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Sinopse

Cinco policiais trabalham infiltrados no Complexo do Alemão, uma área que reúne diversas favelas e é considerada um dos locais mais perigosos do Rio de Janeiro. Desmascarados pelos traficantes, eles agora estão presos e aguardam que ou sejam executados ou resgatados pelas forças policiais, o que significaria na divulgação de uma missão clandestina realizada pela polícia militar.

Crítica

O senso comum diz que a polícia abusa da brutalidade no trato de cidadãos comuns, e os bandidos são criminosos inescrupulosos que matam sem pensar duas vezes. Estas são temáticas batidas no cinema brasileiro, mas que aqui e ali ainda se provam frutíferas ao gerar obras de muito sucesso e qualidade comprovada, como Cidade de Deus (2002) e Tropa de Elite (2007). Acrescente a isso uma trama de situação, que explora um acontecimento marcante através de uma fração do mesmo. Aparentemente, é um terreno fértil para se desenvolver um estudo de personagens, uma discussão política e moral, e, de quebra, grudar o espectador na cadeira com uma obra tensa e irresistível. Porém, embora não seja um completo desastre, Alemão decepciona ao se mostrar confuso e indeciso sobre que filme quer ser.

Deste modo, quase todos os departamentos do projeto podem ser classificados como irregulares. E essa é uma avaliação sem nenhum exagero. Do design de produção ao elenco, passando pelo roteiro e até a mixagem de som (!), tudo se apresenta mediano. A trama se passa nas vésperas da invasão da Favela do Morro do Alemão em 2010 e acompanha cinco policias infiltrados no tráfico de drogas local (Caio Blat, Gabriel Braga Nunes, Milhem Cortaz, Marcello Melo Jr. e Otávio Muller), que, por terem suas identidades reveladas, passam a ser perseguidos pelo chefe do crime do morro, o Playboy (Cauã Reymond). E se a ambientação da favela é realista e atenciosa com os detalhes, os figurinos dos personagens traem a ilusão ao trazerem pesadas e chamativas correntes de ouro no pescoço dos traficantes, enquanto as armas usadas pelos protagonistas parecem gritar “somos de plástico!”. Da mesma maneira, o figurino vermelho de Cauã Raymond não chamaria mais atenção nem que tivesse luzinhas de Natal penduradas! E é melhor nem mencionarmos a “performance” do “ator” – e as aspas são bem cabidas aqui.

Enquanto Marcello Melo Jr., Caio Blat e Gabriel Braga Nunes se esforçam para conferir profundidade aos seus personagens – o fato é que são cinco protagonistas e o roteiro não dá tempo suficiente a nenhum deles – Cortaz e Reymond parecem se esforçar para o contrário. O primeiro dá a entender que pontuar cada uma de suas frases com “porra” vai lhe fazer parecer durão, enquanto que isso é apenas irritante. O outro tem que rever o conceito de que, as vezes, mais é menos, pois seus trejeitos exagerados com o pescoço, ou o modo como segura sua arma e o charuto, denotam unicamente a liberdade que o também produtor do filme deu a si mesmo em um papel de destaque. Uma condição com a qual ele, infelizmente, não soube lidar. Ao invés de um personagem megalomaníaco, o que vemos em tela é um ator egocêntrico.

Uma avaliação mais detalhada sobre a execução do roteiro e da qualidade do mesmo, no entanto, fica comprometida por culpa do próprio filme, cuja mixagem de som torna simplesmente incompreensíveis muitas de suas falas. Em certo instante, enquanto ouvimos claramente o que diz Branco (Cortaz), não é possível distinguir uma só palavra dita por Danilo (Nunes), já que sua voz soa abafada, como se gravada à distância e sem ajustes na pós produção. Nem uma exibição em cópia digital, com um bom sistema de som 5.1, parece garantir qualquer melhora a respeito. Em questões mais estéticas, como fotografia e direção, Alemão, no entanto, é razoavelmente eficiente. Quase sempre filmado através de lentes tele objetivas, que tornam os enquadramentos fechados e aproximam as camadas mais distantes daquelas em primeiro plano, o filme consegue ao menos transmitir o tom claustrofóbico da situação em que seus protagonistas se encontram, além de contar com uma baixíssima profundidade de campo que quase sempre espera que os personagens assumam a posição do foco, ao invés de procurá-los com o mesmo.

Ainda que o elenco estivesse formidável, que fosse possível ouvir o que é dito com clareza e que a parte técnica fosse convincente, o projeto dirigido por José Eduardo Belmonte, ainda é tematicamente confuso. A montagem é deficiente, sem conseguir dar ritmo ao meio do filme, diferente do que acontece no começo e no fim. A mensagem continuamente explorada é a de que “nem polícia nem bandidos são inocentes”, enquanto imagens de arquivo e letreiros nos informam sobre os principais pontos da invasão da Favela do Alemão. No entanto, o roteiro jamais se decide qual abordagem quer adotar e vaga por um drama familiar, um thriller, um romance (?!) e uma denúncia política, mas jamais ousando pisar com firmeza em nenhum deles. E tal indecisão chega ao ápice do absurdo ainda durante os créditos finais, quando estes são intercalados por imagens das manifestações populares do ano passado, que pouco tem a ver com a tal invasão que o filme fala. Afinal, o que Alemão quer dizer com isso? Ou, mais urgente ainda, no fim das contas, qual a proposta disso tudo?

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é formado em Produção Audiovisual pela PUCRS, é crítico e comentarista de cinema - e eventualmente escritor, no blog “Classe de Cinema” (classedecinema.blogspot.com.br). Fascinado por História e consumidor voraz de literatura (incluindo HQ’s!), jornalismo, filmes, seriados e arte em geral.
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