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Sinopse

Stanley é um caça-talentoso profissional em crise no mundo do basquete. Quando já está naquela fase em que não acredita na possibilidade de descobrir um novo talento, ele se depara com uma nova esperança de virada na carreira.

Crítica

Ao se assistir a um filme como Arremessando Alto, há um efeito contrário. Adam Sandler está tão bem como o protagonista, um caçador de talentos da NBA, a maior liga de basquete do mundo, que ao invés de se admirar o desempenho do ator, aumenta-se ainda mais a indignação do espectador em relação à incrível quantidade de trabalhos descartáveis e inexpressivos que o astro estrelou durante a maior parte de sua carreira. Para cada Joias Brutas (2019) ou Embriagado de Amor (2002), há dezenas de O Halloween de Hubie (2020), Cada um tem a gêmea que merece (2011) ou O Paizão (1999). Tivesse ele seguido essa primeira linha – na qual, felizmente, esse novo trabalho se enquadra – não é de se duvidar que talvez tivesse uma certa estatueta dourada para exibir na estante de casa. Porém, aqueles que o acompanham há mais tempo, sabem que essa, de fato, não é uma motivação real para ele. Muito mais interessado está em não gerar esforço, passar um bom tempo no set e ainda se divertir. Três atrativos que também encontra por aqui, com a diferença de serem alcançadas através de uma boa história.

Nem tanto ao céu, mas também não direto para o inferno. O longa dirigido por Jeremiah Zagar – que anteriormente, entre documentários, curtas-metragens e produções para a televisão, se destacou pelo independente We The Animals (2018), premiado no Festival de Sundance – não se propõe a reinventar a roda. Aliás, pelo contrário: parece satisfeito em entregar uma trama linear, sem grandes revoluções, porém bem contada, atenta aos detalhes e preocupada com o desenvolvimento dos personagens. São pequenas coisas que deveriam estar na base de qualquer longa, mas que se mostram cada vez mais rarefeitos, ainda mais em um produto vindo de Hollywood. Não se tem aqui uma sequência, refilmagem ou adaptação: eis, no lugar, um conto que, se não completamente original, se desenrola com honestidade e segurança, cercado pelos melhores do gênero e amparado mais pelos sentimentos que se desenvolvem entre os personagens do que pelos acontecimentos nos quais esses se veem envolvidos.

Sandler aparece como Stanley Sugerman, um cara que leva a vida nos aeroportos, cada noite dormindo em um hotel distinto em uma cidade que muito provavelmente nunca tenha estado antes. Seu objetivo é descobrir uma futura revelação, o grande craque sobre o qual ninguém colocou os olhos ainda, mas que somente ele, graças ao seu instinto e experiência, consegue perceber essa habilidade inexplorada. Ou seja, é alguém que passa seus dias atrás de diamantes não lapidados. Essa talvez seja uma tarefa estimulante para quem está começando – o que está longe de ser o caso dele. Com mais de cinquenta anos, se mostra cansado, sem estímulo para continuar. Quer passar mais tempo em casa, com a esposa e a filha. Mais do que isso, talvez, quer retomar um velho sonho: ser treinador. Uma promessa que finalmente lhe é atendida em um momento, para lhe ser retirada no instante seguinte. E quando se vê obrigado a voltar à ativa, a única coisa que o faz seguir adiante é o cumprimento do dever: a descoberta de um jovem que tem tudo para ser a maior revelação da próxima temporada.

Muito dessa caminhada só se mostrará válida aos olhos da audiência graças ao quase insuspeito, mas não inesperado (pois visto em vezes anteriores, ainda que raras), de Sandler. Ele é a própria imagem de um profissional que alcançou o pico de sua carreira, mas que agora está preocupado com outras coisas além do retorno financeiro imediato. Porém, Zagar parece esquecer que seu protagonista não está sozinho, e o coloca ao lado de três nomes que, por mais talentosos que sejam, não se mostram preparados para o desafio que aqui enfrentam. Há de se indagar quem teria pensado em Queen Latifah para ser a esposa de Sandler, pois não há química alguma entre os dois. Quando vistos em cena, soariam mais convincentes como parceiros de esporte (papel que ela viveu com efeito na comédia romântica Jogada Certa, 2010) do que como marido e mulher. Também há atrito na relação entre o olheiro e seu empregador, vivido por Ben Foster. Esse tem que entregar um homem de negócios intransigente, mas só consegue imprimir antipatia e um comportamento mimado – o que é estranho, pois costuma atingir performances mais inspiradas.

Por fim, há o novato Juancho Hernangomez. A tarefa era, de fato, complicada. Afinal, era preciso, das duas, uma: um jogador que soubesse atuar, ou um ator com o perfil de jogador. A produção, por sua vez, apostou na primeira escolha – e falhou. Hernangomez é incrível nas quadras, mas sempre que é exigido dramaticamente suas notas são baixas, visto as expressões monocórdias e a ausência de emoção que empenha, mesmo diante das mais distintas situações. Estes desencontros poderiam colocar o conjunto a perder, não estivesse à frente do projeto alguém tão seguro do que tem a oferecer e em como atingir esse potencial. Adam Sandler leva praticamente sozinho essa trajetória de altos e baixos, percorrendo um percurso se não inesperado, ao menos realizado com compromisso e dedicação. E por mais que o desfecho possa ser antecipado, há tantos elementos merecedores de atenção que a soma dessas partes se mostra superior ao todo. Arremessando Alto, na maior parte do tempo, se contenta em um jogo plano, deixando a responsabilidade destes voos mais arriscados na conta de apenas um dos seus jogadores. E ele entrega.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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