Através da Sombra

Crítica

Laura (Virginia Cavendish) ainda está de luto quando aceita a oferta de um rico dono de terras. A proposta é para que a professora substitua a antiga instrutora dos jovens sobrinhos, vivendo em uma propriedade no interior. A oferta, algo comum para o século XIX, não surpreenderia, exceto se não fosse tratada como foi: um desafio. Através da Sombra, mais novo longa-metragem de Walter Lima Jr (Os Desafinados, 2008) assume inspirar-se em A Volta do Parafuso, texto de Henry James publicado em 1989.

Por aspectos muito particulares, a transposição do enredo criado pelo escritor para outro meio é sempre minimamente problemática. Em especial, pelo alto nível de sugestão da atmosfera psicológica, traço ao qual a literatura é afeita, dado seu caráter descritivo, e com o qual o cinema encontra dificuldades, dada a sua natureza de mostrar. A diferença, certamente sutil, é a responsável pelo resultado em geral aquém do esperado nas adaptações cinematográficas desta obra de James, também conhecida como O Calafrio.

A fotografia de Pedro Farkas (Zuzu Angel, 2006) e a direção de arte de Clovis Bueno são os alicerces principais na construção desse mundo sombrio, que funcionará constantemente no limite do fantástico. Aos poucos, Laura começara a perceber que algo estranho ronda a fazenda. O clima de estranhamento, criado por olhares pesados e respostas vagas, está bem conduzido na primeira metade da trama, mas não suporta o crescimento necessário do suspense. Ponto decisivo para que a professora sinta que há espíritos rondando o local, as atuações das crianças oscilam demasiadamente, passando da naturalidade infantil ao estágio adulto sem qualquer proporção ou sutileza. Se por um lado é verdade que acertar tal tom é um desafio com o qual a literatura não precisa lidar, por outro é certo que a direção não consegue resolver a questão de forma orgânica.

Após perceber que o problema do local não é o presente, mas o passado, Laura trata de apagá-lo. Para isso, Através da Sombra opta por um terceiro ato pouco envolvente e muito didático. Há elementos fantástico interessantes, como a cena do cavalo branco e a atração do menino por Laura. Contudo, o caminho do estranhamento perde espaço para resoluções simples e diretas, como as aparições da antiga professora e de Bento, ex-capataz e responsável pela fazenda. Mostrando mais do que deveria e arriscando menos do que poderia, Através da Sombra trava o próprio potencial, ficando às margens de desenvolver um grande suspense.

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Willian Silveira

é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.

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