Crítica


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Sinopse

Durante a crucificação e ressurreição de Cristo, Barrabás está tentando entender se Jesus é realmente o Filho de Deus. Em sua jornada em busca pela verdade, encontra respostas para algumas perguntas que o fazem mudar de opinião sobre esta vida.

Crítica

As primeiras imagens deste drama produzem uma surpresa positiva em relação ao que normalmente se espera da estética religiosa. Através de um violento assassinato sob a luz sombria e, em seguida, de um cárcere fantasioso em tons azulados, mergulhamos num registro distante das representações bíblicas tradicionais. Somem os intensos close-ups no rosto dos atores (o espectador demora bastante até ver um primeiro rosto de perto), a trilha sonora se faz mais discreta do que de costume, os planos abertos valorizam os espaços. Barrabás, assassino confesso, é visto durante o julgamento de Pôncio Pilatos ora pelos pés (contra-plongée), ora de um ponto de vista aéreo e angulado (plongée), espremido pela multidão. Acima de tudo, a narrativa não o condena, pois este homem cometeu um crime por amor, por honra, e se arrependeu logo depois.

Enquanto a maior parte dos dramas bíblicos prefere explorar a estética dos melodramas folhetinescos, o projeto russo busca sua inspiração na linguagem do teatro. Os planos abertos favorecem o encontro de dois ou mais atores por vez em cada plano, com os corpos inteiros à vista, sob planícies desérticas ou dentro de palácios. A direção de arte é limitada, apenas alusiva, como seriam os objetos dispersos sobre um cenário cênico. A narrativa se move sobretudo por diálogos, como caberia melhor à linguagem teatral, enquanto a multiplicação de plongées fornece a impressão de que o espectador se encontra no balcão do teatro, observando os atores e a cena de um ponto de vista elevado. Ao invés do tradicional “olhar de Deus” da câmera em 90º em relação ao solo, prefere-se a angulação do observador distante e curioso.

Outro elemento de interesse diz respeito à escolha de protagonismo: podendo contar a história da ressurreição de Cristo pelo lado do crucificado, o filme prefere seguir aquele que foi absolvido no mesmo dia da condenação do Nazareno. Na Bíblia, pouco se fala sobre Barrabás após a libertação, motivo pelo qual o roteiro adquire liberdade para criar sua própria ficção. Enquanto os espectadores religiosos costumam cobrar fidelidade ao texto sagrado (algo percebido como sinal de respeito), o diretor Evgeniy Emelin encontra nas lacunas do texto sua fonte de criação. Para o filme, Barrabás é um homem em eterna penitência por ter sido libertado ao invés de Jesus, exercendo o sentimento de culpa tão profundamente cristão enquanto reflete sobre seu desejo pela amada Judith Iscariotes. O texto conservador não critica o machismo deste homem, nem sua tendência agressiva, que fazem dele uma figura honrada aos olhos da direção. No entanto, é interessante que se escolha como protagonista uma testemunha da ascensão de Jesus ao invés do próprio.

Liberdades narrativas à parte, o drama se mostra limitado na expressividade dos recursos teatrais. As diversas cenas noturnas adotam uma luz sem contraste nem volume; os mesmos dois ou três cenários são repetidos à exaustão, e basicamente a única dinâmica de mise en scène é criada pelo encontro de uma dupla ou trio em cada cena por vez, conversando e se questionando sobre o que fazer em seguida. Emelin nunca sabe ao certo se abraça o realismo, oferecendo um drama humano concreto, ou se aceita a presença divina enquanto representação abstrata. Na dúvida, faz inserções discretas de luzes mágicas, que não transformam a narrativa nem rompem por completo com o naturalismo. Por mais que tenha a sua câmera deslizando com frequência por entre os personagens, o diretor hesita sobre o recurso a adotar, ou sobre o efeito que as cenas deveriam produzir, entre comoção, persuasão ou distanciamento. Com exceção do clímax, quando os close-ups se intensificam no rosto do protagonista, as demais cenas sustentam uma frieza atípica para uma fábula moral e moralista.

O próprio Barrabás, sujeito ciumento e transtornado, é esquecido pelo roteiro durante longos trechos, quando a câmera prefere se focar em Pôncio Pilatos, Judith ou Caifás. Mesmo em posição de protagonismo, o penitente se torna coadjuvante da história. Deste modo, o projeto resulta mais curioso conceitualmente do que bem executado ou esclarecedor. Ao público religioso, comete o pecado de diminuir a importância de Jesus, tornando-o um detalhe em plano de fundo. Ao público laico, desenvolve apenas a história de um criminoso arrependido, um apaixonado não correspondido e um sujeito que, como afirmam os diálogos, não tinha um único amigo na cidade que o absolveu. Se enveredasse pela construção psicológica deste homem, o diretor chegaria a uma exploração interessante. Ora, Barrabás se contenta a perambular, a ouvir a história de Cristo, colher informações sobre este sujeito muito mais importante que, do outro lado da cidade, faz milagres enquanto ele vagueia sem rumo.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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Grade crítica

CríticoNota
Bruno Carmelo
4
Alysson Oliveira
3
MÉDIA
3.5

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