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Sinopse

Insatisfeita com os livros que escreve, uma autora publica protegida por um pseudônimo. Esposa de um soldado que vive viajando, ela também é infeliz na vida pessoal.

Crítica

Na cena de abertura de A Flor do Meu Segredo, ainda durante a apresentação dos créditos, acompanhamos um diálogo entre dois médicos que buscam explicar a uma mãe a morte cerebral sofrida por seu filho. A aparente negação da mulher frente a esta dura notícia impregna a sequência de ares graves de tragédia, até que a presença de um corpo estranho em quadro, uma câmera de vídeo, repentinamente quebra a atmosfera construída. Pouco depois é revelado que o que acompanhamos até então se tratou de uma farsa, uma representação. A mãe é na verdade uma atriz que participa de uma espécie de palestra/treinamento para médicos sobre como lidar com parentes de vítimas fatais e também como incentivá-los à doação de órgãos.

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Este jogo de aparências, entre o que acreditamos ver e o que realmente é mostrado, é repetido por Almodóvar durante todo o longa – a personagem que calça as botas não é a mesma que sapateia na cena seguinte. Dentro de um bar, um painel forma uma falsa paisagem ensolarada, enquanto chove do lado de fora – como forma de amplificar o drama de sua protagonista Leo Macías (Marisa Paredes) que também se esconde atrás de uma personalidade fictícia, utilizando um pseudônimo, Amanda Gris, para escrever os romances baratos que abomina, mas que fazem grande sucesso. As histórias de amor banais e idealizadas escritas por Leo acobertam sua ruína pessoal, com a tentativa em vão de salvar o casamento com Paco (Imanol Arias), um militar sempre ausente.

Almodóvar joga também com a expectativa, com a imagem que projetamos sobre Leo. Uma escritora de sucesso, em boa situação financeira, culta, elegante e que, portanto, deveria ser feliz. Algo que contrasta completamente com o verdadeiro estado da protagonista: egoísta, insegura, dependente – até mesmo para conseguir descalçar suas botas - e infeliz. Essa dualidade chega ao ponto máximo quando Leo aceita um emprego como crítica literária em um jornal e, utilizando outro pseudônimo, ataca o trabalho de Amanda Gris. O cineasta reforça este sentimento utilizando ferramentas visuais, como apresentar Leo em vários momentos através de seu reflexo em espelhos, janelas ou nas portas de vidro da redação do jornal, que multiplicam e distorcem sua figura.

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Neste cenário de desilusão, Leo é obrigada a reencontrar sua verdadeira identidade. Uma busca que se inicia quando ao invés de entregar um novo livro de Amanda Gris para sua editora, leva o manuscrito de um romance obscuro sobre uma mulher que mata o próprio pai após este tentar estuprá-la – premissa que curiosamente Almodóvar transformaria em filme anos depois com Volver (2006) –, e que é prontamente rejeitado. Sua jornada de autodescoberta passa também pela relação com o editor-chefe do jornal, Ángel (Juan Echanove), um admirador do trabalho de Amanda Gris que se interessa ainda mais por Leo ao descobrir que as duas são a mesma pessoa. Mas é o retorno às raízes que se mostrará realmente necessário para que a protagonista complete sua trajetória.

É preciso que Leo enfrente o medo de seguir a sina das mulheres de sua família, que nas palavras da mãe sempre terminam loucas e solitárias, para aceitar ser quem realmente é. Esta volta ao passado - tema que se repente ao longo da filmografia do espanhol de modos diversos, como no já citado Volver, por exemplo – se dá em uma visita à vila originária de sua família, e é fundamental para a transformação de Leo, que no belo poema recitado por sua mãe, ou na canção entoada pelas senhoras idosas que costuram nas calçadas do pequeno povoado, reencontra sua realidade. Todo este percurso é captado por Almodóvar com muita sensibilidade em um registro menos cômico e bem mais contido do que o habitual, marcando o início de um novo período em seu cinema.

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Isso não impede que o diretor empregue outros elementos típicos de sua obra: as cores quentes, em especial o vermelho, sempre presentes nas roupas de Leo ou ainda no figurino da empregada da escritora que revela seus dotes artísticos em uma sequência plasticamente impecável de dança performática ao lado do filho. Há também o humor histriônico que, mesmo em menor escala, surge das figuras da mãe e da irmã de Leo, interpretadas pelas atrizes mais frequentes nos filmes do espanhol, as ótimas Chus Lampreave e Rossy de Palma. Ainda no âmbito das atuações é preciso destacar o trabalho de Juan Echanove, como Ángel, que tem seu momento de brilho ao dançar bêbado pelas ruas de Madri, e principalmente Marisa Paredes. A atriz, outro rosto habitual do universo de Almodóvar, tem aqui uma de suas grandes interpretações, fazendo com que acompanhar a saga de Leo, da queda à libertação, seja algo extremamente recompensador.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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