Crítica


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Sinopse

O policial RoboCop enfrenta um cartel de drogas. Simultaneamente, o império corporativo que o criou estabelece uma nova geração de vigilantes androides, o que gera a necessidade de sua obsolescência.

Crítica

Uma das características mais belas da ficção é a oportunidade de criar um subtexto que ande paralelamente com o texto principal e que, na maioria das vezes, seja mais rico que a trama em si. RoboCop: O Policial do Futuro (1987) é um perfeito exemplo disso. Descrevê-lo como uma história sobre um policial que, após ser brutalmente assassinado por um grupo de criminosos, é transformado em um ciborgue e com suas novas capacidades vai atrás de seus algozes procurando vingança é raso demais. Na verdade, o filme é uma sátira ao ambiente político-econômico norte-americano dos anos 1980, é uma crítica ao "imperialismo capitalista" que industrializa a mão de obra a ponto de extinguir sua humanidade; é sobre o resgate do valor humano ante a ascensão da tecnologia, é sobre a eternidade da alma. Sim, RoboCop fala sobre tudo isso. De uma maneira coesa e arrebatadora. Por isso se perpetuou no imaginário popular. Entretanto essa excelente referência gerou continuações que não conseguiram estar à sua altura. É o caso da primeira sequência, RoboCop 2.

Depois de resgatar e reorganizar suas memórias, RoboCop (Peter Weller) não é mais apenas um produto da OCP à serviço da Polícia: é novamente Alex Murphy. Junto com Lewis (Nancy Allen), repete a parceria do primeiro episódio. Só que agora inseridos em um ambiente ainda mais violento e caótico. A prefeitura de Detroit não repassou os pagamentos destinados a OCP – que representa o papel da empresa que privatiza o Estado e governa indiretamente as ações políticas na região – que, por sua vez, não remunera os policiais – no caso, o que é privatizado dessa vez é a Força Policial – levando-os a entrarem em greve. Sem segurança alguma, a cidade vira terra de ninguém, enquanto um terrorista com síndromes messiânicas domina o crime com a venda da droga chamada Nuke. Partindo desse princípio, RoboCop tem que enfrentar praticamente sozinho o crime, tanto os cometidos pela marginalidade, quanto pelos homens de negócios.

Assim como seu original, RoboCop 2 tem suas intenções satíricas. Algumas funcionam bem, outras nem tanto, gerando alguns momentos de pura vergonha alheia. Entretanto, não há dificuldade alguma em reconhecer cada ponto, quer seja, político, econômico, cultural ou filosófico, que está sendo retratado. O que deixa realmente a desejar é a organização dessas boas ideias. Não há coesão dentro do texto. O melhor exemplo disso é como um dos momentos mais relevantes para a trajetória do personagem-título – depois de restaurar sua identidade, Murphy passa a rondar sua ex-esposa, levando-a a entrar com um processo contra a OCP para descobrir se o RoboCop é ou não seu marido morto – acontece ainda no primeiro ato e se soluciona de uma maneira simples e inconsequente. O que poderia ser o cerne do subtexto e fio condutor da trama se transforma apenas em um detalhe insignificante.

O pior, no entanto, é que as falhas da história não se resumem apenas a isso. Os três atos não funcionam como uma peça só. Não há evolução alguma nos personagens, as subtramas surgem, se desenvolvem e concluem quase sem nenhuma relevância para o todo. Esse problema, certamente, acontece em função dos inúmeros desacordos criativos. O roteiro do filme ficou à cargo do quadrinista Frank Miller – autor da genial Batman: The Dark Knight Returns – porém, do que ele produziu quase nada foi filmado, levando-o a declarar que foi uma das piores experiências profissionais que já teve e o distanciando do cinema por quase quinze anos. Saber disso depois de assistir ao filme é ainda mais deprimente, porque é visível que o que mais agrada no roteiro tem o dedo do escritor. O que poderia ter acontecido ser ele tivesse sido mantido?

Outro ponto negativo é a queda da qualidade das cenas de ação. Apesar da produção contar com mais dinheiro, há um retrocesso em relação ao original. E isso se dá por causa da troca na direção de Paul Verhoeven por Irvin Kershner. O cineasta holandês dá uma aula na forma de filmar o RoboCop em ação. Se Verhouven conseguiu tornar aquela armadura grotesca em algo crível e até bonito de se olhar, Kershner banaliza a imagem do herói e não colabora com a atuação de Peter Weller. A ineficiência das tentativas de provocar graça também pode ser debitada da conta do novo diretor. Não há a sagacidade, a perspicácia e o humor negro de seu antecessor.

O elenco quase todo é o mesmo. Porém é difícil achar uma explicação do porquê a excelência apresentada no primeiro filme não se repetir. Até mesmo Peter Weller – que, sim, é o que sustenta o filme e dá credibilidade àquela figura tragicômica – fica abaixo do que é apresentado no original – não significando necessariamente que ele vá mal, apenas não se iguala ao nível anterior. Fora Nancy Allen que é, assim como Weller, competente em apresentar sua personagem, os novos membros do elenco não conseguem agregar nada de valor a não ser os estereótipos tão conhecidos do gênero – Belinda Bauer, como a executiva que faz de tudo para conseguir o que quer (até mesmo ter um caso com o chefe), como implementar seus métodos científicos nada ortodoxos; e Tom Noonan, como o messias traficante que mais tarde se tornará o "novo Robocop", são apenas burocráticos – apesar dele ser melhor sucedido.

Apesar de tudo há o que se destacar. A ousadia de apontar e acusar aquilo que é visível a qualquer estudioso político é um dos pontos positivos da produção. Ao pegar aquilo que foi estabelecido no filme de 1987 e expandi-lo ainda mais dentro do que, na época, era uma teoria da conspiração – a suspeita levantada por muitos de que a família de banqueiros Rockefeller e outros grandes empresários trabalhavam juntos para influenciar o governo norte-americano, prejudicar o país economicamente e colaborar para a construção de uma estrutura política global e unificada; o que o próprio David Rockfeller, patriarca da família, confessou ser verdade em seu livro de memórias lançado em 2002 – colabora para otimizarmos nossa percepção da – ao menos – intenção que o subtexto tinha. Sem contar que acompanhar a trajetória de um personagem que luta para preservar sua identidade e humanidade sempre é agradável, por mais que o resultado final tenha ficado aquém do esperado. Essa é a definição mais apropriada para Robocop 2: tinha tudo para ser bem melhor. Uma excelente história que infelizmente foi mal contada.

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Eduardo Dorneles é estudante de letras, amante de cinema, literatura, HQs e mantém um blog de crônicas e contos (edorneles.blogspot.com) .
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CríticoNota
Eduardo Dorneles
5
Chico Fireman
6
MÉDIA
5.5

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