Crítica


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Sinopse

Um paralelo entre as experiências do Chile e do Brasil para tratar do acesso das populações à água no mundo, explorando as nuances econômicas e ambientais envolvidas na disputa pela propriedade da água, que irá determinar o futuro do planeta.

Crítica

O principal componente do eixo temático de O Verde está do Outro Lado é a exploração da água exclusivamente como um bem de consumo, portanto apropriado pelo capitalismo a fim de gerar lucro e, com isso, acentuar os abismos entre ricos e pobres. Alternando experiências no Chile e no Brasil, o documentário observa circunstâncias aviltantes que dizem respeito a agentes, tais como o agronegócio e os proprietários dessa substância que, em hipótese nenhuma, deveria ser concedida para comercialização, pois um direito humano pretensamente inalienável. O cineasta Daniel A. Rubio estabelece fragilmente as pontes entre os dois países com realidades que guardam diferenças pequenas. Não há um esforço visível para dotar de expressividade a comunicação entre as instâncias, disso decorrendo a sobrecarga meramente informativa. Não há variações significativas nesse percurso inclinado ao didático e à denúncia, mas bem pobre como cinema.

O cotidiano chileno é utilizado como arauto, uma anunciação apocalíptica (mas não distante) do que pode acontecer aqui, especialmente se forem adiante os ímpetos privatizadores do atual governo federal. No país vizinho a água é controlada por grupos mais preocupados com os próprios interesses do que, por exemplo, com a subsistência das áreas que gradativamente são pintadas de cinza em virtude da ausência do sumo que poderia irrigar as raízes das plantas. No que concerne ao Brasil, O Verde está do Outro Lado se restringe a testemunhos simples do esgotamento do Cerrado, região considerada a caixa d’água do país, por conta do funcionamento predatório de propriedades nutridas pela expansão da mentalidade neoliberal. O achatamento dos pequenos agricultores é apenas mostrado como um sensível dano colateral, mas não investigado para além dessa deflagração. A intercalação entre os territórios se dá de modo esquemático e pouco eloquente.

O Verde está do Outro Lado carrega uma mensagem urgente, inclusive no que tange ao viés ecológico. Além de demonstrar os efeitos nefastos de atender os desígnios dos privilegiados que detém o grosso da barganha econômica, isso em detrimento da vasta população desprovida da força monetária prevalente, o documentário permite vislumbres rápidos da deterioração humana e social oriunda do racionamento da água. No Chile, pessoas passam fome, são obrigadas a mudar-se das terras natais e se emocionam diante de paragens verdejantes como as suas de outrora. No Brasil não é muito diferente, especialmente a situação que caminha no ritmo dos estratagemas egoístas dos latifundiários, aqui citados de relance. Infelizmente faltam ao filme imagens significativas, tais como a plantação viçosa contrapondo-se no horizonte ao espaço praticamente sem cor que com ele faz divisa. É o dinheiro, bem como o poder dele advindo, que determina vida e morte por ali.

Rapidamente, sobretudo em virtude da reiteração, os recursos narrativos de O Verde está do Outro Lado esgotam as suas possibilidades. Daniel A. Rubio se contenta de transitar entre rotinas parecidas, tais como as resistências legislativas, para criar o painel sintomático de uma conjuntura global. No lado brasileiro, o deputado Glauber Braga ganha os holofotes, se posicionando veementemente em duas ocasiões contra as propostas de privatização da água e do saneamento básico por estes lados. Sublinhando o erro de tal iniciativa federal, o de conceder a certos grupos a exploração de algo que deveria permanecer indefectivelmente público, o realizador mostra o Chile sendo guiado pelas tentativas de retomar a soberania, exatamente em virtude da falência de um modelo conveniente para poucos. Embora tenha a qualidade de desnudar (parcialmente) uma questão tão urgente e importante, o filme carece de criatividade para extrapolar a mera esfera do panfleto.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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