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Sinopse

No fim do século XIX, a Revolução Federalista marcou o sul do Brasil. Na época, o caudilho revolucionário Gumercindo Saraiva foi assassinado pelos legalistas. O filho dele, Francisco Saraiva, parte com cinco cavaleiros para resgatar a cabeça do pai, cortada pelo Major Ramiro de Oliveira.

Crítica

As narrativas históricas que tratam do passado do Rio Grande do Sul seguem sendo o pilar central da obra de Tabajara Ruas. Em A Cabeça de Gumercindo Saraiva, seu quarto longa de ficção,o escritor e cineasta se volta a um episódio marcante da Revolução Federalista – conflito ocorrido no sul do Brasil entre 1893 e 1895 – quando o líder dos rebeldes (conhecidos como maragatos), Gumercindo Saraiva, foi assassinado pelos soldados governistas (os chimangos), sendo decapitado e tendo sua cabeça enviada ao governador Júlio de Castilhos. As versões dadas ao ocorrido ao longo dos anos fizeram com que este ganhasse uma aura mítica dentro da cultura gaúcha, o que oferece a Ruas grande liberdade para criar sua própria versão, trazendo a jornada de Francisco Saraiva (Leonardo Machado), filho de Gumercindo, em busca da cabeça do pai, em posse do Major Ramiro de Oliveira (Murilo Rosa), encarregado de levá-la a Porto Alegre.

Reduzindo a escala e as ambições épicas de seus longas anteriores, como Netto Perde Sua Alma (2001) e Senhores da Guerra (2012), ao focar em uma trama de viés mais intimista – ainda que inserida em um contexto maior – Ruas transita pelos arquétipos do faroeste de travessia, com suas perseguições a cavalo e emboscadas. Opção que soa natural, já que a dinâmica do conflito que retrata lembra aquela da Guerra Civil Americana – do embate entre Confederados e Soldados da União, que tantas vezes serviu como pano de fundo para os westerns de Hollywood – e a premissa que tem em mãos se presta a essa veia aventuresca, da ação, bem como se abre ao âmbito evocativo, da lenda. Na tentativa de explorar o primeiro aspecto, porém, o cineasta carece de um maior domínio de mise-en-scènepara conceber os set-piecesde ação. Apesar de não economizar no sangue e no grafismo da violência, os tiroteios, tocaias e embates corpo a corpo perdem seu peso devido a uma encenação frágil e artificial.

No segundo quesito, o longa também se mostra falho, sem conseguir estabelecer a desejada atmosfera mítica, da lenda que se torna maior do que o fato, pois mesmo que todos os personagens vivam repetindo o nome de Gumercindo, essa sua onipresença nunca é sentida. O mesmo ocorre com os flertes da narrativa com o fantástico/sobrenatural, seja na sequência da alucinação do Major Ramiro, ou em toda a passagem que trata do acampamento dos governistas liderado por um militar insano que manda degolar mais de setenta prisioneiros, além de dizer ter sido visitado pelo espírito de Gumercindo. Há em tudo isso um potencial não desenvolvido plenamente por Ruas para adentrar, de forma mais incisiva, o terreno psicológico e filosófico, da loucura causada pela barbárie, da desumanidade da guerra.

É bem verdade que o cineasta até busca explorar tal elemento, apresentando um olhar externo através da figura do Major Ramiro, um paulista imerso nas peculiaridades gaúchas, que sem a motivação local de seus aliados e inimigos, se mantém fiel a um código de honra pessoal, desejando apenas cumprir a missão que lhe foi dada. Entretanto, a tentativa do diretor esbarra na falta de aprofundamento no contexto histórico e, ainda que Murilo Rosa se entregue, o roteiro não o municia devidamente para que imprima a complexidade esperada ao personagem. Do outro lado, Leonardo Machado apresenta um empenho igualmente perceptível, buscando dar estofo aos conflitos de Francisco, como aqueles de ordem familiar envolvendo o meio-irmão (vivido por Marcos Pitombo). Além das atuações principais, embora o elenco secundário seja irregular, a produção possui alguns outros méritos, como a plasticidade da direção de fotografia.

Compondo alguns belos enquadramentos, Ruas extrai o máximo das paisagens naturais do interior gaúcho, conferindo a elas uma magnitude que preenche toda a tela – mesmo que talvez se exceda nos planos aéreos de transição. Contudo, esse apuro estético, bem como momentos isolados de inspiração – como utilizar a ópera Pagliacci para pontuar o fim da “comédia de erros da guerra/política”– não são suficientes para sustentar A Cabeça de Gumercindo Saraiva, uma bem-vinda tentativa de exercício de gênero mergulhada em raízes regionais brasileiras, mas realizada sem o domínio necessário para potencializar seu interessante ponto de partida.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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Grade crítica

CríticoNota
Leonardo Ribeiro
5
Robledo Milani
6
MÉDIA
5.5

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