Crítica


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Crítica

O impacto da sequência que abre o documentário Relatos do Front é instantâneo e inevitável, colocando o espectador em meio ao confronto entre policiais e traficantes numa favela carioca durante uma ação da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora). Um registro urgente e inquieto que termina com as imagens de um jovem ensanguentado, atingido por uma bala perdida, sendo carregado por parte da massa de moradores em desespero. Ainda que opte pelo choque como ponto de partida, o diretor Renato Martins – que aqui direciona seu olhar a um aspecto do cotidiano do Rio de Janeiro completamente oposto àquele da paixão pelo futebol, trabalhado em seu longa anterior, Geraldinos (2015) – não se atém apenas à exposição crua da realidade, adentrando um caminho mais reflexivo para analisar as causas e as consequências do caos instaurado na segurança pública de seu estado.

Buscando se manter o mais imparcial possível ao tratar de uma matéria tão complexa e delicada, Martins oferece abertura para que todos os lados sejam ouvidos, tanto moradores das favelas, ex-traficantes e familiares de pessoas assassinadas quanto membros da polícia – que muitas vezes acabam igualmente vitimados nos confrontos armados. Para dar mais estofo ao debate, o cineasta entrevista ainda sociólogos, jornalistas, historiadores e juristas que ajudam a traçar o panorama da escalada da violência no Brasil, partindo de uma breve introdução que contextualiza o surgimento da força policial no país e sua transformação num aparato de repressão do Estado desde a chegada da Família Real Portuguesa, no início do século XIX. Essa introdução serve também para expor questões como a dos conflitos e do ódio de classes, além da segregação racial, que se mostram indissociáveis do tema central do longa.

Ao equilibrar os depoimentos, todos bastante contundentes, Martins evita com sucesso a demonização de qualquer uma das partes. Policiais e bandidos são colocados não apenas como frações de um mesmo problema, mas também, e acima de tudo, como vítimas de um sistema falho no qual, como bem aponta um ex-agente do BOPE, alguém que não se encontra em meio ao fogo cruzado sai ganhando. De ambos os lados, criados para se enxergarem como inimigos, a percepção é a mesma: a de que os verdadeiros responsáveis pelo sangue derramado são os governantes que utilizam o combate ao crime como plataforma eleitoral, bem como outros detentores de poder, caso da indústria armamentista. Pois é para essas pessoas que a definição de “Guerra ao Tráfico” se mostra interessante, já que avaliza o cenário de batalha estabelecido, em que mortes – civis ou policiais - são contabilizadas como casualidades em nome de votos e do lucro.

Todo esse conteúdo é formatado em uma estrutura bastante convencional, mas, ainda assim, eficiente em extrair o máximo dos pontos de vista apresentados. O bom trabalho de montagem exerce papel fundamental para tal resultado, mantendo a dinâmica da narrativa e se mostrando hábil para captar as passagens mais relevantes de cada entrevista. A escolha dos entrevistados, por sinal, se mostra igualmente acertada, já que não apenas os especialistas, como também as “pessoas comuns” – as mães de jovens mortos em confrontos, os ex-presidiários, os PM’s e seus familiares – revelam um discurso articulado, levantando tópicos e opiniões que, de fato, acrescentam algo à discussão. Fator que permite com que esta evolua sem andar em círculos e, portanto, não soe repetitiva.

Talvez o ponto que conte contra Relatos do Front seja o fato de Martins, por vezes, não resistir à atração da força do choque, como visto inicialmente, pesando a mão na dramaticidade em determinadas escolhas, caso, por exemplo, das tomadas aéreas de paisagens cariocas embaladas por uma trilha sonora grave e ilustradas por manchetes de jornais que apontam dados alarmantes sobre a violência no Brasil. Ou ainda das imagens dos velórios dando grande ênfase à desolação dos familiares das vítimas, soando excessivas, quase apelativas. Contudo, mesmo que tais opções se mostrem questionáveis, o que prevalece no trabalho do diretor é o desejo de promover a reflexão sobre o assunto, bem como uma procura por soluções que ataquem o cerne do problema da segurança pública – como a redução da desigualdade social e a melhoria da educação – sem se valer do extremismo irracional que domina boa parte da sociedade brasileira atual e que se reflete diretamente na dinâmica do conflito retratado.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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CríticoNota
Leonardo Ribeiro
7
Robledo Milani
6
MÉDIA
6.5

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