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Sinopse

Em um bar na divisa entre Brasil e Paraguai, um homem está marcado para ser morto. Enquanto esperam o a vítima, os dois matadores encarregados do serviço, Toninho e Alfredão, revelam uma história em que é difícil encontrar culpados ou inocentes. Presente e passado se misturam em torno da morte de Múcio, o pistoleiro mais competente da região, mostrando que entre matar ou morrer há uma fronteira fácil de ser atravessada.

Crítica

Os anos 90 foram pontuais na história do cinema brasileiro. Época da retomada após o golpe do governo Collor, da volta das produções nacionais com olhos voltados ao mercado do país e, também, a terras estrangeiras. Foi também o período em que novos cineastas começaram a surgir. Entre eles, Beto Brant. Após uma experiência com curtas-metragens e videoclipes, o cineasta se lançou no terreno dos longas-metragens. E Os Matadores não poderia ser melhor estreia para um novato no ramo. Um policial enxuto com foco na classe média brasileira. Aliás, um dos temas que viriam a ser recorrentes na cinematografia do diretor. O roteiro baseado no conto de Marçal Aquino é separado em duas vertentes. De um lado, vemos a história da lenda do matador Múcio (Chico Diaz), contada por Alfredão (Wolney Assis), seu antigo parceiro de trabalho. Atualmente ele está com Toninho (Murilo Benício), a quem relata a história enquanto esperam sua vítima na região da Bela Vista, entre o Brasil e o Paraguai. Do outro, a trajetória da amante do assassino (Maria Padilha), que serve para entendermos ainda mais como funcionava a mente do personagem.

É uma narrativa que não enrola. Brant sabe suscitar emoção, sendo direto. Intriga sem precisar de subterfúgios. Nem os flashbacks atrapalham essa concepção, pelo contrário, pois ajudam a desenvolver o roteiro. É uma história que vai direto ao ponto, o que não quer dizer que o cineasta deixe de aprofundar a trama com os dramas dos personagens. Por sinal, o ambiente se comunica muito com a personalidade de cada um. Num misto de cinema noir e fotografia amarelada, revela-se a ambiguidade dessas personas. Elas não são boas ou ruins, mas estão ali para cumprir seu serviço. Seja cruel ou trágico, mas nunca positivo.

Ainda assim, o fato de Múcio ser uma lenda é quase incomparável ao status dos demais em cena. Seus feitos impressionam, assim como suas inteligências. No plural, já que o racional e o emocional são bem separados. Ao mesmo tempo em que conseguia ser implacável, era extremamente amoroso com quem tinha apreço. E para alguém tão ambíguo, Chico Diaz, um dos melhores atores do cinema brasileiro, entrega uma performance poderosa com seu sotaque portunhol carregado. Não que seus colegas estejam por baixo. Benício, especialmente, se torna uma espécie de anti-herói com seu jeito nervosinho e imaturo que caracteriza Toninho. Inclusive, há um paralelo interessante entre os dois personagens, que acabam se completando na narrativa, mesmo em tempos diferentes.

Ninguém é desprovido de antipatia, ainda mais por suas ações. Os cenários pouco convidativos aumentam essa sensação no público, pois os ambientes fechados são extremamente claustrofóbicos, como se refletissem a prisão interna que seus personagens vivem. Já quando o plano geral ambienta a narrativa em locais abertos, é como se o elenco não pudesse fugir daquela realidade, por mais que tentem. Chega a ser documental em alguns trechos em que os locais de permanência dos matadores são acentuados, conferindo um grau de realismo maior à história. É um filme com uma identidade forte. Melhor ainda. É calcado nos talentos do elenco acima da média, no roteiro bem pensado que não engana o espectador e, especialmente, no trabalho de um diretor que sabe o que deseja, ainda que precisasse melhorar a montagem em determinados momentos. Algumas cenas parecem se estender além do necessário, mas nada que prejudique o andamento da história. Acima de tudo, Beto Brant já demonstrava seu interesse em retratar de forma contundente aspectos sociais de um Brasil pouco visto aliado à apuração estética que só um grande talento poderia conceber. Pode ser tratado como um thriller policial, mas consegue cavar camadas mais profundas graças ao olhar diferenciado do cineasta. Os Matadores é filme de gente grande e sem vergonha de se orgulhar disso. Ainda bem.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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