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Sinopse

Susana Schnarndorf, nadadora profissional, se encontra diante de um complicado dilema após ser diagnosticada com Atrofia de Múltiplos Sistemas. Por conta da baixa expectativa de vida, ela fica entre a dedicação à natação e a possibilidade de aproveitar a companhia de familiares e amigos em seus anos derradeiros.

Crítica

As cenas iniciais do documentário Um Dia Para Susana, dos diretores estreantes em longas, Giovanna Giovanni e Rodrigo Boecker, acompanham a nadadora paralímpica Susana Schnarndorf se preparando para a festa de entrega do Prêmio Paralímpicos 2013, do qual sairia vencedora na categoria atleta feminina. Mais do que à premiação em si – deixando o discurso de agradecimento de fora, por exemplo – a dupla de cineastas direciona seu olhar à entrevista pós-prêmio que Susana concede ao lado de seus três filhos (Kaillani, Kaipo e Maila) e, especialmente, ao momento da despedida da protagonista, partindo para a cidade de São Caetano do Sul, em São Paulo, a fim de iniciar seu treinamento, visando a classificação para os Jogos Paralímpicos de 2016, e deixando os filhos com o pai na capital fluminense. Nesses poucos minutos que abrem o longa, já fica clara a importância dada à questão dos laços familiares, com o retrato das rupturas afetivas dividindo espaço e até mesmo se sobrepondo ao retrato esportivo.

Isso não significa que Giovanni e Boecker abdiquem por completo da narrativa de superação pessoal e atlética. A dupla entrega a esperada apresentação da trajetória de Susana, que iniciou sua carreira como triatleta na década de 90, participando de competições como o Iron Man e os Jogos Pan-Americanos de 1995 em Mar Del Plata, na Argentina, até ser diagnosticada, em 2005, com Atrofia de Múltiplos Sistemas (AMS), uma rara doença degenerativa que afeta o sistema nervoso, causando a rigidez muscular, que fez com que Susana perdesse boa parte da coordenação motora do lado esquerdo de seu corpo. Com acesso direto ao seu dia a dia por três anos, os diretores registram a luta incessante da nadadora nos treinos, exercícios e exames, buscando estar apta a participar da Paralimpíada que seria realizada em casa, no Brasil, enquanto se depara com a constatação da piora de sua condição. A dor e a angústia de Susana são captadas com cumplicidade por Giovanni e Boecker, que assumem a posição de observadores próximos, muitas vezes confidentes, porém, interferindo o mínimo possível.

A personalidade direta da atleta, por vezes até ríspida no modo franco como encara o mundo e a si própria, domina o longa, revelando uma pessoa movida por um objetivo que chega a ganhar contornos obsessivos. Uma faceta quase sempre presente nas biografias esportivas – ficcionais ou documentais – e que invariavelmente resulta na negligenciação do aspecto pessoal da vida dos biografados, incluindo a esfera familiar. Ao tratar do distanciamento em relação aos filhos, os realizadores traçam um paralelo com o relacionamento entre Susana e sua mãe, Marian, definido como conturbado desde a infância, com a filha não correspondendo às projeções dos desejos maternos. Neste estudo das rupturas afetivas se encontra o que o filme tem mais potente, colocando a mãe como co-protagonista, sendo a única, além de Susana, a ter voz ativa, expondo um orgulho pela filha que se confunde com a mágoa, fazendo com que, de acordo com o que a nadadora afirma a autora de sua biografia, crie uma memória ligeiramente fantasiosa e idealizada acerca do passado.

Tendo essa dinâmica errática como elemento central – dando menos tempo de tela a figuras como amigos, companheiros de equipe ou mesmo ao pai e aos filhos de Susana, que aparecem pouco após o primeiro ato – o documentário se mantém sempre interessante, enquanto, paralelamente, registra a corrida contra o tempo na preparação repleta de percalços para os jogos. Esse registro, em determinados momentos, acaba soando repetitivo, afetando a cadência narrativa, assim como certas passagens que soam inseridas de maneira abrupta e desconectadas do todo, como a da viagem de Susana com Kaipo e Maila ao Caribe. Todavia, de modo geral, a montagem se apresenta eficiente na manutenção da ordem cronológica dos acontecimentos para criar um ritmo de contagem regressiva carregado de alguma tensão.

Ao unir essas duas frentes – conflitos maternos e jornada de superação – sem a necessidade de se aprofundar na questão médica, abordada apenas o suficiente para se traçar um panorama geral da condição de sua protagonista, Um Dia Para Susana resulta em um retrato humano mais completo, construindo uma espécie de acerto de contas afetivo, ainda que não definitivo, com o passado, capaz de comover sem pesar no sentimentalismo ou recorrer à pura e simples exaltação do triunfo físico/esportivo.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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