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Sinopse

Três homens casados e ricos fazem anualmente uma espécie de caçada no deserto. Desta vez, um dos empresários decide trazer sua amante. Quando ela é abandonada para morrer devido a uma série de acontecimentos, eles terão que lidar com as consequências de uma mulher que busca vingança.

Crítica

É preciso aceitar o absurdo com companheiro de viagem em Vingança. Fazer vista grossa a algumas incongruências também é imprescindível para aproveitar plenamente o que o longa-metragem da cineasta Coralie Fargeat tem a oferecer, especialmente a violenta e bem orquestrada dinâmica “gato e rato” entre uma mulher os homens que a vitimam. Jen (Matilda Lutz) está curtindo a temporada de descanso com seu amante, Richard (Kevin Janssens), numa propriedade afastada. A sensualidade dessa jovem é determinante nos primeiros movimentos da trama, com a voluptuosidade de seu corpo sendo ressaltada pela câmera detida em curvas e condutas excitantes. Ela é uma garota pronta a satisfazer suas necessidades físicas e as do amado que logo recebe a visita dos sócios devidamente armados. Os dois visitantes prontamente se encantam pelos dotes físicos da loira. Um dos recém-chegados se acha no "direito" de estuprá-la, alegando a sedução na noite anterior como permissão para o ato vil.

Desde o princípio, chama atenção a plasticidade de Vingança, o estilo de uma narrativa que rapidamente demonstra fundamentar-se mais no que se vê, relegando deliberadamente qualquer profundidade de personagem. Jen é arremessada de um penhasco e cai sobre uma árvore, sendo perfurada gravemente no abdômen. Inexplicavelmente – o filme realmente não justifica a quase ressurreição, improvável à luz da verossimilhança –, ela levanta e se arrasta para longe dos algozes, tendo literalmente um toco de madeira enfiado na barriga. Passando do descrédito da proeza, precisamos, ainda, suspender a incredulidade quanto à possibilidade de alguém que acabou de perder litros de sangue conseguir reunir forças para revidar à altura. A realizadora pretere a plausibilidade em função da paleta de cores, do vermelho que fica bem em contraste com os tons terrosos do deserto e o amarelo resplandecente do sol. Emudecida, talvez pelo choque, a protagonista começa uma dura jornada de vendeta à lá James Braddock.

Há um fetiche sobressalente em várias camadas de Vingança. O corpo feminino é inicialmente explorado como combustível do desejo masculino, depois passa à condição de máquina assassina, porém ainda exalando sensualidade. Se Coralie Fargeat tinha a intenção de satirizar a objetificação feminina relativamente comum ao subgênero do qual se vale dos códigos, obteve êxito parcial. A grande quantidade de fluídos corporais, especialmente a profusão vermelha que vai pintando os cenários e dando pistas aos matadores, além dos ferimentos e das perfurações, também aponta ao entusiasmo pela violência como artifício cinematográfico. O filme é um verdadeiro deleite para quem gosta de exemplares ancorados na irracionalidade do comportamento humano condicionado por situações limítrofes. Não há moral vigente que dê conta do que as pessoas aqui fazem simplesmente para sobrepujar o ímpeto bárbaro de outrem, seja para proteger-se ou aniquilar o inimigo hostil.

Jen cauteriza uma ferida (feia) utilizando métodos que deixariam John Rambo com inveja, assim como se torna milagrosamente uma atiradora eficiente, incapaz de fazer frente a um Jason Bourne, mas suficientemente letal para rivalizar com caçadores experientes. A despeito da montagem que imprime energia ao transcorrer, do ótimo aproveitamento dos espaços e da adequação da fotografia ao intento de realizar algo visual e metaforicamente saturado, Vingança torna imprescindível a condescendência, nossa disposição para fechar voluntariamente os olhos às facilidades e aos disparates. Tal ruído se dá pela inexistência de subsídios que permitam a instauração orgânica do fantástico/inexplicável. Sem a construção de uma lógica interna que suporte a insensatez, sobra uma casca vibrante, que propicia ótimos momentos de adrenalina e tensão, mas um recheio insuficiente para fazer o conjunto livre de sobressaltos. É divertido, visual e tecnicamente falando, engenhoso, mas marcado por frequentes inconsistências.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
7
Francisco Carbone
8
MÉDIA
7.5

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