto família como em casal, é a esposa e mãe das crianças, Idun (Ane Dahl Torp, de Zumbis na Neve, 2009). Ela está disposta a largar o emprego no hotel onde trabalha como recepcionista para ir com o marido e filhos em busca dessa reconexão, num novo cenário e com outras preocupações em mente. Mas no dia de irem embora, um pressentimento o impede de sair. Os números estão estranhos, e a unidade de controle reluta em assumir que algo muito ruim pode estar se armando. Caberá a ele, portanto, dar o grito de alerta.

Como se vê, o filme de Roar Uthaug – que, graças ao sucesso desse projeto, logo foi cooptado por Hollywood e coordenou, em seguida, o reboot Tomb Raider: A Origem (2018) – gasta praticamente metade do seu desenvolvimento apenas armando o cenário para o que vem a seguir. Estamos diante de um legítimo filme-catástrofe – disso não há a menor dúvida – mas quem o acompanha de forma atenta desde os primeiros instantes terá alguma dificuldade em abraçar essa possibilidade de imediato. É quase um drama familiar, de tão sutil que os eventos se dão. Isso, no entanto, se revela crucial para o envolvimento do público com os personagens, em particular com a família que está no centro dos acontecimentos. Pois, como é dito desde o letreiro de abertura até sua conclusão, não se fala aqui de probabilidades alienígenas nem em conjecturas impossíveis. A narrativa tem apoio científico, e se nada parecido se sucedeu na região até hoje, é certo que mais cedo ou mais tarde essa realidade irromperá. E apenas os mais preparados sobreviverão.

Não obstante a quantidade de avisos, Kristian e Idun estarão separados no momento da tragédia, cada um com um dos filhos ao seu lado. Conseguirá ele fugir com a menina, diante de carros literalmente parados em um congestionamento monstro e no meio de uma multidão que não consegue acreditar que algo tão ruim possa, de fato, acontecer? Ou como ela irá lidar com o adolescente que, sempre de fones de ouvido, será o último a saber da tragédia que se aproxima? Enquanto uns se esforçam para subir as montanhas para se colocarem acima no nível previsto da água, outros irão no sentido contrário, optando por se refugiarem em bunkers e câmaras isoladas. Mas, quando o desespero se fizer presente, como agir de forma racional?

Inacreditavelmente tenso e bastante equilibrado entre seus momentos de calmaria e outros de controle de danos, A Onda consegue usar dos elementos que dispõe a seu favor, fazendo do espetáculo da natureza – e do uso de efeitos visuais – não uma muleta, mas uma ferramenta de avanço e envolvimento na narrativa. E se o elenco demonstra entendimento do que deles se espera, tanto Joner quanto Dahl Torp, em momentos e performances distintas, conduzem a história com domínio e precisão, um abusando da emoção, enquanto que o outro revela um olhar certeiro para se desvencilhar dos problemas à medida que os mesmos vão surgindo. Um dos maiores sucessos de público do cinema norueguês e escolhido para representar o país no Oscar daquele ano, é uma obra que funciona em mais de um nível de compreensão, agindo tanto em busca de reações imediatas como na compreensão das relações entre os homens e destes com o ambiente que os cerca. É uma festa para os sentidos, mas também, e talvez mais do que qualquer coisa, um alerta que não pode ser ignorado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Robledo Milani
7
Edu Fernandes
8
MÉDIA
7.5

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