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Sinopse

Lu, uma jovem independente, teve o seu dinheiro roubado pelo ex-namorado. Pobre e morando em uma van, ela decide procurar a mãe dele, Margo, que não a conhece e lhe nega ajuda. Em um hotel buscando comida, Lu conhece uma mãe descuidada e passa a cuidar de sua filha. Assim, decide levar a criança até Margo, dizendo que a bebê é a neta dela.

Crítica

Espécie de continuação espiritual de Juno (2007) – outra história na qual Allison Janey e Ellen Page criam um vínculo diante de uma situação de maternidade acidental, ou quase isso – este enredo poderia facilmente soar inverossímil ou cair no melodrama. Felizmente, Tallulah equilibra-se entre as duas coisas, graças à fantástica construção das personagens e, é claro, às atuações excelentes que as sustentam.

A jovem Tallulah (Page) leva uma vida errante e improvisada. Morando numa van e vagando pelos Estados Unidos, se vê obrigada a roubar e “dar jeitinhos” para sobreviver. Depois de ter sido abandonada pelo namorado, Nico (Evan Jonigkeit), encontra Carolyn (Tammy Blanchard), uma mãe que parece inteiramente incapaz de cuidar da filha de um ano de idade. A mulher deixa a criança sob seus cuidados – uma completa estranha – por uma noite, mas quando retorna falta à jovem a coragem de deixar a menina com uma mãe tão irresponsável. Por isso, decide levá-la embora. Como se não bastasse o sequestro, ainda usa o bebê para se aproximar de Margaret (Janney), mãe do ex-namorado, alegando que a criança é filha dele.

Em meio a tantas atuações brilhantes, Ellen Page merece crédito especial simplesmente por criar uma personagem capaz de conquistar a audiência mesmo tomando uma série de péssimas decisões. Nas mãos de uma atriz menos carismática, uma personagem como Tallulah provavelmente acabaria irritando o espectador por se colocar tão frequentemente em situações que não têm como acabar bem por pura imaturidade. Page, entretanto, cria empatia no público desde o primeiro momento em cena, encarnando confortavelmente mais uma das suas garotas de estilo tomboy que parecem perpetuamente adolescentes. Ao invés de incomodar, a ingenuidade e lógica infantil da personagem acabam fazendo com que o espectador torça por ela.

Margaret, por sua vez, funciona como a voz da razão em contraste com a personagem-título. A mulher de meia-idade tenta lidar com o trauma do divórcio depois de anos de um relacionamento baseado em mentiras, enquanto promove, ironicamente, seu mais recente livro sobre a função social do casamento. Embora a relação entre ela e a jovem protagonista siga uma fórmula usada à exaustão no cinema (duas personagens vastamente diferentes e que não se dão bem a princípio são obrigadas a conviver e, com o passar do tempo, aproximam-se), a dinâmica das duas funciona muito bem. Além do belo arco narrativo pelo qual a personagem passa, muitos dos momentos cômicos do filme se devem ao seu sarcasmo amargurado, mérito da sempre excelente Allison Janney.

Conforme as histórias de cada figura se entrelaçam na trama, transparecem os temas que permeiam a narrativa; o maior deles talvez seja o abandono. Em retrospecto, a situação inusitada da premissa torna-se apenas um pano de fundo para que a diretora e roteirista Sian Heder explore a maneira como suas personagens lidam com essa questão, sejam elas as vítimas ou as responsáveis por algum tipo de abandono. O caso de Margaret é provavelmente o mais evidente, não só pela questão do divórcio, mas também pela mágoa que sente com a ausência do filho. No caso de Tallulah, é a partida de Nico que bota a trama em movimento e, à medida que o filme avança, vai ficando cada vez mais claro que a decisão de sequestrar o bebê vem de um trauma sofrido pela jovem, algo que faz transparecer a lógica aparentemente ingênua por trás dessa ação. Por mais que pareça estar ciente das consequências do ato que comete, abandonar uma criança nas mãos de uma mãe tão negligente parece, para ela, um crime muito mais grave. Até Carolyn, que inicialmente surge como uma caricatura irritante, acaba se transformando em vítima, um tipo digno de pena. Também abandonada pelo marido, ela visivelmente sente-se deslocada com a frieza e superficialidade do casamento, além de estar desamparada na maternidade. Mesmo que sua maneira de agir seja reprovável, é no mínimo compreensível.

É exatamente esse o ponto-chave da narrativa. Essa é uma história sem vilões. Os personagens são construídos de tal maneira que é possível compreender as ações de cada um, mesmo que essas ações sejam, direta ou indiretamente, responsáveis pelo sofrimento de outra pessoa. Quando Tallulah se aproxima do desfecho, Margaret capta perfeitamente a essência dele com duas frases: “Somos todos horríveis. E somos todos só pessoas”. Todos são apenas humanos: Tallulah, Margaret, Carolyn, Nico e mesmo os personagens secundários. Cada um está apenas tentando, à sua maneira, seguir em frente e lidar com os próprios problemas.

Entretanto, é extraordinário que um filme que se dedica tanto à profundidade de personagens que lidam com situações tão pesadas e difíceis – como divórcio, abandono, maternidade, o sequestro de um bebê – consiga ser tão leve. Talvez pela experiência de Heder como roteirista de Orange is the New Black (2013-), uma série capaz de mesclar o drama e a comédia com facilidade, a diretora também consegue costurar muito bem as duas coisas no longa. Embora não seja tão marcante quanto Juno, seu “filme-irmão”, Tallulah é uma história inusitada, divertida e emocionante. Ponto para a Netflix.

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cursa Jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo e é editora do blog Cine Brasil.
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