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Sinopse

Ex-rei da Sérvia, Petar quer paz e prosperidade à nação. Durante a Primeira Guerra Mundial, é obrigado a retornar com seus comandados às montanhas, numa jornada física e mentalmente extenuante.

Crítica

A produção cinematográfica de viés comercial russa e de boa parte dos países do Leste Europeu (como Polônia, Hungria e Sérvia) se sustenta consideravelmente nos dramas históricos, geralmente de temática bélica/militar. Todo ano são lançados dezenas de títulos nesses moldes, formatados para atingir um público mais amplo e que, nos últimos tempos, têm chegado em maior quantidade e frequência a diversos mercados internacionais. O Último Rei da Sérvia, de Petar Ristovski, possui basicamente todos os elementos para ser enquadrado nesse filão, com trama ambientada durante a Primeira Guerra Mundial e narrada em grande parte sob o olhar de uma das mais importantes figuras históricas do país, o Rei Petar I (Lazar Ristovski) que, com a saúde fragilizada, transferiu o poder ao filho, Alexander, pouco antes do assassinato do arquiduque austríaco Franz Ferdinand, em 1914. Evento considerado o grande estopim do conflito global.

Devido a sua experiência na Guerra dos Balcãs e ao prestígio junto à população, mesmo oficialmente afastado do poder, Petar I é convocado pelo alto escalão do governo a participar das decisões políticas e militares, chegando até a ir a campo, mesmo com a idade avançada. Ao longo da projeção, diversas figuras cruzam o seu caminho, porém, apenas quatro destas se mostram realmente relevantes, tendo suas trajetórias também acompanhadas por Ristovski: o jovem soldado Marinko (Milan Kolak), a mãe do rapaz, Makrena (Danica Ristovski), seu superior imediato, Zivota (Radovan Vujovic) e o pequeno Momcilo (Ivan Vujic), acolhido pelo batalhão após ter toda a família assassinada pelo exército inimigo. Durante a primeira metade do longa, o diretor oferece uma narrativa extremamente protocolar, que, após breves letreiros contextualizando o conflito e apresentações superficiais dos personagens principais, mergulha por completo na ação dos campos de batalha.

Esse retrato, explorando a crueldade e a violência da guerra, é bastante comum ao tipo de produção citada inicialmente e ao qual Ristovski parece se filiar. Entretanto, mesmo contando com um escopo de produção considerável – a ambientação realista, a reconstituição de época, o grande número de figurantes – o realizador não demonstra intimidade com o registro da ação, se limitando ao uso de uma câmera trêmula para captar os tiros e explosões criados por CGI – que resultam quase sempre artificiais. Esse registro banal carece da fisicalidade e do senso espacial para a construção do espetáculo de ação intenso almejado, como o proporcionado por Mel Gibson em seu Até o Último Homem (2016) ou por John Woo no subestimado Códigos de Guerra (2002). A sucessão de embates repetitivos e sem inspiração, intercalada a sequências de conversas de bastidores igualmente triviais, compõe a metade preambular do longa sem despertar grandes sentimentos ou interesse.

A partir da decisão do exército sérvio de bater em retirada pelas montanhas da Albânia, ocorre a virada narrativa para o drama de sobrevivência, acompanhando a árdua marcha dos soldados, repleta de adversidades – a neve, o terreno traiçoeiro, a escassez de mantimentos, etc. Nesse novo cenário, Ristovski insere uma subtrama com ecos de O Resgate do Soldado Ryan (1998), com o Rei não medindo esforços na busca por Marinko para entregar ao soldado as meias tricotadas pela mãe e dadas ao monarca num encontro fortuito. O excesso de coincidências pouco verossímeis como esta e certa indecisão quanto ao tom da abordagem – refletida na trilha sonora que varia entre uma orquestração clássica e interlúdios com notas de guitarra, que remetem aos faroestes de Sergio Leone – sinalizam a inconsistência na condução de Ristovski. É somente no ato final que o diretor parece se encontrar, dando corpo aos arcos dramáticos – especialmente a dinâmica do trio Marinko, Zivota e Momcilo – e se aprofundando na investigação da personalidade de seu protagonista.

Ainda que ofereça poucas informações sobre o passado de Petar – exceção feita aos flashes da cerimônia de coroação, que sintetizam o peso da responsabilidade que carrega –, O Último Rei da Sérvia conta com a ótima atuação e a presença imponente de Lazar Ristovski (pai do cineasta) no papel principal, transmitindo os valores do Rei, como a generosidade, a humildade e o desejo de libertar seu povo. Juntamente com esse aprofundamento na figura central, Ristovski (o diretor) consegue imprimir alguma personalidade formal, estética, ao seu trabalho, criando cenas mais ricas e elaboradas, como diálogo de Petar e Zivota acerca do conceito de liberdade do filósofo britânico John Stuart Mill. As sequências finais na praia, além de plasticamente belas, carregam um ar melancólico e desesperançoso, que materializa sentimentos familiares ao povo sérvio, que viria a sofrer com diversos outros conflitos. Um desfecho que eleva o patamar da obra, mas não o suficiente para suplantar o longo, genérico e por vezes tortuoso caminho percorrido até então.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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