Crítica
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Sinopse
Casados há muito tempo, Aldo e Vanda encontram seu apartamento revirado ao voltar de viagem. Antigas e dolorosas lembranças volta à tona e ambos percebem que algumas feridas nunca cicatrizarão.
Crítica
Vanda ama Sandro, que ama Anna, que ama Aldo, que ama todo mundo. E também ninguém. Ao se debruçar sobre uma família em ruínas que, mesmo quando tudo aponta o contrário, tenta se reconstruir de qualquer jeito, o diretor Daniele Luchetti deixa de lado alegorias, como as vistas no seu trabalho anterior (O Rei de Roma, 2018), e se volta à temas que costumavam ser mais frequentes no início de sua carreira, em longas aclamados como Meu Irmão é Filho Único (2007) e Anos Felizes (2013). Essa mudança de rumo – ou volta ao eixo – faz bem à narrativa de Laços, ainda que o cineasta, que se encarregou da adaptação de um romance de muito sucesso em seu país natal (Itália), não consiga evitar alguns maneirismos tanto em forma como no estilo. Afinal, uma abordagem mais direta e menos confusa cairia melhor ao conjunto do que a elaboração através da qual a trama se apresenta, que ao invés de acrescentar novas camadas de leitura, consegue apenas servir de distração.
As cenas de abertura se ocupam de ilustrar um sonho de margarina: um dia em que tudo parece dar certo, de passeios por lugares lúdicos e momentos de descontração em conjunto. E assim que as crianças são colocadas para dormir – não sem antes terem direito a uma história de ninar – marido e esposa deixam de lado as máscaras que carregaram por tantas horas e revelam suas verdadeiras facetas. Ele afirma, sem meias palavras, ter dormido com outra mulher. Ela, surpresa pela revelação que nem desconfiava, consegue apenas questionar: “por qual razão você está me dizendo isso?”. O homem não sabe o que quer, não está certo se deve ficar ou se é chegada a hora de partir. É aquela ao seu lado que o lembra que um compromisso foi assumido, um contrato existe, e qualquer mudança significará uma quebra de valores, de expectativas. E se quando um não quer, dois não brigam, o mesmo pode ser tido sobre a concordância que se almeja: essa também carece de uma sintonia.
Aldo é vivido por Luigi Lo Cascio, presença marcante em títulos como A Melhor Juventude (2003) e o recente O Traidor (2019). É ele o homem da casa, o marido, a força masculina que abandona suas obrigações com aqueles que tempos atrás havia escolhido assumir em nome de uma aventura que não consegue levar adiante, ainda que essa pareça ser a sua maior vontade. Vanda, por sua vez, ganha força através da frágil composição de Alba Rohrwacher, uma rocha sólida que rapidamente desmorona assim que vê suas certezas desaparecerem a partir do abandono marital. Mas se engana quem pensar que ele é o vilão, e que ela vive apenas através de um homem que existe para validá-la. As relações são mais complexas do que julgamentos apressados podem apontar. Essa impressão se confirma quando o espectador se depara com o mesmo casal, algumas décadas depois. Agora, Aldo e Vanda são vistos em Silvio Orlando (The Young Pope, 2016) e Laura Morante (O Quarto do Filho, 2001). A situação parece invertida: ela sem paciência e insatisfeita, ele complacente e resignado. Ambos, portanto, cansados.
O que os liga, tanto antes quanto depois, são os filhos que trouxeram ao mundo. Os pequenos Sandro e Anna servem, quando crianças, apenas para tornar aquele casamento real, e se na adolescência um lampejo de personalidade se permite vislumbrar – principalmente na garota, a primogênita – é na fase adulta que, enfim, revelam seus papeis nesse drama (não muito distante de uma farsa). Adriano Giannini e Giovanna Mezzogiorno surgem para resolver uma questão pontual. A coisa funciona pela objetividade da proposta. São não mais do que vinte minutos – os finais da trama – mas que devem esclarecer o que foi visto até aquele momento. Oferecem um novo olhar às idas e vindas paternas, servindo ainda para propor um entendimento para suas condições como adultos, o que alcançaram e o que deixaram pelo caminho.
Enquanto separados, o pai tinha direito a dias determinados para passar com os filhos. Num desses encontros, a menina provoca: “foi você que o ensinou” – apontando para o irmão – “a amarrar os sapatos? O nó dele é muito diferente, ninguém faz igual, chama atenção”. Começa como uma tentativa de queixa, mas termina como convencimento, quando se mostra disposta a aprender como prender os cadarços da mesma forma. A referência é evidente. As forças que os unem também podem servir para afastá-los, dependendo como cada um irá aproveitar tais exemplos. Hoje ou amanhã, agora ou muito tempo antes, as lições permanecem as mesmas. Assim, Laços vai além do mero drama familiar para se colocar como uma parábola de erros e perdões, que podem representar distâncias intransponíveis ou acertos de contas tardios. A escolha, por fim, é solitária.
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