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Sinopse

Em Brincando nos Campos do Senhor, A fim de catequizar uma tribo indígena, um casal de missionários viaja à Amazônia. Chegando lá, encontram aventureiros de toda sorte que desejam bombardear o local. Dirigido por Hector Babenco.

Crítica

Projeto pessoal do produtor Saul Zaentz (vencedor do Oscar de Melhor Filme por Um Estranho no Ninho, 1975, por Amadeus, 1984, e por O Paciente Inglês, 1996), que tentava adaptar para a tela grande o livro de Peter Matthiessen desde 1965, Brincando nos Campos do Senhor foi parar no colo do cineasta argentino-brasileiro Hector Babenco após este entregar em sequência três longas de grande impacto internacional: Pixote: A Lei do Mais Fraco (1981), indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, O Beijo da Mulher Aranha (1985), indicado a quatro Oscars – inclusive Melhor Filme e Direção – e premiado como Melhor Ator (William Hurt), e Ironweed (1987), que rendeu aos protagonistas Jack Nicholson e Meryl Streep indicações ao Oscar como Melhor Ator e Melhor Atriz. Parecia, portanto, a fórmula perfeita: uma história épica que se passava em plena Floresta Amazônica, um produtor de respeito e premiado e um realizador latino-americano no auge do seu sucesso hollywoodiano. No entanto, tudo o que conseguiram foi uma versão sul-americana do mesmo inferno vivido por Francis Ford Coppola pouco mais de uma década antes durante a realização de Apocalypse Now (1979), porém sem nem chegar perto da mesma genialidade percebida neste drama de guerra ambientado no Vietnã.

Há três pontos de vista distintos em Brincando nos Campos do Senhor, mais aquele que se pretende do realizador e, em último caso, do espectador – algo que raras vezes durante as mais de três horas de projeção se consegue com efeito. A trama começa quando Moon (Tom Berenger) e Wolf (Tom Waits), dois mercenários à bordo de um avião caindo aos pedaços, aterrissam em um vilarejo no meio da Amazônia em busca de gasolina. Lá caem nas mãos do Comandante Guzman (José Dumont), que retém seus documentos e só irá liberá-los em troca de um favor: deseja que eles sobrevoem uma aldeia indígena próxima e a bombardeie, liberando a área para exploração comercial. Os dois acabam aceitando a proposta, mas uma vez sobre os índios o piloto Moon acaba mudando de ideia. Ele não só retorna ao vilarejo como, em seguida, decide partir sozinho de volta para a mata. Ele chega até à tribo e, desnudo, decide se integrar aos selvagens e pedindo para ser tratado como um deles, abandonando a civilização. Reparem em Stênio Garcia como o líder dos índios e tentem descobrir o que acontece com o personagem de Waits, que é simplesmente abandonado sem maiores cerimônias.

Paralelamente, temos dois casais de missionários religiosos que estão na região para catequisar os indígenas. Leslie (John Lithgow) e Andy Huben (Daryl Hannah) estão ali há mais tempo e sabem melhor como as coisas funcionam. Martin (Aidan Quinn) e Hazel Quarrier (Kathy Bates) são recém-chegados, junto com o filho pequeno, e pretendem fincar raízes levando a palavra de Deus àqueles seres “primitivos”. Ao saberem da ameaça que os povos das proximidades estão correndo, decidem adentrar também na selva, fincando residência ao lado deles. Caberá à Martin e Hazel esta missão, enquanto que Leslie e Andy seguirão administrando as coisas à distância. Nem tudo, é claro, sairá conforme o esperado. Se o novo casal terá que enfrentar a doença do filho – malária – e sua consequente morte irá gerar um conflito com os aborígenes que começavam a se afeiçoar a eles, os mais experientes terão que enfrentar não só o radicalismo crescente dele, mas também a falta de fé dela, que passa a questionar suas certezas.

Uma figura interessante em Brincando nos Campos do Senhor, porém mal explorada, é a do padre Xantes (Nelson Xavier, o único brasileiro do elenco principal com algo a fazer), um religioso que tem suas dúvidas, mas nunca deixa de observar o quadro maior de cada situação. Ele se aproxima tanto de Moon – louco ou tolo? – como dos Huben – principalmente Andy, que busca conselhos com ele – e dos Quarrier – Martin, que o respeita a despeito de suas diferenças. Ele é quase que um elemento de ligação entre os três núcleos, mas em nenhum instante chega a ser levado a sério pelo realizador. Por isso, acaba tendo uma participação fraca, que não se desenvolve nem aprofunda. À audiência, cabe observar suas intervenções  e perceber como elas, apesar de pertinentes, acabam não tendo maiores repercussões. Ele poderia, acredita-se, ser essa quarta via, o elemento de identificação com o espectador, caso tivesse melhores condições de agir. O que, no entanto, nunca chega a acontecer.

Se a direção de Babenco é bastante problemática – ele parece não saber o que fazer com os planos abertos da floresta, ao mesmo tempo em que permite que cada ator atue em um registro muito particular (em alguns momentos chega a ser complicado compreender que Quinn, Hannah, Lithgow, Bates e Berenger estão todos num mesmo filme) – talvez o mais complicado mesmo seja o roteiro – escrito em parceria com o grande Jean-Claude Carrière, o mesmo de A Bela da Tarde (1967) e A Insustentável Leveza do Ser (1988). Há muitos textos paralelos, intervenções sem sentido – as mulheres poderiam ser facilmente eliminadas, pois suas histórias nunca passam da ameaça e não provocam nenhuma alteração no contexto maior – e o argumento do homem branco contaminando e destruindo o indivíduo puro já era clichê na época, que dirá agora. Ainda que tenha inspirado James Cameron a realizar Avatar (2009), Brincando nos Campos do Senhor é uma promessa que não se cumpre em nenhum dos seus aspectos. E basta assisti-lo uma única vez para entender como foi capaz de soterrar a carreira deste cineasta nos Estados Unidos, obrigando-o a retornar à sua terra natal após esse retumbante fracasso de público e de crítica.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Ailton Monteiro
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MÉDIA
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