Crítica


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4 votos 7.6

Onde Assistir

Sinopse

O rei resolve banir todos os mágicos para a temida Terra dos Espelhos, onde está presa a famigerada Rainha da Neve. Apenas a pequena Gerda, humana aparentemente sem poderes extraordinários, que já salvou o dia inúmeras vezes antes, pode evitar esse movimento de exclusão e preconceito.

Crítica

Na atualidade atravessada por repressões e discriminações infelizmente recorrentes, O Reino Gelado: A Terra dos Espelhos, embora portador de vários problemas, carrega uma mensagem importante sobre convivência. A protagonista é Gerda, jovem descendente de uma família de mágicos que aparentemente não possui qualquer habilidade extraordinária. Todavia, mesmo sendo “comum”, ela derrotou nos exemplares anteriores da saga – este é o quarto filme da franquia russa animada – a temível Rainha da Neve. A premissa deste dá conta dos esforços do rei Harald para banir toda pessoa capaz de conjurar feitiços, numa retaliação ao ataque feroz da antagonista num passado relativamente recente. Portanto, a animação opõe severamente os que desejam extirpar do convívio social os nascidos diferentes e os que destoam do padrão ali vigente. Há dilemas tratados de maneira um tanto óbvia, algo bem compreensível levando em consideração o público-alvo infantil.

O mundo de O Reino Gelado: A Terra dos Espelhos está em transição e essa mudança é marcada pela ojeriza do monarca outrora atacado pela Rainha da Neve. De um lado, o progresso das máquinas a vapor, os robôs que, por exemplo, cuidam da limpeza das ruas e os barcos-aeronaves. Do outro, a tradição sendo deixada gradativamente de lado, boa parte por preconceito e obscurantismo, mas igualmente por força da ignorância. Pena que o filme não invista de um jeito maduro no desenvolvimento do subtexto poderoso, inclusive estabelecendo oposições pueris entre crença e ciência. O cultor do progresso e do conhecimento assume a postura da vilania, pois de olhos fechados para aquilo que não pode mensurar ou explicar racionalmente. É de certo modo canhestro esse retrato absolutamente dicotômico e destituído de matizes em que o pensamento motiva a exclusão e nutre a hostilidade, isso enquanto a magia, ou seja, a fé é perseguida por existir.

Afora esse ruído, O Reino Gelado: A Terra dos Espelhos utiliza "muletas" para tornar menos pedregosos os caminhos aparentemente intransponíveis. Gerda precisa se aliar à antiga inimiga para cumprir sua missão. Há uma conveniência nessa tutoria da bruxa convertida em espírito, entidade que tudo sabe, cuja atuação passa pelo apontamento de caminhos e um sem número de facilitações, às vezes forçando a barra. Circunstâncias são retorcidas para melhor caberem numa dinâmica bastante óbvia, pontuada frequentemente pela constatação de que a protagonista pode desenvolver faculdades mágicas determinantes quando for preciso. Não é difícil antever que a menina supostamente desprovida de truques vai se mostrar poderosa num instante-chave e derradeiro. Alguns quadros amorosos descartáveis surgem nesse molho dominado pelo sabor da aventura, mas apenas para dar um tempero diferente às tensões. Tudo é bem telegrafado, sem espaço a tantas surpresas.

Apesar de suas fragilidades conceituais, O Reino Gelado: A Terra dos Espelhos dosa bem a aventura, com planos e movimentações bonitos pela cidade de contornos singulares, e a busca pessoal de Greta. Ela é evidentemente desenhada como espelho da Rainha da Neve, aliás, personagem inicialmente maléfica que vai se mostrar útil e menos perigosa do que antes. A síndrome “Malévola”, caracterizada por uma personalidade nefasta se redimindo e auxiliando os mocinhos e as mocinhas, chega com tudo à saga russa. Aqui, no entanto, essa mudança atende à vontade manifestada de borrar certas fronteiras entre o bem e o mal, focando energias na observação da necessidade de deixar diferenças de lado e fazer particularidades funcionarem em consonância para o bem geral. Há ajustes tolos, personagens deixados de lado em meio à correria, reduções, mas, ao menos, o desejo de refletir, por meio da fantasia, sobre os inúmeros efeitos sombrios do preconceito.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
5
Alysson Oliveira
3
MÉDIA
4

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