Meu Amor por Grace

Crítica


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Sinopse

Após a morte da mãe, Jo, jovem japonês que vive no Havaí do início do século 20, é adotado por um médico norte-americano. Com o passar do tempo, ele se torna parte importante da comunidade e adiante se apaixona pela filha do patrão, enfrentando toda sorte de interdições na tentativa de viver intensamente um amor então proibido.

Crítica

O cenário de Meu Amor por Grace é o Havaí do início do século passado, no qual vicejam plantações de café cultivadas por imigrantes japoneses em meio ao ambiente vulcânico. Há, desde o princípio, uma fricção entre os empregados e o patrão norte-americano, personagem desenhado como um vilão absolutamente arquetípico e destituído de matizes. Todavia, nem mesmo o seu racismo, sublinhado num par de ocasiões, se impõe como algo importante no filme dirigido por David L. Cunningham. Aliás, há uma série de tensões nessa trama de fundo histórico e núcleo romântico, mas pouca coisa funciona apara além da reprodução de modelos utilizados à exaustão pelo cinema. Doc (Matt Dillon), médico designado para cuidar dos subalternos, acolhe um menino deixado órfão pela praga que dizimou parte dos locais, incluindo a esposa do empregador. O desgarrado e a herdeira das terras, então, são interligados pela tragédia. Está desenhada uma sina que envolve amor proibido.

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O filme é construído sobre uma sucessão de interdições ao futuro dos “bons de coração”. Jo (Ryan Potter), o garoto adotado informalmente pelo médico, se torna um jovem destemido, peça imprescindível no cotidiano daquela organização social em virtude do auxílio ao benfeitor, especificamente pela rapidez com a qual cruza divisas a fim de administrar medicamentos e viabilizar atendimentos emergenciais. O filme fica emperrado na reiteração dos vínculos desenhados de modo simplório, com insatisfações surgindo e sendo rechaçadas sem tantos efeitos, com rapidez e displicência. A opulência dos planos elaborados, tentativa impotente de oferecer contornos grandiosos a uma trama repleta de desvãos e desencontros amorosos completamente telegrafados, não é suficiente para abrandar a sensação de mera justaposição de procedimentos e figuras desgastadas. O aspirante a doutor precisaria lutar contra a falta de um sobrenome e os demais empecilhos à sua felicidade.

Porém, o realizador decide apostar numa sequência banalizada de obstáculos óbvios. O viés esquemático da narrativa se acentua com a chegada de Reyes (Jim Caviezel), médico que circula num possante automóvel. Dentro da proposta em que o maniqueísmo surge como ferida não cicatrizada e intermitentemente incômoda, esse personagem é o típico vilão que está ali somente para complicar ainda mais as coisas ao casal impedido de consolidar-se por conta de tantas barreiras inerentes à classe social e ao preconceito racial/étnico vigente. Mas, infelizmente, David L. Cunningham prefere amontoar diversos lugares-comuns concernentes aos romances impossíveis ao invés de, no delinear da impossibilidade, compreender com alguma profundidade as origens da proibição. Acaba que o filme passa de maneira desinteressada, quase indiferente, por questões bastante intrincadas. O saldo é condicionado pela falta de vontade diretiva para conferir tônus ao todo.

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Meu Amor por Grace se vale de uma fórmula muito conhecida, não desviando das armadilhas dos clichês que formulam sua base. O pobre órfão, a certa altura, questiona o tutor, pois enfeitiçado pela novidade atrelada ao novo. O filme, no entanto, desperdiça até essa dicotomia surrada entre o valor da tradição e a falsa obsolescência apregoada pela modernidade. O envolvimento entre Jo e Grace (Olivia Ritchie) não tem tintas vibrantes, no mais das vezes soando como mero protocolo para adicionar (mais uma) camada aos infortúnios, nesse enredo já tão assoberbado de problemas a serem contornados em direção a um final feliz. Há qualidades no desenho da produção, com boas reproduções do modo de trabalho menos automatizado da era à qual o longa remonta, mas afora os pontuais predicados atrelados à direção de arte, principalmente, o conjunto deixa a desejar, sobretudo pela inabilidade para tornar verdadeiramente intenso o aglomerado de impasses.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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