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Sinopse

Jeanette Walls, que vem de família de nômades não-conformistas, tem uma mãe excêntrica e um pai alcoólatra. A jovem escritora, que teve uma infância agitada, sempre buscou a fértil imaginação para se distrair com a situação delicada da família.

Crítica

O primeiro longa hollywoodiano do diretor Destin Daniel Cretton foi um dos projetos mais disputados nos últimos anos por atrizes em busca de um material relevante e uma oportunidade de destaque sob os holofotes. Baseado no best seller de Jeannette Walls – que, por sua vez, se inspirou em sua história real – o projeto do filme O Castelo de Vidro chegou a contar por muito tempo com a oscarizada Jennifer Lawrence como protagonista. Com a desistência dessa – o que nunca é bom sinal, aliás – acabou-se optando por outra jovem recém premiada com a estatueta dourada: Brie Larson. Ela, afinal, já havia trabalhado com o cineasta, no independente Temporário 12 (2013), filme que serviu para revelar os talentos dos dois. A expectativa por esta nova reunião, portanto, era alta. Mas o resultado agora apresentado nas telas vai em sentido contrário, beirando o constrangimento em mais de uma ocasião.

A destino da família Walls sempre pareceu estar sujeito aos humores do patriarca, Rex (Woody Harrelson, um ator que costuma ser confiável, mas que aqui se revela sem controle e dado a momentos de histrionismo que fazem da tarefa de se acompanhar essa história um exercício desgastante e cansativo). Ele é daqueles tipos maiores que a vida, expansivo, dado a rompantes de energia e outros de profunda depressão. Alcóolatra, renega esse problema a ponto da própria esposa (Naomi Watts, sem muitas oportunidades) levar anos para percebê-lo. Mas o foco aqui é a filha do meio, Jeannette (Larson, quando adulta). Colunista social bem estabelecida na cidade grande e noiva de um jovem empreendedor, ela se esforça ao máximo para apagar de sua memória o passado ao lado dos pais. Mas este será um desafio no que ela nem sempre conseguirá ser bem-sucedida.

A narrativa, a partir de uma apresentação inicial, irá se desenvolver em duas linhas paralelas: os dias de hoje, nos quais a garota precisará decidir se quer apenas ceder à energia exaustante dos pais, que drenou a infância de cada um dos quatro fiilhos, ou investir numa mudança arriscada e radical, cortando laços e mudando posicionamentos; e a do passado, que revela os traumas enfrentados, as lições de vida aprendidas às duras penas e os conflitos que moldaram os relacionamentos não apenas dela com os dois adultos que deveriam criá-la, mas também com cada uma daquelas crianças que, assim como ela, foram submetidas e este mesmo formato de (má) educação, anárquica, com modelos de comportamento bastante questionáveis, porém libertária, instintiva e que visava a construção da autoestima de cada um, ainda que nem sempre com os melhores resultados.

Essa ausência de responsabilidades – em um dos primeiros flashbacks, acompanhamos a protagonista, com não mais do que cinco anos, indo parar no hospital após atear acidentalmente fogo no vestido que usava ao cozinhar para a mãe, ocupada demais com sua arte como pintora – também não foi isenta de repercussões. A filha mais velha, assim que pode, tratou de fugir dos abusos e mal tratos, enquanto que a caçula se revelou uma jovem retraída, problemática e incapaz de desatar esses laços. O único menino, por outro lado, acabou seguindo a carreira de policial, um defensor da ordem e da justiça – uma desilusão aos olhos paternos. Jeannette, por sua vez, aquela que parecia ser a mais inteligente, é também a mais perdida. Está no meio do caminho entre os extremos perseguidos pelos irmãos. Como a mão do realizador é pesada e força demasiadamente essa visão cruel dos pais – ela desatenta e submissa, ele preferindo deixar que a menina se afogue ou que a adolescente corra o risco de ser estuprada em uma boate para lhe ‘ensinar uma lição’ – é praticamente impossível para o espectador permanecer impassível diante estes relatos. Por isso mesmo, concordar e entender as atitudes da protagonista resulta em um esforço inglório.

Brie Larson, em tese, teria aqui seu primeiro grande papel após o Oscar conquistado por O Quarto de Jack (2015). Ela deveria, no entanto, ter percebido a mudança de decisão de Jennifer Lawrence como um alerta, e não como uma oportunidade a seu favor. Não que ela comprometa – os problemas aqui são outros – mas também parece pouco disposta a investir em algo que, obviamente, não lhe dará o retorno esperado. O título O Castelo de Vidro é uma referência a uma promessa paterna nunca cumprida, mas também essa é uma verdade que se verifica dramaticamente, como um filme que chega a almejar notas mais altas, mas a cada encruzilhada resigna-se a investir em soluções óbvias, alternando do melodrama convencional à narrativa convencional, que abusa dos exageros e dos clichês em busca de uma emoção que não consegue alcançar naturalmente.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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