Crítica


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Sinopse

Jackie desperta completamente sozinha em um barco à deriva. Ela vê um homem em terra firme, mas ao chamá-lo ele foge dela. Com muito esforço, ela consegue levar o barco até a margem, mas já não encontra alguém. Desmemoriada, passa a andar sem destino pela estrada até ser encontrada por uma policial, que a leva a um hospital.

Crítica

O início da segunda temporada de Homecoming chega a ser surpreendente, nem tanto pelo clima de mistério empregado mas, especialmente, pelas mudanças narrativas existentes entre as duas tramas já apresentadas, correlatas a partir de fórmulas distintas. Se na original saltava aos olhos o uso narrativo do formato de tela, muitas vezes alternando dentro do próprio episódio de acordo com o período temporal retratado, aqui isto não mais existe. O excesso de subtramas também foi limado, não só tornando a história mais ágil como descartando as muitas barrigas existentes na temporada original. Aqui é tudo direto ao ponto, sem perda de tempo. Não por acaso, o número de episódios diminuiu, de 10 para sete. O que foi uma ótima medida.

Tantas mudanças vêm a reboque da troca na direção geral da série: sai Sam Esmail, agora apenas no posto de produtor executivo, entra em seu lugar Kyle Patrick Alvarez, oriundo de alguns episódios de 13 Reasons Why (2017 - 2020). Por mais que mantenha sempre o clima de suspense que norteia a série, e dependa da primeira temporada para se compreender o que aqui acontece, a impressão geral é de um recomeço. Daí o início tão repleto de caras novas, de forma a também potencializar o mistério de tudo o que acontece.

Uma delas é Janelle Monáe, que desperta desmemoriada em um barco à deriva. Após ver um homem em fuga, ela consegue chegar à margem e acaba sendo encontrada por uma policial, ao andar sem rumo à beira da estrada. Sem maquiagem, sua Jackie é o reflexo do espectador: nada entende e está à procura de pistas, que indiquem quem ela é. O primeiro episódio é todo neste sentido, carregando no clima de suspense a partir de uma trilha sonora em alto volume, por vezes intrusiva até demais.

É interessante observar como há uma certa divisão conceitual por trás dos episódios desta segunda temporada. Os três primeiros têm por objetivo surpreender, seja através do mistério absoluto em torno de caras novas, da reconstrução de cenas já vistas através de outro ângulo ou mesmo do viés empresarial adotado, que de início unifica as duas temporadas. Sem Julia Roberts no elenco, o foco está agora na Geist, a empresa por trás do tratamento realizado em veteranos de guerra ao retornar aos Estados Unidos. Costurar tal migração, tanto narrativa quanto estética, ao mesmo tempo em que apresenta novos personagens e reposiciona antigos é um trabalho bastante habilidoso, não só de Alvarez mas também da equipe de roteiristas, chefiada pela dupla Micah Bloomberg e Eli Horowitz.

Um ponto que merece destaque, especialmente no segundo episódio, é o belo trabalho de fotografia de Jas Shelton. Através de enquadramentos inusitados, pode-se em vários momentos acompanhar dinâmicas envolvendo personagens distintos em uma mesma cena, cuidadosamente posicionados de forma que estejam em camadas diferentes para o espectador. Uma composição difícil e meticulosa, que enriquece bastante a narrativa.

Do quarto episódio em diante, Homecoming assume uma postura mais linear. Os elementos desta temporada já estão posicionados e a narrativa é mais focada em explicar os mistérios apresentados até então do que em surpreender, com exceção da aparição de Joan Cusack - mais pelo que a atriz representa do que propriamente por sua personagem, refém de seus cacoetes tão conhecidos. É também neste trecho que a temporada perde o brilho por se ater ao básico, ainda mais após o impulso provocado pelos três episódios iniciais, e também por uma certa correria mal explicada em torno do lado empresarial, talvez plantando lacunas para uma possível terceira temporada. Apenas no último episódio consegue enfim fugir da previsibilidade, reinante em todo este trecho.

Superior à temporada de estreia, Homecoming retorna aparentando ter feito um mea culpa acerca dos problemas existentes, buscando corrigi-los (ou diminuí-los) na medida do possível. Por mais que a estrela aqui seja Janelle Monáe, em bom trabalho ao construir duas facetas de uma mesma personagem, quem rouba a cena (mais uma vez) é Hong Chau. Sua dicotomia entre trabalho e em casa entrega uma personagem rica em nuances, seja ao apresentar cada momento ou mesmo quando ambos inevitavelmente colidem, sempre muito bem executado pela atriz. Já Chris Cooper realiza um trabalho correto, muito mais calcado na imagem do ator, enquanto que Stephan James apresenta suas limitações já tão conhecidas pela temporada inicial.

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Jornalista e crítico de cinema. Fundador e editor-chefe do AdoroCinema por 19 anos, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro), autor de textos nos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros", "Documentário Brasileiro - 100 Filmes Essenciais", "Animação Brasileira - 100 Filmes Essenciais" e "Curta Brasileiro - 100 Filmes Essenciais". Situado em Lisboa, é editor em Portugal do Papo de Cinema.
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