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Sinopse

Mike é um famoso escritor de tramas centradas em lugares assombrados. Sem dar atenções para as advertências, ele resolve explorar os mistérios do quarto 1408 do hotel Dolphin onde ninguém coloca os pés há muito tempo.

Crítica

Um escritor, atormentado por manifestações sobrenaturais em um antigo hotel, passa a questionar sua própria sanidade. A princípio, tal premissa remete diretamente a uma das mais notórias obras de Stephen King, O Iluminado, cuja adaptação dirigida por Stanley Kubrick se tornou um clássico definitivo do cinema de terror. Em 1408, o cineasta sueco Mikael Håfström parte de um argumento similar, baseado no conto homônimo de King, para realizar seu segundo trabalho hollywoodiano, reduzindo o ambiente amplo e labiríntico do Overlook Hotel de O Iluminado (1980) ao do macabro quarto 1408 do título, localizado no Dolphin Hotel. É lá que o protagonista da história, Mike Enslin (John Cusack), autor especializado em livros sobre casas mal assombradas e fenômenos paranormais - ainda que, de fato, nunca tenha presenciado algum evento do tipo - busca material para sua próxima publicação.

Instigado por antigos relatos a respeito de hóspedes mortos sob circunstâncias insólitas, Enslin decide passar a noite no quarto, mesmo contra a vontade do gerente do hotel, Gerald Olin (Samuel L. Jackson), que tenta fazer o escritor desistir da ideia, alertando-o sobre as 56 fatalidades ocorridas no local. Após utilizar o primeiro ato para estabelecer a personalidade do protagonista, seus traumas e anseios, bem como a noção de perigo que o aguarda, Håfström dedica todo o arco central da trama à ação confinada no quarto, construindo um legítimo terror de câmara. Com habilidade e o auxílio de um eficaz trabalho de direção de arte, além da bela fotografia do francês Benoît Delhomme, o cineasta explora as limitações do espaço de forma engenhosa, promovendo transformações constantes, através de elementos e sensações como a água e o fogo, o frio e o calor.

Se valendo da arquitetura gótica do hotel, Håfström direciona seu olhar a detalhes que ganham novos significados quando reapresentados – objetos, o bom uso da canção We've Only Just Begun, dos Carpenters, frases escritas nas paredes ou registradas pelo gravador de Enslin - oferecendo pistas que acabam tendo funções específicas e, à medida que são costuradas pelo roteiro, conduzem a novas revelações. Como em boa parte da obra de King, o horror surge não apenas do fator sobrenatural, mas também daquilo que habita a mente de seus personagens. Enslin, que em determinadas cenas usa um boné com a frase “Paranoia is total awareness”, se mostra a típica figura atormentada do universo de King, guardando certas semelhanças com o Jack Torrance de O Iluminado, entre elas o núcleo familiar rachado.

Esse elemento possui uma importância fundamental para o desenvolvimento do protagonista, pois é o trauma da morte de sua filha Katie (Jasmine Jessica Anthony) que o leva se afastar da esposa, Lily (Mary McCormack), sendo também o motivo de sua descrença na vida após a morte e o estopim para a mudança dos rumos de sua carreira, antes promissora - à época do lançamento de seu elogiado romance de estreia. Tal perda se torna o grande fantasma que assombra Enslin, obrigando-o a lidar com a dor. Por esse motivo, seu mergulho na espiral de delírios causada pelo 1408 é dividido em fases que espelham os cinco estágios do luto: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Há, portanto, uma construção dramática bem definida pela narrativa, que dá estofo a Enslin, especialmente por este ser um protagonista solitário durante grande parte do longa.

Tamanha exposição exige muito da atuação de Cusack, ator que se encaixa com precisão no tipo de perfil do personagem: cético, cínico, levemente arrogante e irônico. O humor sarcástico, por sinal, é uma característica que Cusack sustenta mesmo nos momentos de maior desespero vividos por Enslin em sua montanha-russa emocional. No entanto, apesar de todos os acertos, como a escalação do elenco, o trabalho de Håfström não é isento de irregularidades. Em determinado momento, a sensação de repetição causada pelas provações às quais Enslin é submetido faz com que estas, gradativamente, surpreendam menos, denunciando o prolongamento do conteúdo diminuto do conto original. Além disso, por mais que Cusack segure o filme com competência, sente-se falta do aproveitamento dos coadjuvantes, em especial do personagem de Jackson, de quem poderia se esperar uma participação/relevância maior.

Outra questão é a escalada à histeria de Enslin, que talvez ocorra mais rápido do que deveria, e algumas escolhas visuais também acabam não surtindo plenamente o efeito desejado, como os fantasmas das vítimas que se materializam enquanto imagens extraídas de antigos filmes em preto e branco. De qualquer modo, apesar dessas fragilidades, 1408 apresenta resoluções satisfatórias, incluindo as inevitáveis reviravoltas do ato final, em ambas as versões – a versão lançada em DVD possui um desfecho alternativo, de tom mais trágico, que difere consideravelmente da lançada nos cinemas. Nos dois casos, Håfström mantém sua condução segura, exibindo eficiência na ambientação e na preparação da atmosfera de suspense, mesclando bem os aspectos psicológicos à ação física que envolve todas as metamorfoses do quarto. Um resultado acima da média para as adaptações, muitas vezes decepcionantes, das obras de terror de King.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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