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Sinopse

O experiente produtor de TV Lowell Bergman suspeita que há algo de muito podre por trás do silêncio de Jeffrey Wigand, ex-executivo da indústria do tabaco que se recusa a dar-lhe entrevista. Quando finalmente este decide revelar segredos aterradores, os dois precisarão lidar com pressões inimagináveis.

Crítica

Mais do que lançar luz sobre o caso verídico de um executivo recém-demitido que torna públicos determinados dados inflamáveis, até então ultrassecretos, da indústria do tabaco, uma das mais influentes e hermeticamente fechadas, O Informante dá ares de bem-vinda transgressão à integridade dos indivíduos. Logo no começo, vemos Lowell Bergman (Al Pacino), produtor do famoso programa 60 minutos da rede de televisão CBS, em meio a uma operação perigosa no Oriente Médio. A missão é conseguir o depoimento de uma liderança extremista, nem que para isso seja necessário arriscar-se seriamente. Nas mãos de um diretor menos conectado com a realidade, no que ela tem de sórdido e aviltante, essa ignição, bem como o percurso que ela precede, poderia ser pautada por uma abordagem romantizada. Segundo o olhar de Michael Mann, a tenacidade de Lowell e a iniciativa de Jeffrey Wigand (Russel Crowe) são frutos da árdua resistência, respostas incisivas e legitimadas pela verdade.

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A atmosfera de instabilidade é vital no filme de Mann. As situações e os respectivos desdobramentos são exemplarmente conectados por seus principais pontos de tensão. Testemunhamos os dilemas do jornalista que faz de tudo para as denúncias ganharem a luz do dia e as tentativas de encontrar saídas do labirinto jurídico deflagrado como antessala da soberania corporativa. Paralelamente, melhor dizendo, de maneira imbricada, temos a batalha pessoal empreendida pelo homem que pode colocar impérios abaixo, desde que para isso tenha a coragem de penhorar a própria segurança, as relações mais próximas, as possibilidades profissionais e a estabilidade emocional. O Informante se desenvolve como um genuíno thriller, no qual os conglomerados dão as caras com parcimônia, já que seus procedimentos de intimidação ocorrem significativamente nas sombras da legalidade, nas brechas que o sistema lhes confere para que continuem detendo um poder desproporcional.

Jeffrey coloca a pele em risco para expor a hipocrisia de empresários que mentem sob juramento ao alegar ignorância quanto aos efeitos viciantes da nicotina, entre outros malefícios do produto que vendem indiscriminadamente. Já Lowell é o interlocutor com as instâncias que podem permitir alguma mudança, as legais e as midiáticas. O Informante consegue mesclar com bastante eficiência a desesperança frente a um mundo corrompido, cujas regras tortas e benéficas somente a um pequeno grupo são seletivamente flexíveis, e a exaltação da audácia de quem luta contra as tormentas, mesmo sabendo das pequenas chances de vitória. O idealismo dos personagens de Pacino e de Crowe é o grande destaque desse combate desigual. Por vocação, eles desejam consertar o que foi concebido essencialmente como fratura. Os acordos de confidencialidade, escudos às condutas abjetas dos gigantes do tabaco, colocam interesses particulares acima do bem-estar geral, valor, a priori, inalienável.

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Em O Informante, a ameaça à veiculação da entrevista, ou seja, a possível frustração das intenções dos protagonistas, coloca a supremacia financeira acima dos preceitos que, em tese, deveriam sustentar o jornalismo. Mann ressalta ações individuais e/ou levadas a cabo por pequenos grupos. Já que é praticamente impossível derrubar a mitológica hidra de uma vez por todas, que, ao menos, ela sofra sucessivos golpes, talvez perdendo uma de suas cabeças em virtude da insistência de gente como Lowell e Jeffrey. Apoiados por um elenco coadjuvante de respeito, que inclui nomes como Christopher Plummer, Philip Baker Hall e Michael Gambon, Al Pacino e Russel Crowe dão vida, com vigor e personalidade, a dois homens que confrontam um emaranhado de leis e outros dispositivos criados basicamente para manter intacto o estado das coisas que favorece uns poucos, em detrimento da saúde e da dignidade de outros tantos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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