Crítica


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Sinopse

Castle Rock é uma cidade fictícia localizada em Maine, nos Estados Unidos. Lá, passado e presente se cruzam através das histórias de terror vividas e sentidas por seus moradores. Nesta estranha localidade, todo o universo de Stephen King se encontra.

Crítica

Foram deixadas muitas coisas a resolver em Romanos, o derradeiro capítulo da primeira temporada de Castle Rock. Algumas das pontas soltas não são satisfatoriamente conectadas, do que decorre uma sensação um tanto frustrada quando sobem os créditos finais. O grande enigma, alimentado desde o começo, é a ligação entre Henry (André Holland) e o prisioneiro misterioso (Bill Skarsgård). Após oferecer uma guinada, em que tudo aparentemente se deslocava da esfera terrífica para desembarcar num dado próximo à ficção científica, vide as dimensões paralelas que supostamente dariam conta de esclarecer as diversas conjunturas, a série trata em sua parte final de embaralhar mais que explicar. Isso acontece exatamente por conta da tentativa de promover uma interlocução entre tais instâncias. A influência maligna do desconhecido é novamente aproveitada como um dos motores vitais da atmosfera de tensão. Por outro lado, há a exploração do que aconteceu em realidades diferentes.

Romanos dá respostas diretas a questionamentos levantados desde o início. Finalmente ficamos sabendo exatamente o que aconteceu no passado com o pai de Henry, e, de quebra, os motivos que levaram à sua agressão quase com consequências imediatamente fatais. Porém, certos coadjuvantes são claramente minimizados para que a trama se concentre basicamente em Henry e no prisioneiro. Nesse percurso algo desajeitado, Molly (Melanie Lynskey) é relegada ao papel de instrumento, primeiro, de mediação entre os protagonistas, segundo, como mera executora de uma necessidade de seu amigo de infância. Nesse percurso tortuoso, até a prisão de Shawshank, antes inexplicavelmente preterida enquanto cenário importante, volta a concentrar circunstâncias relevantes. Por conta do surto de um sujeito num dos fragmentos de outrora, a cadeia entra em colapso, sendo então fechada. A observação da privatização, antes com viés crítico, volta à tona nas bordas, mas de forma bem inofensiva.

No afã de adensar a inevitabilidade de um embate, os criadores enfraquecem o entorno. Nesse sentido, Ruth (Sissy Spacek), anteriormente num crescendo dramático considerável, tornada uma das personagens mais importantes, aqui volta ao ponto inicial, ou seja, a apresentar um comportamento comodamente secundário e apagado. Aliá, embora seja decepcionante, esse recrudescimento aponta ao eterno retorno, noção fundamental para o entendimento do encerramento. O fato de Wendell (Chosen Jacobs) herdar o dom do pai é irrelevante, nem mesmo servindo de motriz de uma tensão momentânea, derivada do atendimento de um chamado invisível. Esquivando-se de elucidar completamente o cenário, apostando em reforçar a prevalência de uma obscuridade não passível de ser clarificada, Romanos acaba de forma intensa e simbólica, encaminhada por uma elipse tão conveniente quando canhestra, pois promove salto entre o instante decisivo e o futuro já reconfigurado.

O saldo de Castle Rock ainda é, no geral, positivo. As interpretações excelentes, os roteiros geralmente competentes e capacidade de construir um clima de apreensão na associação expressiva de imagens e sons formam um conjunto que garante o interesse e o sucesso da primeira temporada. Contudo, após The Queen, seu melhor episódio (o sétimo), a série caiu sensivelmente de qualidade, talvez pela proximidade cada vez maior do desatar de todos os nós previamente estabelecidos. A maior fragilidade do conjunto, portanto, é a falta de habilidade para lidar com as charadas muito engenhosamente criadas e nutridas. Os showrunners Sam Shaw e Dustin Thomason subaproveitam, ainda, a relação com as obras de Stephen King, gradativamente presenteando menos os fãs com alusões a livros ou citações diretas dos mesmos. Em suma, a inconsistência característica dos três capítulos finais deixa um gosto amargo de insatisfação.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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