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Sinopse

Harold Meyerowitz é o patriarca da família, casado com Maureen e pai de Matthew, Danny e Jean. Escultor aposentado e extremamente vaidoso, ele fica satisfeito ao saber que está sendo organizado uma exposição para celebrar seu trabalho artístico. Só que, em meio aos preparativos, Harold adoece e faz com que todos os filhos precisem se unir para ajudá-lo a se recuperar, o que resulta em várias situações que colocam a limpo traumas do passado.

Crítica

Ben Stiller e Adam Sandler são astros da comédia que, volta e meia, experimentam passear por papéis mais sérios. Alguns menos atentos costumam até confundir os dois atores, dada a sua trajetória. Esta, porém, é a primeira vez em que Stiller e Sandler estrelam um filme juntos, como protagonistas. Em Um Maluco no Golfe (1996), Stiller tinha um papel não creditado, mas nada perto do que este grande encontro propõe. Em Os Meyerowitz: Família Não se Escolhe, produção original da Netflix, com direção de Noah Baumbach, os atores vivem meios-irmãos, filhos de um sempre magistral Dustin Hoffman, numa comédia dramática que explora muito bem as idiossincrasias de uma família disfuncional.

Na trama, Hoffman é o artista plástico Harold Meyerowitz, sujeito que chegou à velhice sem o respaldo crítico e financeiro que um grande escultor deveria ter – ninguém sabe se justa ou injustamente. Pai de três filhos, Danny (Sandler), Matthew (Stiller) e Jean (Elizabeth Marvel), Harold tem um relacionamento complicado com sua prole. Seu afeto sempre recaiu em Matthew, com Danny e Jean tendo de buscar pedaços de atenção como poderiam. Isso, de uma forma ou de outra, terminou por afastar os irmãos.

A história do filme começa sob o ponto de vista de Danny. Recém-divorciado, músico frustrado e vendo sua filha Eliza (Grace van Patten) deixar o ninho para ir à faculdade, o homem se vê obrigado a voltar a morar com o pai, dividindo o teto com a “madrasta” Maureen (Emma Thompson). Tudo o que ele queria é um pouco de atenção do pai. Mas isso é difícil quando seu nome não é Matthew – o próximo a ter a trama sob seu ponto de vista. Não seguindo o lado artístico da família, Matt é o único bem-sucedido, tendo investido numa carreira como contador. Ao se reencontrar com o pai, nota-se um gigante abismo entre os dois. Embora seja o preferido, o relacionamento não é dos melhores. Jean, por sua vez, mal pode dizer que tem algo em comum com seu velho pai – e, quando o filme a coloca como protagonista, sabemos de um segredo que ela carrega há tempos (e que muitas mulheres também o partilham). Quando Harold é internado no hospital, os três irmãos se veem de volta juntos e as faíscas logo retornam – positivas e negativas.

Noah Baumbach tem uma excelente mão para escrever histórias humanas, com personagens falhos, cheios de insegurança e neuroses. Seu texto cai como uma luva na embocadura de Ben Stiller, que já havia trabalhado duas vezes antes com o cineasta, em O Solteirão (2010) e Enquanto Somos Jovens (2014), e na de Dustin Hoffman, ator veterano e tremendamente versátil. Adam Sandler era uma incógnita. Acostumado a fazer suas comédias populares, o ator há tempos não se desafiava em algo mais profundo. Títulos como Embriagado de Amor (2002), Reine Sobre Mim (2007) e Tá Rindo do Quê? (2009) mostraram uma maior abrangência de tonalidades do comediante, mas pareciam raridades numa filmografia com mais baixos que altos. Em Os Meyerowitz: Família Não se Escolhe, no entanto, Sandler é o grande destaque. Ele ainda apresenta seus cacoetes – como gritar com a voz esganiçada – mas eles servem inteiramente ao personagem que interpreta, não sendo uma bengala para o riso fácil. Danny é o exemplo de um potencial desperdiçado, alguém que ficou aquém das próprias expectativas e vive uma existência incompleta. Sandler consegue transmitir esse peso, com cenas memoráveis divididas com Stiller. Existe uma química inata entre os dois e é muito provável que os fãs curtam muito assistir essa dobradinha tão aguardada. Como Matthew, Stiller é o bem-sucedido, mas isso não é o suficiente para que ele tenha um relacionamento saudável com o pai. Estas mágoas se somam até transbordar numa excepcional cena em um vernissage.

Hoffman, por sua vez, parece se divertir com um personagem totalmente autocentrado. Reparem como ele costuma não responder ao que lhe está sendo perguntando. Ele tem seu próprio fluxo de pensamento e ninguém consegue quebrar isso – seja seu filho preferido ou não. Um dos protagonistas da primeira metade do longa, Hoffman fica bastante ausente na segunda metade, o que é balanceado pela dobradinha entre Sandler e Stiller e pela bela atuação de Elizabeth Marvel. Em entrevista, a atriz confessou ter se inspirado em Fredo, o papel de John Cazale em O Poderoso Chefão (1972), para interpretar a fiel, mas invisível filha de Harold, um grande acerto.

Os momentos de riso não são muitos, quase todos protagonizados por Dustin Hoffman. A intenção de Noah Baumbach, afinal de contas, não é fazer rir necessariamente. É fazer pensar a respeito da relação pai-filho, sobre pressão familiar, sobre potencial desperdiçado, sobre amizade entre irmãos. Sobre tudo isso e um pouco mais. É um trabalho sensível, que deve chamar a atenção pelo elenco graúdo (além dos protagonistas, temos pontas de Adam Driver, Sigourney Weaver e Judd Hirsch), mas acaba cativando mesmo pela história humana. Exibido no Festival de Cinema de Cannes, onde protagonizou polêmica por ser produto de uma plataforma de streaming e estar concorrendo à Palma de Ouro, Os Meyerowitz: Família Não se Escolhe é cinema de verdade e de qualidade.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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