Crítica


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Sinopse

Chickie Donohue decide fazer algo absurdo para auxiliar os amigos que estão fora dos Estados Unidos combatendo no Vietnã: viaja ao país em conflito para levar aos soldados conhecidos a cerveja norte-americana favorita deles.

Crítica

Algumas histórias são tão absurdas que, aparentemente, só poderiam ocorrer, de fato, na vida real. É uma máxima de qualquer escola de cinema ou estudo de roteiro cinematográfico que afirma: “se a ficção possui um compromisso com a verossimilhança, ao menos dentro de um contexto lógico e estruturado, a realidade está completamente livre desse tipo de amarra, podendo se mostrar a mais improvável possível”. Chega a ser curioso, pois não são raras as reações diante de certos eventos que incluam exclamações como “isso parece coisa de cinema”, quando, no entanto, se a recriação dramática vier desprovida de uma relação de causa-e-efeito, logo passa a ser desacreditada. Por outro lado, no dia a dia não são poucos os casos de coincidências, surpresas ou mesmo espantos que se dão como se não possuíssem o menor sentido e, ainda assim, terminam por ocorrer. Adaptar tais situações para a tela grande (ou mesmo pequena, como tem sido cada vez mais frequente com o predomínio das plataformas de streaming, como se deu por aqui) requer habilidade e compreensão desta verdade. Basicamente, o que mais falta faz em Operação Cerveja, longa que aposta no improvável como chave de atração, mas tudo que colhe é um descrédito inicial que nunca chega a ser recuperado ao longo de suas mais de duas horas de projeção.

Zac Efron há muito não pode mais ser visto como na época de ídolo adolescente, ainda que não pareça ter se convencido disso. Assim, em Operação Cerveja ele, já próximo dos 40 anos, surge como Chickie Donohue, um jovem com quase duas décadas a menos na carteira de identidade, vivendo uma crise em busca de um sentido para si após um período militar que pouco propósito lhe ofereceu, ao mesmo tempo em que muitos dos seus amigos e vizinhos estão no outro lado do mundo, envolvidos pela Guerra do Vietnã. A trama se passa em 1967, bem no meio do conflito – que durou de 1959 até 1975 – um período em que muitos que apoiaram a intervenção militar que visava “impedir o avanço do comunismo rumo ao mundo ocidental” começaram a questionar essas escolhas, com protestos contra a ação no estrangeiro que estava resultando mais em mortes e derrotas do que em vitórias e conquistas. Instigado por colegas em igual situação de ostracismo – e sem nada melhor para fazer – acaba aceitando um desafio, no mínimo, inusitado: munido apenas de muita cerveja norte-americana – que parece nunca ter fim – embarca rumo à zona de combate para levar a bebida de presente aos amigos que se encontravam no campo de batalha, com a intenção de “elevar os ânimos da tropa”.

Em certo momento, quando um dos soldados que Chickie partiu em busca o encontra, ao olhá-lo com espanto e preocupação, um superior se aproxima e lhe confidencia ao pé de ouvido: “não precisa temer por ele, toda guerra possui um idiota incapaz até mesmo de dar fim à própria vida”. Pois a cada novo encontro com os militares convocados – que, detalhe, não se sabia ao certo nem se estavam vivos ou mortos – Donohue se comporta como se estivesse passeando por um shopping ou por um parque de diversões, sem nunca alcançar a real dimensão dos eventos que se sucediam ao seu redor. Atravessar áreas de tiroteio, ter que dormir em trincheiras, presenciar o temor vívido nos olhos dos vietnamitas e se deparar com a imensa disparidade entre o que acontecia na guerra e o que era divulgado pelo governo e pelos veículos de comunicação em sua terra natal servem apenas para modificar o protagonista, porém nunca o mundo ao seu redor. É como se aquilo presente em cena estivesse a seu dispor, e não o contrário.

Alguns nomes de destaque do elenco, como Bill Murray e Russell Crowe, pouco tem a acrescentar como figuras de impacto. Ambos são vistos não mais do que em duas ou três cenas, o primeiro sem nunca sair de trás do balcão do bar onde os jovens se encontram, nos Estados Unidos, para reclamar de suas próprias experiências e vomitar discursos pré-fabricados, enquanto que o segundo, um fotógrafo enviado ao país asiático para registrar o que lá ocorria, serve apenas para jogar algumas duras verdades na cara do rapaz que se recusava em lidar com os fatos que ocorriam diante de si. Murray, portanto, é aquele que o empurra ao outro lado do mundo. Crowe, por sua vez, será o que o convencerá a voltar para casa já como um novo homem, deixando pelo caminho muito da ingenuidade que o levou até ali. Quanto à Efron, por sua vez, tem-se a confirmação de suas limitações enquanto intérprete, atuando com a mesma expressão de inocência e inadequada alegria do início ao fim, como se nada do que tem acesso fosse suficiente para mudar sua visão. Quando, enfim, defende um discurso mais atento ao que experimentou com os próprios olhos, a mudança parece ter se dado mais por uma imposição do roteiro do que por resultado de um processo de frustrações e descobertas acumuladas.

Zac Efron pode ser um astro, mas está longe de se mostrar um ator digno de nota, ainda mais quando colocado ao lado de jovens talentos como Jake Picking (Top Gun: Maverick, 2022) ou Kyle Allen, apenas alguns dos tantos que surgem ao seu lado ao longo dessa jornada. Por outro lado, é certo que até essas evidentes deficiências do protagonista poderiam ser perdoadas com maior facilidade não fosse a mão pesada do diretor Peter Farrelly, cineasta que possui no seu currículo comédias como Quem Vai Ficar com Mary? (1998) e Passe Livre (2011), mas que desde os dois Oscars conquistados pelo equivocado Green Book: O Guia (2018) incumbiu-se da missão de fazer do seu cinema veículo para mensagens catequizadoras. O que faz mais uma vez em Operação Cerveja, usando um tolo como ponto de partida para um discurso a respeito da inutilidade dos enfrentamentos bélicos, torcendo para que a transformação desse sirva de exemplo também aos seus espectadores. No plano individual, até pode ter funcionado. Mas está longe de alcançar o mesmo efeito no coletivo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Robledo Milani
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Leonardo Ribeiro
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MÉDIA
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