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Sinopse

Em uma floresta no noroeste do Pacífico, isolado da sociedade, Ben, um pai devoto, dedica sua vida a transformar seus seis filhos em adultos extraordinários. Quando uma tragédia atinge a família, são obrigados a deixar este paraíso e começar uma viagem ao mundo exterior, um processo que desafiará suas ideias sobre família e coletividade, forçando-os a relativizar tudo o que lhes foi ensinado até então.

Crítica

Considere uma versão alternativa para o final trágico de Alexander Supertramp em Na Natureza Selvagem (2007): sua vida seguindo os preceitos de Walden, de Henry David Thoreau, não poderia ter dado mais certo e, mesmo depois de vários anos, ele segue vivendo às margens da sociedade convencional, agora ao lado de uma grande e excêntrica família. É em algum lugar deste universo que se situa Capitão Fantástico, longa que acompanha este clã residente em meio a uma densa floresta repleta de animais, rios e corações selvagens.

A rotina dos Cash pode parecer idílica, mas é tão rigorosa quanto extrema. O pai, Ben (Viggo Mortensen, excepcional) é o tutor de seis filhos a partir de uma metodologia que deveria ser adotada em larga escala: enquanto se vale de George Eliot, Dostoiévski e Karl Marx para ensinar valores essenciais às crianças e adolescentes – que citam os autores com brilhantismo – ele ainda os prepara fisicamente com técnicas de autodefesa, corridas pelas montanhas, escalada e outros esportes. Ao invés do Natal, eles celebram o aniversário de Noam Chomsky, afinal, para eles é mais lógico festejar o nascimento de alguém real e que proporcionou pensamentos e mudanças práticas para a sociedade da qual fazem parte. Tudo parece muito ideal, até o filho mais velho matar um veado com apenas uma faca e ele presentear os demais com outras armas como esta. Em outro momento, executam um intrincado plano familiar para roubar mantimentos em um supermercado. Nem tudo é tão bonito quanto parece ser.

Eis a graça e o encantamento em Capitão Fantástico: Ben é um velho hippie pós-moderno, radical em alguns aspectos, libertário em outros. Ele desvia dos códigos comuns do capitalismo e consumismo e educa seus filhos com os valores que também eram seguidos por sua recém-falecida esposa, prestes a ser enterrada pelos pais no Novo México. A contragosto e pressão dos filhos, eles embarcam em um antigo ônibus escolar (Alexander Supertramp de novo?) e então partem de seu habitat rústico e natural para o que nós conhecemos como o “mundo real”.

Matt Ross, mais reconhecido como ator e que aqui dirige seu segundo longa-metragem, demonstra um domínio brilhante na condução de um roteiro que se embasa em diferentes perspectivas sobre códigos familiares, ideológicos e sociais. Sua narrativa nunca se posiciona por inteiro a favor ou contra os personagens que mostra em tela, algo que se torna evidente quando os Cash partem para a road trip pelos Estados Unidos e encontram todos os tipos de pessoas: de uma família republicana quadrada a uma mãe solteira e sua filha que se torna interesse amoroso do primogênito de Ben. É justamente neste choque de culturas que o drama cômico tem seus momentos mais hilários e surpreendentes. Ross ainda não exibe a segurança de um cineasta consciente de suas pretensões, mas, como roteirista, evidencia uma originalidade que merece aplausos e prêmios.

Se há alguém que domina este filme é Viggo Mortensen, o Capitão Fantástico do título que tem cara de Festival de Sundance, mas que foi reconhecido até mesmo no Festival de Cannes. O ator, que já atestou sua versatilidade em papeis tão diferentes quanto o mafioso de Senhores do Crime (2007) e o guerreiro da trilogia O Senhor dos Anéis, está perfeito em sua composição para Ben. Ele lança frases de efeito com uma naturalidade absurda, toca violão em um luau, confronta seu rígido sogro, brinca com seus filhos e sofre quando seus ideais também se provam problemáticos. Sua performance é arrematada por um grupo de jovens atores surpreendente, comprometidos com uma realidade certamente tão distinta das suas, mas que convencem a cada diálogo e demonstram a maestria de Ross na direção de seu elenco.


Capitão Fantástico pega alguns desvios em sua narrativa para a tornar mais emocional, o que ameaça a inteligência e integridade de uma história que parece nova, inventiva. Ainda assim, trata-se de um raríssimo exemplar daquele cinema que suscita grandes questões sobre paternidade, família e a sociedade ocidental moderna, por vezes as respondendo significativamente ou deixando as indagações para seus espectadores. Do riso às lágrimas, trata-se de um filme singular e alegre como sua família protagonista.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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