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Sinopse

Em 1936, o escritor Stefan Zweig foge do nazismo e vai para a América do Sul. Austríaco de origem judaica, ele passa por Rio de Janeiro, Bahia, Buenos Aires e Petrópolis, onde fixa moradia. Apaixonado pelo Brasil, começa a escrever um livro sobre essa terra tropical, mas ainda preocupado com a intolerância crescente na Europa.

Crítica

Autor de obras seminais da literatura do século 20, como “Amok” e “Carta de Uma Desconhecida”, o austríaco Stefan Zweig (1881 – 1942) permanece ainda hoje como um nome de grande influência no universo artístico – seus escritos foram a principal inspiração de Wes Anderson para O Grande Hotel Budapeste (2014), por exemplo. Mas, para além das criações, o fascínio por Zweig se estende à sua trajetória pessoal, que carrega uma forte ligação com o Brasil. Judeu, o escritor abandonou a Áustria após a ascensão de Hitler ao poder, primeiro se exilando na Inglaterra, depois partindo para a América do Sul. Encantado pela pluralidade cultural brasileira, Zweig escreveu o ensaio “Brasil, País do Futuro”, e se estabeleceu em Petrópolis-RJ nos anos finais de vida, até seu suicídio. E é justamente nesta fase derradeira que a alemã Maria Schrader concentra o foco de Stefan Zweig: Adeus, Europa, seu terceiro longa-metragem.

Dividindo a narrativa em quatro capítulos – mais prólogo e epílogo – a diretora apresenta passagens distintas e pontuais do período de exílio de Zweig (Josef Hader), iniciando com a recepção oferecida pelo governo brasileiro, no Rio de Janeiro, em sua primeira visita ao país, passando à participação do autor na convenção de 1936 do PEN Club, em Buenos Aires. Segue-se, então, para uma nova estadia no Brasil – já ao lado da segunda esposa, Lotte (Aenne Schwarz) - desta vez na região nordeste, continuando com um episódio em Nova York, quando reencontra a ex-mulher, Friderike (Barbara Sukowa), finalmente chegando à sua mudança para Petrópolis. Cada passagem é apresentada como um acontecimento independente, começando e terminando abruptamente, sem uma clara transição entre eles.

O tratamento dado por Schrader pressupõe um vasto conhecimento prévio dos fatos acerca da vida e da obra de Zweig, pois pouca informação é oferecida a respeito de seu passado, estilo literário, pensamentos etc. Um dos poucos momentos que expõem algum aspecto particular de sua personalidade de modo mais aprofundado está na entrevista concedida na Argentina, em que se recusa a responder perguntas, generalizando ou especulando, sobre o avanço do nazismo e a situação da Alemanha, alegando não ter conhecimento por se encontrar distante dessa realidade. Ao ocultar o conteúdo explicativo, Schrader parece partilhar do silêncio do protagonista, focando na reprodução de eventos aparentemente triviais, como um passeio por uma plantação de cana-de-açúcar ou diálogos fugazes com seus fãs.

Tal escolha narrativa provoca certo distanciamento, atirando ao espectador uma profusão de nomes e menções a acontecimentos sobre os quais pouco, ou nada, sabe. A intenção de Schrader parece ser a de recusar o formato biográfico convencional, não se atendo à construção do personagem como figura histórica, mas utilizando-o como símbolo catalisador de reflexões e sentimentos relacionados ao horror da Segunda Guerra. Mesmo distante do conflito, Zweig carrega o peso por ter abandonado sua nação, deixando para trás amigos e familiares, e, devido à sua notoriedade, se transforma na esperança de muitos judeus que lhe escrevem cartas pedindo auxílio à obtenção de vistos sul-americanos. Em meio a essas responsabilidades, Zweig caminha como um espectro cansado, impotente e descrente do futuro, sentindo-se culpado por ser um privilegiado vivendo num “paraíso tropical”, como revela ao amigo repórter, também refugiado em Petrópolis.

A concepção de Schrader não deixa de ter seu interesse, especialmente pela opção salutar em fugir da obviedade e trabalhar a temática da guerra sob uma perspectiva diferente: evitando o registro efetivo da barbárie para ater-se aos efeitos sobre aqueles que dela escaparam. No entanto, esse afastamento em busca da sutileza, de uma visão poética, resulta numa considerável abstração das emoções, tirando o peso dramático de diversas situações. Um bom exemplo é o reencontro de Zweig e Friderike nos EUA, acompanhado de Lotte e das filhas da ex-esposa, envolto numa atmosfera de desconforto que, mesmo com a presença da impecável Barbara Sukowa, não atinge seu potencial confrontativo. A representação caricatural e estereotipada do Brasil é outro ponto falho do longa, vide a recepção oferecida a Zweig pelo prefeito de Cachoeira. Uma sequência de humor bufão que suplanta um momento genuinamente tocante, quando a banda marcial da cidade interpreta O Danúbio Azul, comovendo Zweig. Há ainda um fator de incômodo particular para o público brasileiro: diversos personagens falam com sotaque luso, já que as cenas “locais” foram rodadas em São Tomé e Príncipe.

Adotando um registro classicista sóbrio, Schrader se permite dois momentos de arroubos estilísticos, com planos-sequência estáticos que se espelham, nas cenas de abertura e encerramento. Contudo, ainda que esteticamente tenham inegável apelo, soam como demonstrações de virtuosismo destoantes, que não acrescentam ao impacto dramático como pretendido. A função de transmitir emoções fica mesmo a cargo do ótimo Josef Hader, que evidencia a melancolia e a angústia interiorizada de Zweig com a mesma sensibilidade com a qual exterioriza seus medos e pequenas alegrias. Seu empenho, porém, termina diluído pela proposta desprendida de Schrader que, sim, evita o didatismo e o sentimentalismo exacerbados, mas carece tanto de uma maior contextualização para amarrar os fatos quanto de estofo emocional para melhor conectar o espectador aos anseios do protagonista e, assim, transformar esses breves capítulos escritos em páginas aleatórias num conjunto mais vigoroso.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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