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Sinopse

Ao descobrir que sua mãe desapareceu, Enola Holmes decide utilizar toda sua astúcia e perspicácia para encontrá-la,  inclusive superando seu irmão mais velho, Sherlock Holmes, a fim de desvendar uma perigosa conspiração.

Crítica

Baseado na série de livros de Nancy Springer – uma senhora de 72 anos, de óculos e chapéu, que costuma escrever com seu cachorrinho no colo – que já conta com quase uma dezena de volumes, Enola Holmes é uma das principais apostas da Netflix dessa temporada. A impressão ao se assistir ao filme, no entanto, é que não apenas o logaritmo da plataforma parece ter ditado cada movimento da trama, como também o elenco principal soa como se tivesse sido reunido apenas para pagar uma dívida com a empresa. Todos vem de projetos mais bem sucedidos (um conceito relativo, mas o foco é na quantidade de acessos), e se o show é da protagonista, até ela deixa claro ter outras intenções com o projeto além de alargar o seu potencial dramático – algo que, obviamente, acaba não acontecendo. Um filme de fácil consumo, mas também rasteiro em todas as suas intenções.

Millie Bobby Brown chegou a ser indicada ao Emmy por sua performance como a Eleven de Stranger Things (2016-2021), mas ainda tem muito o que mostrar ao se arriscar por outros cenários. Sua estreia na tela grande foi com o blockbuster Godzilla II: Rei dos Monstros (2019), e o fracasso dessa empreitada foi tão grande quanto suas ambições. Em Enola Holmes, surge como a personagem-título, mais uma vez à frente de um elenco igualmente estrelado. Outro tropeço que só não será maior por ter se eximido de enfrentar o aval das bilheterias, optando por fazer uso da máquina promocional do streaming. Com ela estão Henry Cavill, num erro crasso de escalação, e Sam Claflin, que ao lado do colega se vê obrigado a abandonar a pose de galã. O primeiro ainda tenta convencer à frente de The Witcher (2019), enquanto que o segundo emplacou a comédia romântica Um Amor, Mil Casamentos (2020), ambos também na Netflix. E se essas experiências já haviam resultado em obras problemáticas, aqui os dois conseguem se superar na inadequação.

Enola Holmes (Brown), como o sobrenome adiante, é a irmã mais nova de Sherlock (Cavill). Os leitores e fãs do investigador criado por Conan Doyle certamente conhecem o irmão dele, Mycroft (Claflin), mas nunca ouviram falar de Enola – afinal, trata-se de uma criação de Springer, e nunca fora mencionada pelos escritor inglês. Após a morte do pai, quando ela era ainda criança, e da partida dos dois irmãos mais velhos, que se mudam para Londres, a garota fica morando sozinha com a mãe, vivida por Helena Bonham Carter (em participação especial). Quando a matriarca desaparece, aparentemente sem se despedir, a jovem fica sob a guarda de Mycroft, que decide mandá-la para um internato. Rebelde, escapa por conta própria, e no caminho encontra outro fugitivo, o lorde Tewksbury (Louis Partridge, de Paddington 2, 2017). Os dois acabam se unindo, ainda que tentem manter separados seus objetivos.

Essa tênue linha entre um e outro interesse não resiste por muito tempo. A sensação transmitida ao espectador na maior parte do tempo é que o filme do diretor Harry Bradbeer (vencedor do Emmy pela muito superior Fleabag, 2016-2019) possui duas histórias distintas, e uma está em conflito com a outra. O longa se baseia no livro O Caso do Marquês Desaparecido (2006). Pois bem, se por um lado Enola estará ciente do paradeiro do rapaz de origem nobre e tenta ajudá-lo não apenas a se esconder, mas também a desvendar os motivos que colocaram um assassino no seu encalço, ela mantém como preocupação principal descobrir o destino da mãe, o que a levou a abandonar a própria casa e por quê não chegou a se despedir dela. A intenção dos realizadores, no entanto, é mostrar uma garota tão ou mais inteligente no âmbito detetivesco do que o irmão famoso. Por isso, tudo que passa pelas mãos dela acaba se mostrando uma pista, seja para um caso, ou outro. Pois bem, se esses indícios foram colocados de propósito ao alcance dela, não teria sido mais fácil – e simples – deixar essas manobras de lado e ter sido franca com a menina?

Agora, nada pior do que um narrador que subestima a inteligência, ou capacidade de percepção, do seu público. Pois é justamente o que acontece por aqui. Por mais óbvios que sejam os desenlaces de Enola com o seu companheiro de aventuras, ou dos irmãos que estão no seu encalço, o roteiro de Jack Throne (Extraordinário, 2017) faz questão de a todo instante colocá-la de frente à câmera, se direcionando à audiência, para comentar o que acabou de acontecer e explicar o que virá em seguida. Quebrar a quarta parede, como se diz no jargão artístico, pode ser um recurso curioso, quando bem empregado – basta ver como é utilizado em Deadpool (2016) – mas, definitivamente, esse não é o caso. Por aqui, tal manobra se dá como uma muleta, para esclarecer e justificar quaisquer dúvida ou mal-entendido, sem deixar nenhuma ponta solta para trás. Enola Homes, assim, se torna um exercício redundante e cansativo – são mais de duas horas de projeção – que não levam a lugar nenhum particularmente inovador ou mesmo digno de atenção.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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