Crítica
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Sinopse
O Brasil nos anos 1950 e 1960 passa por grandes transformações, Brasília é construída, a Bossa Nova faz grande sucesso e o Rio de Janeiro se transforma rapidamente preparando-se para deixar de ser a capital federal. É quando Elisabeth Bishop, poetisa americana, chega para conhecer o Rio de Janeiro e passar alguns dias com Lota de Macedo Soares, mulher forte e empreendedora da sociedade carioca. Com personalidades muito a frente de seus tempos, elas rapidamente estabelecem uma relação pessoal gerando conquistas e perdas, que se refletem até os dias de hoje.
Crítica
Arte e melancolia, de mãos dadas, melhor definem Elisabeth Bishop, poeta americana vinda ao Brasil nos anos 1950 para abrandar tormentos intermitentes. Ela largou a bucólica Nova Iorque, metrópole cujas avenidas e demais cenários estavam impregnados de lembranças ruidosas, para desembarcar num Rio de Janeiro caloroso, repleto de belezas naturais, então às voltas com o progresso. Na Cidade Maravilhosa, ela conheceu a arquiteta Lota de Macedo Soares, com quem iniciou romance de felicidades e turbulências quase na mesma medida. Flores Raras é o filme que chega às telas para contar a história desse envolvimento, emoldurando-o, ainda, com a efervescência sociocultural e política da época na qual os fatos ocorreram.
O diretor Bruno Barreto partiu do livro Flores Raras e Banalíssimas, de Carmen L. Oliveira, para sustentar seu longa, que abarca desde a migração da vencedora do Pulitzer até o triste fim daquilo que alterou drasticamente sua trajetória, esta anteriormente feita apenas de sucesso profissional e automutilação emocional. Bishop é interpretada por Miranda Otto, atriz australiana mais conhecida pela coadjuvância na trilogia O Senhor dos Anéis (a partir do segundo), aqui verdadeiramente posta à prova num trabalho que tende a lhe garantir merecido reconhecimento. Seu retrato, entre o instrumento do sublime ofício e a vítima da decadência sentimental, garante minuciosa identificação com a figura histórica. Já Lota surge por intermédio de Glória Pires, outro dos pilares do filme, naquele que, provavelmente, é o papel mais à altura de seu talento, em anos.
Aliás, se há algo bastante consistente em Flores Raras é o desempenho dos atores, fruto não apenas dos nomes escolhidos, mas, dada a homogeneidade, de um possível rigor diretivo, talvez focado justo na construção dos personagens e no posterior registro deles. De onde posso ver, não seria exagero dizer que o tônus do filme está, de fato, nas figuras dramáticas, para além de qualquer elemento. Entretanto, Barreto desloca sua câmera com elegância, exibindo-se em demasia aqui e ali, é verdade, mas também nunca deixando de lado certo refinamento no tratamento da imagem e/ou das pequenas sutilezas. A reconstituição de época, outro fator importante, é bem convincente, ainda mais, pois amparada pela direção de arte consonante com seus pressupostos.
Mesmo falado prioritariamente em inglês, Flores Raras é brasileiro. Pensando em perspectiva, habita, ideológica e esteticamente, um caminho intermediário dentro da atual produção nacional (claro, salvo as exceções de sempre), pois nem neochanchada, muito menos pseudo-arte, sendo mais alinhado ao chamado “Cinema Clássico”. Não transcende algumas limitações, sobretudo as ditadas pelo roteiro ligeiramente dispersivo. As soluções para determinados conflitos se dão no simples esquecimento ou nas transições sem impacto maior. Mas seria injustiça negar a Flores Raras reconhecimento pela beleza no que diz respeito à exploração do relacionamento de Elisabeth e Lota, visto como fruto de sentimento capital a ambas. A fria Elisabeth, cada vez mais aberta (tanto quanto lhe foi possível) ao tropicalismo afetivo do Brasil, enquanto a obsessiva Lota, gradativamente ciente do valor do amor, não em oposição à paixão vocacional, mas como um dos temperos existenciais de mais inefável sabor, por vezes entre o mel e o fel, mas ainda assim imprescindível.
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