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Sinopse

Paddington é um urso que cresceu nas florestas peruanas. Quando seu lar é destruído por um terremoto, sua tia Lucy decide o colocar num navio rumo à Inglaterra à procura de uma vida melhor.

Crítica

É preciso confessar que as expectativas não eram as melhores. Afinal, um urso falante, de casaco azul e chapéu vermelho, perdido pelas ruas de Londres? No entanto, o filme As Aventuras de Paddington é uma grata surpresa – e como é bom ser surpreendido por uma produção tão simpática, envolvente e irresistível quanto essa que chega agora aos cinemas. Como há muito já foi percebido, o melhor do cinema infanto-juvenil desde a virada do século tem sido feito na Inglaterra – a saga Harry Potter e as animações em stop motion da Aardman são ótimos exemplos – e esta primeira adaptação com atores reais do personagem criado por Michael Bond em 1958 é encantadora e dinâmica, combinando ótimos efeitos visuais – o protagonista foi todo criado através de animação digital – com um elenco estelar, encabeçado por nomes como Nicole Kidman, Sally Hawkins, Hugh Bonneville, Julie Walters e Jim Broadbent.

O começo, no entanto, desperta desconfiança. Somos levados ‘às selvas mais escuras do Peru (!)’, onde um explorador britânico se depara com ursos pardos falantes. Bom, se relevarmos esse absurdo, devemos ser capazes também de oferecer outros descontos, como o fato do único tipo de urso possível de ser encontrado em toda a América do Sul ser o urso-de-óculos. Mas estamos falando de uma obra de ficção, e como tal o que importa é sua lógica interna, e não um compromisso radical com a realidade externa. E, aqui, essa verdade funciona. Ainda que encontrar um urso em ambientes urbanos, definitivamente, não seja a coisa mais comum do mundo.

Passam-se algumas décadas e os tais ursos, já velhos, se separam durante um terremoto. Como resultado, o pequeno sobrinho é enviado clandestinamente em um navio para a capital inglesa, pois lá poderá encontrar um porto seguro: afinal, é onde mora o aventureiro que os teria visto muitos anos atrás. Claro que nem tudo é tão simples, e nesse caminho ele é batizado – após ser encontrado na estação de metrô de Paddington – e recebe abrigo de uma família – cujos pais são interpretados por Bonneville, o patriarca de Downton Abbey (2010-) e visto há pouco em Caçadores de Obras-Primas (2014), e Hawkins, indicada ao Oscar no ano passado por seu desempenho em Blue Jasmine (2013) – além de ter que lidar com uma feroz taxidermista (Kidman, se divertindo como há muito não se via).

A participação da atriz vencedora do Oscar por As Horas (2002) neste projeto é curiosa. Sua agente quase não lhe mostrou a proposta quando surgiu o convite por acreditar que ela não se interessaria, mas, surpreendentemente, sua reação foi a oposta: aceitou na hora! Como muitos no Brasil desconhecem, é bom explicar: urso Paddington é para os países de língua inglesa – como a Inglaterra e a Austrália, principalmente – tão popular e importante quanto o Saci Pererê ou a boneca Emília é por aqui. A possibilidade de participar de um projeto de primeira linha a seu respeito era tão emocionante quanto desafiadora, e ainda que seja interpretando a vilã – algo que aterrorizou seus filhos pequenos – ela o faz com graça e desenvoltura, quase como um pedido de desculpas após o fiasco visto no também infanto-juvenil A Bússola de Ouro (2007), em que defendia sem muito afinco um tipo bastante similar, porém com resultados bem distintos.

A trama de As Aventuras de Paddington, escrito e dirigido por Paul King, não é nenhum exemplo de originalidade, mas ainda assim é competente para prender a atenção dos pequenos e despertar o interesse dos adultos. Assim que chega na casa dos humanos que o acolhem, logo fica claro que eles – que incluem ainda duas crianças e uma tia idosa, papel da sempre divertida Waters – precisam mais do ursinho do que este necessita deles. A interação entre eles não se dará sem tropeços – alagamentos no banheiro, incêndios na cozinha – mas tudo é feito de modo visualmente controlado, adequado ao público ao qual se dirige. Mesmo quando Kidman está em cena – e suas motivações possuem uma lógica longe de ser gratuita – seu tom mais diverte do que assusta, adicionando uma adrenalina necessária. Piadas visuais – como a banda cubana e o séquito de pombos que perseguem o protagonista – e outras participações especiais – como Peter Capaldi, um dos mais recentes Doctor Who (2008-2014), e Matt Lucas, da hilária série Little Britain (2003) – oferecem um charme extra aos já iniciados.

Realizado com competência exemplar e disposto a brincar com os mais diversos âmbitos da audiência – referências a sucessos recentes, como Toy Story 3 (2010), e à clássicos com Os Pássaros (1963), tornam o resultado ainda mais atraente – As Aventuras de Paddington é uma opção inteligente que não desrespeita os milhares de fãs que já conhecem o personagem, ao mesmo tempo em que é hábil o suficiente para servir de porta de entrada para todos os que estiverem se arriscando por este universo pela primeira vez. E com uma conclusão de literalmente aquecer o coração, será difícil resistir à vontade de conhecer mais a respeito de Paddington e seus amigos. Afinal, é muito bom estar ao lado deles.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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