Crítica
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Sinopse
Em Um Silêncio, Astrid, esposa do renomado advogado François (Daniel Auteuil), vive uma vida de privilégios. Enquanto a mídia acompanha de perto um caso de grande repercussão, no qual François defende os pais de crianças sequestradas, a família é constantemente pressionada por repórteres que aguardam do lado de fora de sua casa. Contudo, a aparente tranquilidade familiar é abalada quando uma figura do passado ressurge, determinada a buscar justiça por conta própria.
Crítica
A trama de Um Silêncio começa com uma mãe questionada pela polícia. Seu filho é acusado de tentativa de homicídio. A câmera do cineasta Joachim Lafosse se detém estritamente no semblante angustiado da mulher envolvida na situação dolorosa. Não há a visão da profissional que pega o depoimento, apenas a da mãe tentando manter alguma racionalidade para cumprir os protocolos da lei. A julgar pelo teor da cena, podemos esperar que o filme seja um daqueles exemplares de personagem, nos quais o mais importante nem é o conjunto das circunstâncias, mas de que maneira alguém é afetado por ele. Infelizmente, não é o que acontece. A isso, Lafosse prefere fazer uma história de situação, no qual o mais relevante é o grupo de acontecimentos acumulados até provocarem a destruição de uma família cuja calmaria estava baseada em repressões e silenciamentos. A estrutura narrativa é circular. Ela apresenta um fato (a acusação) e volta no tempo para percorrer todo o caminho até retomar isso que vimos no começo. Assim sendo, em boa parte da trama, Raphael (Matthieu Galoux), o indiciado, é visto somente como adolescente pouco sociável morador de uma casa que ganha a atenção da mídia. Isso porque seu pai, François (Daniel Auteuil), é o advogado de um caso célebre, o que leva repórteres a acampar diante da propriedade. Sabemos que o garoto vai agredir alguém. Mas quem? Por quê?
O filme poderia ser contado da perspectiva desse menino introspectivo obrigado a conviver com um circo jornalístico montado diante de seu portão. Poderia também ser narrado pelo prisma do advogado que acaba envolvendo esposa e filho nas obrigações de sua atuação profissional. E, principalmente, poderia privilegiar o olhar da esposa que, em um par de momentos específicos do enredo, é obrigada a ir à público responder pelos crimes de homens. Mas, como dito anteriormente, Joachim Lafosse prefere não filtrar os conflitos e tensões pela perspectiva de alguém, mas construir um drama familiar em que as demandas particulares são somadas. E, provavelmente, essa seja a escolha menos inteligente do roteiro de Um Silêncio – assinado por Sarah Chiche, Chloé Duponchelle, Valérie Graeven, Paul Ismael, Joachim Lafosse, Matthieu Reynaert e ainda por Thomas van Zuylen. Menos inteligente, porque dispersa o potencial dramático das individualidades. A opção pela informação prévia de que o garoto cometerá um crime cria expectativas nas vezes em que ele se movimenta de modo brusco ou tem alguma atitude inadequada. No entanto, Lafosse alivia essa expectativa por meio das demandas dos outros personagens, às vezes interrompendo repentinamente o desenho dos tensionamentos. Para dar conta de várias singularidades, ele acaba enfraquecendo as especificidades e nuances.
De longe, a personagem mais interessante de Um Silêncio é Astrid, a matriarca interpretada por Emmanuelle Devos. Afinal de contas, ela é confrontada (e levada a responder) pelo crime hediondo do filho adolescente; esconde os segredos potencialmente destrutivos do marido; mais tarde precisa cumprir (consternadamente) outros protocolos judiciais ao ser perguntada a respeito de um novo delito alheio; e é a guardiã da estabilidade da família, claro, desde que mantenha uma distância segura da verdade. Portanto, faria todo sentido que o longa-metragem fosse um exemplar de personagem, uma investigação profunda da personalidade da mulher que precisa carregar um fardo pesado demais nas costas. Mas, Joachim Lafosse não permite que nos aproximemos dela muito mais do que dos outros envolvidos, assim a reduzindo em muitos momentos à perturbada com poucos instrumentos para conduzir a própria vida – uma vez que os homens com os quais divide o teto não medem as consequências de seus atos e acabam a atingindo. A abordagem diretiva está mais interessada na implosão de uma estrutura doméstica aparentemente sólida, mas fica no meio caminho entre conseguir isso e dar atenção às pessoas tragadas para um redemoinho tétrico feito de mentiras, dissimulações, transferências de responsabilidade e condescendências. Falta ainda a injeção de apreensão nesse “quase thriller”.
No geral, uma crítica deve ser sobre aquilo que vemos, não a respeito do que poderíamos ter visto caso as coisas fossem diferentes. Porém, Joachim Lafosse dá margens para imaginarmos outros cenários e possibilidades em Um Silêncio, pois ameaça constantemente tomar caminhos diferentes, mas sempre hesita quando há evidentemente margem para investir na tragédia dos personagens e aprofundar um possível mergulho na singularidade de cada um deles diante das crises que vão se acumulando. Um Silêncio possui uma boa premissa desenvolvida de maneira burocrática. Mesmo assim, Lafosse mantém o interesse nos desdobramentos da denúncia de que alguém cometeu crimes no passado, delitos que provocam consequências avassaladoras. Diversos tópicos são rapidamente discutidos: silenciamento feminino, desamparo adolescente, impunidade masculina, falta de empatia, repressão de sentimentos, consentimento pelo sigilo, dissimulação diante da punição e, ainda, desintegração da família. Infelizmente, Lafosse é mais ambicioso do que o seu alcance permite. O cineasta tenta desenvolver tudo em consonância, adicionando componentes na tragédia sem elaborar melhor os recursos para sustentar as suas teses e conclusões. Seria preciso mais foco na essência das pessoas enredadas ou concentrar as atenções em alguém para evitar esse resultado, quando muito, mediano como drama familiar.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 5 |
Robledo Milani | 6 |
Celso Sabadin | 8 |
Carlos Helí de Almeida | 7 |
Alysson Oliveira | 6 |
MÉDIA | 5.4 |
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