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Sinopse

Jack sofre de insônia. Tem uma vida monótona. Um emprego chato. Isso muda radicalmente quando ele conhece Tyler, um vendedor de sabão que acredita na adrenalina como forma de tirar os zumbis sociais do marasmo.

Crítica

A primeira regra do Clube da Luta é: você não fala sobre o Clube da Luta. A segunda é: você não fala sobre o Clube da Luta. Entretanto isso é impossível. Assim como, na trama, os coadjuvantes que vão se achegando ao Clube não conseguem se calar ante ao impacto e novidade de vida que lhe são oportunizadas, da mesma forma o expectador que assiste a Clube da Luta não consegue ficar inerte ao conteúdo que lhe é apresentado. Adaptação do livro de Chuck Palahniuk, o filme dirigido por David Fincher, além de servir como um emaranhado de ideologias esquerdistas, é um complexo e estonteante retrato das características do homem moderno. Digo homem, homem. O masculino. Não a espécie humana.

Somos apresentados ao protagonista sem nome – brilhantemente interpretado por Edward Norton – em uma das circunstâncias mais bizarras que o cinema de Hollywood já produziu. O personagem de Norton é jogado entre os seios – conquistados como consequência de reposição hormonal – de um homem castrado – algo que vai assumir uma significado muito relevante no decorrer da história – em uma reunião de anônimos vítimas de câncer nos testículos. Não. Nosso herói não sofre e nunca sofreu com essa doença – e nem com nenhuma das que mobilizam os outros grupos de apoio ao qual ele frequenta diariamente. O personagem apenas não consegue dormir direito há seis meses e vive em um estado quase vegetativo e transitório entre o desperto e o semi-inconsciente. As sessões de terapia em grupo são a fuga que encontra para se distanciar da completa prisão que se tornou sua existência vazia. Até que, em uma de suas entediantes viagens a trabalho, conhece o fabricante de sabão Tyler Durden – também extraordinariamente interpretado por Brad Pitt – e sua vida, então, tem uma grande reviravolta. O impulso para isso? Os questionamentos filosóficos e provocativos de Tyler, que vão despertando aos poucos uma consciência que estava adormecida no herói, culminado no pedido: "eu quero que você bata em mim o mais forte que puder". A partir daí, novos membros irão surgir, levando à formalização do Clube da Luta.

O pedido de Tyler é a chave que desenrola todas as indagações existencialistas sobre o homem moderno. Eles não lutam para sagrar um campeão. Eles lutam apenas para sentir algo. Para terem a sensação de que novamente estão no controle. Ainda que Sem Nome, a partir do momento que começa essa nova "terapia" nosso protagonista irá abandonar os grupos de apoio e, gradativamente, vai transformando a realidade ao seu redor. A "covardia e condescendência" que regem o comportamento do homem civilizado são substituídas pela "ousadia e liberdade" do homem selvagem. E essa analogia é perfeitamente captada pelo simples fato da ausência de um nome ao protagonista e de um passado conhecido. Não importa quem ele é. Ele é você e eu.

A brutalidade captada pela câmera de Fincher ao retratar os embates não tem a intenção de empolgar ou cativar como um filme de ação comum, mas sim de discursar e fazer refletir. Não é um herói e vilão se digladiando que vemos na tela. São homens tentando "subjugar" o sistema cultural que os transforma em ratos do laboratório publicitário e consumista que se tornou a sociedade contemporânea. "Você não é o seu emprego; você não é o quanto de dinheiro você tem no banco; você não é o carro que você dirige" declara Tyler, quando o Clube já deixou de ser apenas um grupo e ruma a caminho de se tornar um exército. É uma perfeita parábola sobre uma geração de meninos que querem virar homens depois de serem criados, na sua maioria, apenas pelas mães. Então, por não compreenderem quais são seus papéis, procrastinam reponsabilidades, enquanto vão sendo conduzidos por um fluxo que, mais cedo ou mais tarde, revelará o quanto suas vidas não tem sentido.

Porém, o filme não se limita a análise do ser masculino. Pelo contrário, inúmeras outras observações podem ser retiradas de seu texto. A principal delas é a gritante defesa, quer intencional ou não, da anarquia como meio de uma utópica transformação social. Vide o plano final de Tyler – assista ao filme, spoilers têm limite. O cerne cativante por trás do Clube vai, aos poucos, se diluindo e tomando proporções inimagináveis. A revolução do indivíduo contemporâneo é apenas o primeiro passo para uma revolução cultural e econômica. Ou seja: um verdadeiro estudo marxista. O que leva, no fim, ao embate a dupla de amigos que protagoniza o filme. Enquanto Tyler é esse agente da anarquia, o homem Sem Nome se sacrifica para conservar a ordem vigente.

Brad Pitt e Edward Norton estão incríveis! Certamente em suas atuações mais memoráveis. Da mesma forma, David Fincher consegue ser impecável na tradução da obra de Palahniuk. As cenas em que são apresentados os sintomas e dejá vus causados pela insônia do personagem sem nome são hábeis em nos jogar para dentro da perturbada mente do protagonista de uma maneira aterrorizante. As inserções subjetivas de vários elementos no início e durante o filme auxiliam na compreensão de como as patologias do protagonistas se desenvolveram, nos aprofundando ainda mais naquela neblina que é sua razão.

O fantástico texto, atuação, direção, trilha sonora e outros tantos pontos que amarram essa produção fazem de Clube da Luta um filme primoroso. Um perfeito exemplar de uma obra de arte que, ano após ano, desperta novas interpretações e análises e vai, assim, se perpetuando no imaginário do público.

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Eduardo Dorneles é estudante de letras, amante de cinema, literatura, HQs e mantém um blog de crônicas e contos (edorneles.blogspot.com) .
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