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Sinopse

Evan é um jovem sofrendo de depressão e crises de ansiedade. Um incidente na escola leva todos a acreditarem que ele era o melhor amigo de Connor, garoto excluído que comete suicídio. Sem coragem de afastar os rumores, Evan deixa a mentira seguir adiante, até o caso tomar proporções grandes demais.

Crítica

Querido Evan Hansen (2021) parte de intenções nobres: alertar jovens e familiares sobre problemas de saúde mental, especialmente em casos de depressão, ansiedade e tendências suicidas. O musical e a adaptação cinematográfica defendem a tese importante e vaga de que estas pessoas devem ser acolhidas com respeito, sem julgamentos morais, e que a cultura do bullying precisa ser erradicada. Em tempos pandêmicos, quando a clausura e as dificuldades financeiras acentuam fragilidades emocionais, a questão se faz ainda mais urgente. No entanto, os questionamentos decorrem das escolhas efetuadas pelo diretor Stephen Chbosky para representar tal debate. Ele decide convencer o espectador da seriedade deste sofrimento psíquico da maneira mais direta e referencial possível - mostrando pessoas sofrendo. Ao longo de 137 minutos, testemunhamos um suicídio concretizado e duas tentativas fracassadas, além de cenas de bullying e humilhação em público, violências psíquica e física direcionadas a jovens órfãos ou abandonados pelos pais, mães exploradas no trabalho e outras incapazes de fazer o luto pelos filhos. Os protagonistas constituem, sem exceção, pessoas tristes. Há incontáveis cenas de choro ao longo da narrativa - das desesperadas àquelas discretas e solitárias.

O mérito da abordagem dependerá da percepção do espectador quanto ao conteúdo emocional. Caso a capacidade de expurgo (catarse e piedade) seja considerada fundamental à qualidade do longa-metragem, o resultado será uma obra-prima. Afinal, é difícil não se comover diante do mecanismo simples que consiste em submeter figuras frágeis, queridas e bem-intencionadas a uma ciranda de tragédias. Mais do que apelar à capacidade de empatia do público, o discurso desperta reações epidérmicas. Procura-se dialogar com emoções, afinal, é difícil refletir sobre ações concretas para lidar com transtornos psíquicos quando todos os personagens se encontram em situação de vulnerabilidade extrema, cantando suas dores a plenos pulmões. Caso o valor do debate seja priorizado, a experiência resultará dolorosa, no mau sentido de termo - caso em que as lágrimas transmitem a impressão de manipulação e chantagem psicológica. Não há respiro entre as sequências de exteriorização de angústias: Evan Hansen (Ben Platt) chora no quarto, em seguida Zoe (Kaitlyn Dever) chora a morte o irmão, Alana (Amandla Stenberg) chora suas próprias angústias no parque, e então dezenas de pessoas online choram a partir de um vídeo gravado.

Chbosky, diretor que abordou o melodrama com preciosas nuances em As Vantagens de Ser Invisível (2012) e Extraordinário (2017), se revela incapaz de atribuir leveza para equilibrar o filme gravíssimo, de aparência fúnebre constante. O primo indiano (Nik Dodani, uma enésima representação do nerd asiático) é utilizado como alívio cômico discreto, até ser esquecido pelo roteiro; uma única canção possivelmente divertida entre Evan e Connor (Colton Ryan) adquire um aspecto sombrio por se tratar de um jovem morto numa interação imaginária, e os três familiares do suicida cantam juntos, com seus rostos sobrepostos pela montagem. O mundo ao redor é opressor: os anônimos no supermercado, no corredor da escola e na empresa carregam um olhar de desprezo e condescendência, e ninguém na escola soa afetado pela morte do colega. É estranho que diretores da instituição e psiquiatras estejam ausentes da trama focada na saúde mental. O cineasta privilegia um sem-número de close-ups com o protagonista em crise, murmurando monossílabos e pedindo desculpas frequentes. A câmera deseja estar próxima aos rostos, às mínimas expressões, acentuando a gestualidade nada sutil do elenco. Chbosky dirige seus atores alguns graus acima do realismo, algo que talvez se justificasse nos palcos da Broadway, onde o espectador no fundo da plateia precisava enxergar as expressões dos atores, porém soa dispensável no dispositivo do cinema.

Um fator incomoda durante a integralidade da projeção: a inadequação do musical ao formato cinematográfico. Compreende-se que, no teatro, Evan cante no último volume, com toda a intensidade, para ecoar sobre a plateia. Ora, durante um jantar íntimo em quatro pessoas, com enquadramentos próximos, a decisão de se levantar e disparar um agudo comovente deixa os coadjuvantes em posição desconfortável: Amy Adams, Kaitlyn Dever e Danny Pino transparecem a falta de direcionamento durante a cantoria alheia. O roteiro nunca sabe de que maneira ocupá-los nestas catarses monumentais - é estranho solicitar aos atores uma resposta minimalista à extravagância musical alheia. Ben Platt, que já havia encarnado o herói na Broadway, abraça a oportunidade com diversos maneirismos: ele assume um tom maníaco, com os olhos arregalados sem piscar, e o pescoço adiante, numa interpretação caricatural da introspecção, à beira do autismo. Além disso, é estranho colocar o adulto de 28 anos na posição de um estudante em fase pré-vestibular. As estranhezas se estendem ao figurino (sobretudo de Amandla Stenberg), à montagem sincronizada com as batidas da música e com o estranho uso de drones dentro de um ginásio esportivo. Clichês como o estudante caminhando numa direção, contra os colegas trombando com ele em direção oposta, tampouco ajudam a sensação de uso apático das ferramentas cinematográficas.

Na parte estritamente musical, não há dúvida quanto ao talento de Ben Platt para o canto, em conjunção com a surpreendente Kaitlyn Dever. Julianne Moore e Amy Adams surpreendem em sequências eficazes, ainda que de profunda intervenção de pós-produção. Entretanto, Querido Evan Hansen oferece uma enxurrada tão opressora de tristezas que deixa um gosto amargo. Haveria inúmeras alternativas para representar o luto, entre as lágrimas a a euforia, o sentimento de alívio, a culpa e um acréscimo de libido. O processo pode incorporar metáforas, comportamentos agressivos, sentimentos canalizados em atividades cotidianas. Chbosky privilegia o caminho evidente, e também simplista: a aparência constante de pesar. O drama sustenta aquele olhar meio patriarcal, meio piedoso, de quem descobre a doença grave de alguma pessoa distante - ou seja, comove-se, sem real convite à identificação. Sobretudo, jamais se disseca as origens destes problemas, suas relações com fenômenos sociais (miséria, desigualdade de renda, pressão social para a alta performance, dívidas escolares etc.), nem os possíveis responsáveis por contorná-la (prefeitos, governadores, reitores, diretores de escola, líderes comunitários). A depressão e o suicídio são tratados como dilemas privados, ao invés de uma questão de saúde pública. O mero pedido ao espectador por um acréscimo de empatia é insuficiente para responder ao tema desta magnitude.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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