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Sinopse

Enviado em missão secreta para vigiar uma família, um reservado e ranzinza agente da CIA não esperava ser confrontado e chantageado por uma menina que logo descobre seu disfarce. Utilizando sua inteligência e poder de persuasão, a pequena vai convencê-lo a ensiná-la como se tornar uma espiã.

Crítica

Arnold Schwarzenegger, Vin Diesel, Dwayne JohnsonDave Bautista está longe de ser o primeiro brutamontes a encarar uma comédia infantil para tentar torná-lo mais conhecido junto a públicos que, normalmente, nem ficariam a par da sua existência. A grande diferença entre ele e os outros citados é a sua absoluta falta de carisma como protagonista. Bautista até funciona como o coadjuvante fortão e meio sem noção (Guardiões da Galáxia, 2014), como um dos inimigos de James Bond (007 contra Spectre, 2015) ou como um suspeito que logo é eliminado (Blade Runner 2049, 2017). Agora, colocá-lo à frente do elenco, e ainda mais ao lado de uma criança, é uma tarefa com um nível de exigência completamente diferente. Aprendiz de Espiã serve apenas para deixar em evidência a sua falta de jogo de cintura para um compromisso como esse.

JJ (Bautista) é o melhor na sua linha de trabalho. Ou, ao menos, é isso o que ele pensa a seu respeito. Pois é o tipo de agente secreto que, no menor sinal de problema, prefere partir para a força bruta, deixando de lado qualquer lógica ou raciocínio. E ainda que consiga sair vivo dos piores perigos, nem sempre os seus objetivos são alcançados – como deixa claro seu superior. É por isso que sua próxima missão será bem mais... low profile, por assim dizer. Ao lado de uma técnica operacional (Kristen Schaal, de Limites, 2018), é enviado para uma tocaia, ou seja, deve apenas ficar observando o cotidiano de uma mãe solteira e sua filha única, para o caso de um parente delas, que pode estar envolvido com um episódio ilegal, entrar em contato com a família. O que lhes interessa, portanto, é resolver um crime do qual as duas são apenas uma pista. Mas quando a garota percebe que há algo de errado nos vizinhos do apartamento ao lado, toda a operação corre o risco de naufragar.

Quer dizer, isso seria o provável caso esse filme tivesse um mínimo de pé na realidade. Afinal, quando Sophie (Chloe Coleman, de Big Little Lies, 2017-2019) descobre a verdade sobre os suspeitos recém-chegados ao seu prédio, ela os filma com o seu celular e passa a chantageá-los. Veja bem, estamos diante de uma criança de 9 anos fazendo ameaças ao Dave Bautista. E, mesmo assim, ele opta por acatar as exigências dela. Assim, se não tinham sido suficientes cenas dele explodindo inimigos ao som de Britney Spears – exibidas no prólogo – agora o espectador será convidado a vê-lo levando tombos na pista de patinação de gelo, brincando de cozinheiro e até flertando com a mãe da menina. Sempre daquele jeitinho de pura simpatia que o ator exala só de entrar em cena (ou não).

É certo que Aprendiz de Espiã é um filme para os pequenos, mas é de se perguntar, no entanto, qual é a faixa etária que seus produtores almejavam. Pois, se nas sequências entre Bautista e Coleman o tom é bastante ingênuo, toda vez que a narrativa passa a envolver as atividades dele enquanto espião a coisa adquire conotações mais adultas, sem muito aviso ou preparo entre uma mudança e outra. O diretor Peter Segal já havia percorrido terrenos semelhantes em sucessos como Corra que a Polícia Vem Aí! 33 1/3: O Insulto Final (1994) e Agente 86 (2008), mas em ambos contava com protagonistas (Leslie Nielsen e Steve Carell, respectivamente) que eram tão geniais em suas expertises que nem precisavam de uma atenção mais próxima – exatamente o contrário que se verifica com Dave Bautista. O astro deixa claro necessitar de uma condução mais incisiva, e sem esse cuidado, não será apenas na ficção que seus propósitos irão por água abaixo.

Exageradamente violento em algumas sequências e por demais pueril em outras, carece à narrativa de Aprendiz de Espiã um equilíbrio que conseguisse dosar as transições entre um extremo e outro. Os relacionamentos entre os personagens são tão gratuitos quanto improváveis, e o desenrolar dos acontecimentos beira o irritante de tão previsíveis que se anunciam. Assim, incapaz de se envolver com sua audiência e sem qualquer tipo de identificação com seus possíveis espectadores, este é um filme que se revela incapaz tanto de popularizar o nome do protagonista como de oferecer um mínimo de entretenimento, mesmo entre o público menos exigente. Uma ideia que já nasce desgastada – como apontado no início desse texto – e que se revela ainda mais infeliz com o avanço da trama. Melhor passar longe.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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