Crítica


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Sinopse

Buffalo Bill acabou acreditando na lenda a seu respeito, perpetuada no Velho Oeste pelo escritor Ned Buntline. Embriagado pela celebridade, ele contrata um produtor e um publicitário para alavancar o seu show de cowboy.

Crítica

Primeiro dos dois filmes dirigidos por Robert Altman e estrelados por Paul Newman (o segundo, Quinteto, viria três anos depois, em 1979), Oeste Selvagem foi, assim como muitos dos longas assinados pelo diretor, considerado pelos críticos mais atentos ‘à frente do seu tempo’, enquanto que a grande maioria simplesmente não entendeu o que o realizador pretendia com essa trama que, assim como quase toda a sua filmografia, faz uso de um fiapo de história para colocar em ação seu olhar apurado e bastante analítico sobre a sociedade da época – em especial, é claro, a norte-americana. E aqui ele faz uso de um dos maiores ícones do país – o passado glorioso exaltado pelos faroestes – para desconstruí-lo sem pudor, fazendo da sátira um preciso instrumento de reflexão.

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Introduzido com a maestria dos grandes nomes, Buffalo Bill ganha aqui o rosto símbolo de uma geração de Paul Newman, já de cabelos grisalhos, mas ainda dono de profundos e irresistíveis olhos azuis. Ele usa peruca para ficar semelhante com a imagem eternizada do personagem de longos cabelos ao vento, registrada em pôsteres e cartazes de divulgação. Apresenta-se, portanto, como estrela máxima do show que atrai regularmente milhares de turistas de todo o país e movimenta milhões de dólares anualmente. É quase uma Disneylândia, só que ao invés de desenhos infantis e brinquedos inocentes, o que se tem em cena são representações de momentos marcantes da história norte-americanas, vividos pelo homem que afirma ser o próprio. Ou seja, estaria ali para dividir suas memórias e lembranças, num registro que ganha pontos pela suposta autenticidade.

O parque de diversões, coordenado por Bill e seu sócio (papel de Joel Grey), está prestes a receber uma nova contratação: o não menos aclamado Touro Sentado (Frank Kaquitts), um dos chefes indígenas mais temidos de todos os tempos, acusado de matar e escalpelar centenas de inimigos em todas as suas batalhas em nome de seu povo. Saído diretamente da prisão para ser mais uma peça de entretenimento popular, aceita a função com apenas uma condição: ali ficará apenas até se encontrar com o Presidente dos Estados Unidos. Certos de que, ainda que famosos, tal visita seria no mínimo improvável, tal proposta é aceita. E assim começam as tratativas da nova performance.

O tom de farsa perseguido por Altman já fica claro nos créditos iniciais, quando o elenco é apresentado por suas funções no espetáculo, e não pelos nomes dos personagens. Assim, Buffalo Bill é ‘A Estrela’, Touro Sentado é ‘O Índio’, o sócio é ‘O Produtor’, e assim por diante. Destes, talvez o tipo mais interessante seja ‘O Criador de Lendas’, vivido por ninguém menos do que Burt Lancaster. Todas as suas cenas são feitas em um único cenário – o bar, onde um copo de aguardente está sempre ao alcance. Por isso mesmo, não se sabe ao certo a veracidade dos seus relatos, que surgem pontualmente para instaurar a dúvida no ouvinte, esteja ele do lado de lá – ou de cá – da tela. Quando, já quase ao término do longa, o próprio Bill enfim adentra o mesmo ambiente e os dois astros se encontram, cada diálogo trocado entre eles tem mais a dizer do que aquilo que é meramente pronunciado. É o adeus de velhas lendas, sejam aquelas puramente ficcionais, como também daqueles por trás destas máscaras.

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Robert Altman não era um novato no gênero – Onde os Homens são Homens (1971) havia sido lançado cinco anos antes – mas é provável que Oeste Selvagem seja a sua verdadeira contribuição ao tema, deixando de lado uma reprodução convencional para ousar em estilo, discurso e até mesmo cenários. Tudo aqui é propositalmente artificial, por isso que, quando alguém tenta se impor como autêntico, tudo que consegue é o benefício da dúvida. Touro Sentado mal abre a boca, Buffalo Bill é praticamente um bufão, o Presidente – que, é claro, lá pelas tantas irá aparecer – está presente apenas para proferir respostas decorar sem nem ao menos ouvir as perguntas, e no fim tudo que importará são os aplausos. Eles, ao menos, são verdadeiros e permanecem ressoando, nem que seja ao menos até a próxima apresentação.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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