Crítica
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Sinopse
Depois de se apaixonar pela enigmática Sadie, Cole tem seu mundo revirado de cabeça para baixo, especialmente ao descobrir que sua amada é uma agente a serviço da CIA. E a situação se complica quando eles dividem uma missão.
Crítica
Muito tem se discutido nos últimos tempos (não apenas dias e meses, mas anos) a respeito do papel feminino nos filmes (e histórias em geral, para ser mais exato) de aventura. Há muito deixou-se de olhar para elas apenas como “moças indefesas que precisam ser salvas”, uma mudança de postura que vem desde a animação Shrek (2001) – quem disse que Fiona precisava de ajuda para fugir do dragão? – até colocar uma mulher como a nova agente secreta com licença para matar em 007: Sem Tempo para Morrer (2021). Neste último, apesar de ser Lashana Lynch que assume a tarefa de substituir James Bond, é Ana de Armas, como uma bondgirl nada indefesa, que capitaliza grande parte das atenções em uma participação mínima, mas que gerou muitos comentários. Tanto é que ela volta ao gênero em Ghosted: Sem Respostas, mas não mais como coadjuvante (ou quase isso). Afinal, ainda que no filme de Dexter Fletcher o protagonista seja mais um vez um homem – no caso, Chris Evans – é ela a responsável pelo andar da trama e por, no final das contas, garantir a segurança dos envolvidos. Uma bem-vinda mudança de paradigma que, a despeito de qualquer outro mérito envolvido, é suficiente para despertar um interesse insuspeito em relação a esse título que, caso contrário, teria tudo para ser mais um dentre tantos genéricos similares.
Para quem não está familiarizado com o termo, “dar o ghosted em alguém” pode ser entendido como “dar um perdido”, ou seja, após um encontro no qual tudo se desenrolou de modo aparentemente normal, a pessoa não dar mais notícias a partir do dia seguinte, parando de responder mensagens e nem mais entrar em contato. Os motivos para tal postura podem ser os mais diversos, mas raros serão os que terão as mesmas desculpas de Sadie (Armas), que apesar de declarar ter aproveitado cada momento da noite que passou ao lado de Cole (Evans), não retornou nenhuma das tentativas dele em voltar a falar com ela. No entanto, por mais que para ele esse sumiço seja quase inexplicável, as razões dela são fáceis de serem compreendidas: Sadie é uma espiã do governo dos Estados Unidos em meio a uma operação altamente secreta pela Europa e Ásia, tentando desbaratar uma transação internacional que poderá liberar um novo vírus capaz de dizimar cidades inteiras. No entanto, como os dois tiveram apenas um encontro – que se estendeu por horas e terminou apenas na manhã seguinte – não houve tempo, ou mesmo confiança, para que esses detalhes fossem abordados. E sem saber como proceder, o rapaz decide ir ao encalço dela. Uma atitude que muitos veriam como a de um carente excessivo com potencial para perseguidor tóxico, mas que ele afirma ser apenas um gesto romântico inesperado.
Muito da graça que Ghosted: Sem Resposta evidentemente possui está na conta dos responsáveis por ilustrar tais desventuras. Fossem dois outros astros do momento, é provável que algo se perdesse. Isso porquê tanto Evans quanto Armas funcionam juntos de modo exemplar, mesmo que nem sempre como par – nos dois trabalhos anteriores deles, Entre Facas e Segredos (2019) e Agente Oculto (2022), apareceram como antagonistas – e o envolvimento que agora demonstram agrega uma nova camada de leitura a essa relacionamento. Também é notório a filmografia recente que ambos carregam. Ela acaba de vir de uma indicação ao Oscar – sua primeira – como Marilyn Monroe em Blonde (2022), dando vida a uma mulher que durante toda a sua existência foi vítima das situações em que se via envolta, bem o oposto do que lhe acontece dessa vez. Já ele, bom, está se falando de ninguém menos do que o rosto do Capitão América, um dos maiores super-heróis de todos os tempos, que troca de lado e se revela nas posições mais constrangedoras, não apenas uma, mas duas ou mais vezes tendo que ser resgatado da morte certa pela namorada que mal conhece. Um estranhamento divertido e apropriado aos tempos atuais.
Se Evans havia exercitado seus músculos cômicos em outras ocasiões e Armas mostrou em mais de uma oportunidade saber se defender tão bem – ou melhor – do que seus colegas barbudos, a surpresa, então, vem da condução leve e dinâmica de Fletcher, recém saído de dois musicais (não apenas salvou o resultado de Bohemian Rhapsody, 2018, ainda que não tenha sido creditado, como na sequência entregou o superior Rocketman, 2019). A versatilidade que explora dessa vez impressiona pela maneira segura que trata não apenas seus personagens, mas também os eventos com os quais estes se envolvem, indo desde sequências tradicionais, como a perseguição de carros (o ônibus desgovernado em pleno deserto é de deixar qualquer um sem piscar) como também na inversão de conceitos (é o homem que terá que servir de isca para o vilão, repetindo como um mantra um pedido de socorro para que ela venha livrá-lo do perigo na hora exata). Mas não apenas nesses momentos é que seu olhar fará diferença. Essa abordagem se manifesta desde o começo – a primeira meia-hora do filme é digna das comédias românticas mais triviais, sem antecipar nada do que virá depois – até no entorno, oferecendo coadjuvantes que, cada um ao seu modo, também não passarão desapercebidos (de Adrien Brody a entrega é segura como de costume, mas o que dizer das aparições de Anthony Mackie, John Cho, Sebastian Stan e até Ryan Reynolds?).
No entanto, mesmo com tanto em cena que poderia funcionar de forma reversa e, ao invés de colaborar, agir como distração, Ghosted: Sem Resposta evita tais armadilhas pela forma coesa como sua ação se desenrola, sem nunca perder de vista o desconforto que deu início a esse imbróglio: duas figuras inadequadas – ele, inseguro e deslocado, incapaz se mostrar tranquilo ao lado de uma futura pretendente (talvez a parte mais difícil de ser levada a sério, afinal, é Chris Evans que precisa tornar esse personagem convincente), e ela, uma máquina assassina e impiedosa, perspicaz o suficiente para derrubar impérios e exércitos, mas sem a menor habilidade para qualquer tipo de envolvimento amoroso – que, de um jeito ou de outro, acabarão funcionando juntos. Uma fórmula que, se não reinventa a cartilha, ao menos é executada com compromisso e criatividade, além de contar com uma troca de olhar que chega em ótima hora. Não vai transformar a vida de ninguém, é certo. Mas que garante duas horas de boa diversão, não há dúvidas. E, se além disso, ainda provoca uma reflexão (por menor que seja), a missão está mais do que cumprida.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 7 |
Francisco Carbone | 2 |
Leonardo Ribeiro | 4 |
MÉDIA | 4.3 |
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