Amazônia: O Despertar da Florestania
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Christiane Torloni, Miguel Przewodowski
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Amazônia: O Despertar da Florestania
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2019
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Brasil
Crítica
Leitores
Sinopse
Como o Brasil tem lidado com a natureza e seus recursos naturais no início do século XX? Em que estado se encontra a Floresta Amazônica? Especialistas das mais diversas áreas discutem a noção de florestania, ou seja, a cidadania da floresta, termo necessário para refletir sobre a identidade brasileira.
Crítica
O governo Jair Bolsonaro pode ser acusado de desastroso em vários aspectos, mas nenhum deve superar seu descuido com o meio-ambiente. Agrotóxicos sendo liberados sem o menor controle, extinção de políticas de preservação, favorecimento desmedido às demandas de agricultores e fazendeiros em demérito às históricas reivindicações indígenas – as questões são diversas e em abundância. Diante deste contexto, qualquer discurso que se posicione contrário a esta forma de agir e pensar, servindo também como um ‘grito de socorro’ para a natureza e o planeta como um todo, obviamente, será mais do que bem-vindo. Neste aspecto, Amazônia: O Despertar da Florestania é uma produção que chega em excelente hora. Os problemas, no entanto, não tardam a se manifestar, e estão quase que todos reunidos ao conjunto fílmico apresentado. Inclusive, denominá-lo como tal – “filme” – parece quase um exagero. Pois o que se percebe é uma colagem mal-ajambrada, tortuosa, feita sem muito cuidado e que, numa análise mais profunda, parece servir quase que exclusivamente para atender ao ego da sua realizadora, a atriz – e estreante no formato – Christiane Torloni.
Lúcia Veríssimo se aventurou como diretora com o pessoal Eu, Meu Pai e os Cariocas: 70 Anos de Música no Brasil (2017). Patrícia Pillar ficou no universo da música ao revelar sua admiração em Waldick: Sempre no Meu Coração (2009), enquanto que Malu Mader também não foi longe ao se debruçar sobre Contratempo (2008). Letícia Sabatella, por sua vez, se voltou aos índios em Hotxuá (2012). Em comum, todas são mulheres que se tornaram famosas atuando, porém, em certo momento de suas carreiras, demonstraram insatisfação em dizer apenas as palavras de outros e decidiram se fazer ouvir através de assuntos que lhes eram caros. Christiane Torloni poderia, tranquilamente, se encaixar neste filão. Mas há detalhes que fazem a diferença. Veríssimo e Pillar falaram de assuntos bastante próximos, e tanto Mader quanto Sabatella foram sábias em trazer para o lado delas codiretores – Mini Kerti e Gringo Cardia, respectivamente – que se encarregaram do processo cinematográfico, enquanto a elas coube definir o discurso. Torloni, por sua vez, quer deixar sua marca por todos os lados, reduzindo a presença do parceiro com quem divide a direção, Miguel Przewodowski, a um incômodo (ainda que necessário) apêndice.
Uma das primeiras cenas de Amazônia: O Despertar da Florestania é da própria Christiane Torloni, durante as manifestações a favor das Diretas Já em 1984, conclamando a população reunida a aplaudir todos os partidos que participaram da redemocratização do país. E ela grita para a plateia: “uma salva de palmas para o PDT, para o PMDB, para o PT, para o PC do B”. Esta fala, 35 anos atrás, tinha um propósito. Reapresentada hoje, em 2019, num contexto completamente distinto, pode ser lida de maneira bem diversa. Logo a seguir, convoca uma colega de Rede Globo, a jornalista Miriam Leitão, para dar seu depoimento e dividir seus pensamentos a respeito do tema a ser debatido. No entanto... qual seria esse? Ninguém parece saber ao certo. Pois logo se percebe que a relação de Leitão com o assunto vem do fato de morar, no Rio de Janeiro, em uma zona de Mata Atlântica, e estar diretamente comprometida a reflorestar o lugar com espécies nativas. A Amazônia do título, onde se encaixaria? Difícil saber.
Essa falta de foco está espalhada por todo o longa – que, de fato, faz jus ao formato: são quase 2 horas de projeção, uma metragem exagerada para algo que poderia ter se encerrado tranquilamente em metade desse tempo. Ao contrário de documentários relativamente recentes, como Amazônia (2013) ou Amazônia Eterna (2012), o filme de Torloni (ela faz questão de, nos créditos finais, afirmar que, apesar de ser codirigido por ela e Przewodowski, o filme é dela – literalmente, está escrito “Um Filme de Christiane Torloni”) não se direciona apenas à maior floresta do mundo – que, por acaso, está no Brasil. Através de uma montagem esquizofrênica, atira-se para todos os lados, de recortes de um depoimento do Papa Francisco nas Nações Unidas ao registro de um debate na FLIP, passando por jovens manifestantes que, ao serem questionados sobre a importância de lutar pelo meio-ambiente, sem pensar duas vezes, afirmam: “mas saúde e educação devem vir antes, né?”. O discurso dos realizadores parece concordar, pois não há esforço visível para depor em contrário. Nem mesmo a expressão “florestania” é investigada a fundo: para se ter ideia, ela é citada pela primeira vez passado mais de uma hora da narrativa.
Com a participação recorrente do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, da senadora Marina Silva e uma aparição mínima do ex-ministro do meio ambiente Carlos Minc (entre 2008 e 2010, durante a gestão Lula), Torloni também reforça seu viés político. Por outro lado, tenta insistentemente justificar o envolvimento de artistas em protestos públicos, como se eles, ainda que importantes, fossem também fundamentais. Esta inquietação é ressaltada pela absoluta ausência de dados. Não há nenhum número oficial, pesquisa, levantamento... absolutamente nada. Tudo acaba reduzido ao plano do achismo, entre frases óbvias (“se chama meio-ambiente porque está no meio de todos nós”) e sentenças clichês (“esquecemos que vivemos num país cujo nome veio de uma árvore, e em nossas veias não corre sangue, e sim, seiva”). E muitos, literalmente muitos planos e closes de Christiane Torloni, seja encontrando personalidades, vestindo camisetas com frases de efeito ou mesmo servindo de entrevistada para o próprio filme. No final, encerra-se com um clipe... dela mesma. Com mais humildade e atenção ao que de fato precisaria ser dito, talvez as boas intenções aqui reunidas conseguissem provocar alguma mudança. Porém, dentre tantas distrações, se verifica apenas a necessidade quase imperiosa daquela que deveria permanecer nos bastidores de se colocar à frente do próprio discurso. Seria confuso, se não fosse constrangedor.
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