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Sinopse

Zezé tem vive com a família no interior. Garoto sensível, precoce e contador de histórias, é um verdadeiro problema! Seu refúgio preferido é um pé de laranja-lima. É com ele que desabafa as coisas ruins que lhe acontecem, divide sua solidão ou comemora uma boa novidade, como a amizade com Manoel Valadares, o “portuga”. Uma relação que fará surgir um mundo de fantasias que nunca imaginou possível.

Crítica

Adaptado diversas vezes para a televisão, este romance clássico da literatura infantil nacional foi levado pela primeira vez para o cinema em 1970, num longa escrito, dirigido e estrelado por Aurélio Teixeira. Agora, mais de quarenta anos depois, Meu Pé de Laranja Lima está de volta às telas, mais uma vez tendo como ponto de partida o livro escrito em 1968 por José Mauro de Vasconcelos. Se por um lado a trama e sua estrutura narrativa são voltadas para uma audiência mais jovem, as histórias que se desenrolam em cena são bastante universais, ainda que um pouco ingênuas. Há, durante toda a obra, aquele gosto de infância no interior, longe da modernidade e dos dilemas da vida adulta. E se isso permanece, por outro lado o contexto referencial se esvai, sem uma inovação forte o suficiente que justifique esta revisitação.

O novo Meu Pé de Laranja Lima possui direção de Marcos Bernstein, que revelou jeito com personagens infantis ao escrever – ao lado de João Emanuel Carneiro – o premiado roteiro de Central do Brasil (1998). Desta vez Bernstein também divide a coautoria do enredo, em parceria com Melanie Dimantas, com quem já havia trabalhado em O Outro Lado da Rua (2004), sua estreia como realizador. Os dois demonstram bastante sensibilidade com seus protagonistas, principalmente com o garoto Zezé (o novato João Guilherme, uma revelação), filho do meio de uma família numerosa e em dificuldades. O pai, desempregado há tempos, passa o dia bebendo, enquanto que a mãe precisa se virar ao avesso para conseguir sustentar a casa. Os filhos – são, ao todo, cinco – lidam sozinhos com os problemas do dia a dia. E Zezé, o mais rebelde e inquieto, irá encontrar no pé de laranja lima do fundo do quintal o confidente perfeito para todas as suas novidades, medos e segredos.

Seria este somente mais um conto de amadurecimento e transição para a fase adulta, caso não houvesse espaço para a bonita amizade que surge entre Zezé e o misterioso Portuga (José de Abreu, numa atuação contida e equilibrada, atendendo com competência o que o personagem exige). Este assumirá a função paterna que o garoto tanto ressente, e os momentos em que estão juntos – à sombra das árvores, pescando no riacho ou mesmo andando de automóvel – respondem pelas melhores cenas do filme. Por outro lado, a relação familiar – o pai se importa ou não com o filho? O irmão menor é seu companheiro ou apenas um coadjuvante eventual? A mãe percebe os abusos que o menino sofre regularmente ou prefere se resignar na ignorância? E qual o papel das irmãs mais velhas? – não é muito bem construída, causando uma impressão de desequilíbrio. Até Zezé e o Portuga se encontrarem – o que acontece lá pela metade do filme – o que se tem são causos aleatórios do dia a dia do protagonista, sem, no entanto, um elemento gerador de mudanças ou reflexões.

Tecnicamente primoroso, com uma fotografia delicada de Gustavo Hadba (Malu de Bicicleta, 2010) que explora com eficiência um clima onírico e difuso de recordações, Meu Pé de Laranja Lima peca, no entanto, com o exagero da trilha sonora de Armand Amar (A Fonte das Mulheres, 2011), que pontua praticamente toda a trama, e não de modo subliminar, mas sim indicativo, como que orientando o espectador sobre quais sentimentos são investigados em cada cena. É um problema, ainda que menor, pois deve afetar uma melhor aceitação do espectador, principalmente aquele que busca reviver emoções de uma infância distante. Ao público jovem, que irá descobrir somente agora essa obra, no entanto, a obra se demonstra razoavelmente competente, digna e sincera, repleta de boas intenções e eficiente dentro dos limites que ela mesmo se impõe. Está longe de ser inesquecível como o original, mas cumpre à contento aquilo que se propõe. Em última instância, é um bom filme que sofre principalmente pela impressionante sombra na qual optou se acolher, que termina por eclipsá-lo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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