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Para começo de conversa, é difícil não sucumbir à tentação dispersiva de identificar os filmes e as séries de televisão que passam na telona em A Névoa Verde. Não há propriamente uma trama, mas a justaposição de cenas de diversos exemplares audiovisuais, num experimento curioso em que passagens se agrupam sem sentido evidente, com encadeamentos cada vez mais aleatórios e desprovidos de uma lógica estrita. O denominador comum do material previamente triado, do qual os cineastas Guy Maddin, Evan Johnson e Galen Johnson lançam mão, é a cidade de São Francisco, onde a maioria dos registros ocorre. O simples vislumbre da ponte Golden Gate, famoso cartão postal, remete imediatamente a Um Corpo que Cai (1958), devidamente colocado nesse fluxo que se nega a ser coerente, embora a inclusão de uma misteriosa névoa verde intente criar um dado singular em meio à atração de fragmentos alheios. É uma proposta bem ousada.
Outro procedimento distinto é a extirpação das falas, com personagens sendo silenciados por sucessivos cortes secos que provocam um efeito saborosamente cômico. Decepcionante é o fato dos realizadores não manterem integralmente isso durante o longa-metragem, rapidamente deixando que as palavras surjam como intrusas que acabam dirimindo o conjunto, ao mesmo tempo ampliando a confusão e o nonsense, direcionando a um caminho sem volta. A Névoa Verde ensaia fundamentar um enredo de mistério, com várias imagens de perseguições em telhados, homens silenciando testemunhas e fazendo experimentos com filmagens. Todavia, isso é combalido pela colocação de mais frames aparentemente desconexos, com planos que evidentemente não se comunicam com o anterior e tampouco com o posterior. Essa trucagem tem como resultado a celebração da justaposição como artifício de geração de sentido cinematográfico, sem uma história a contar.
A Névoa Verde é fruto de uma mistura heterogênea de imagens, com texturas, matizes e aspectos distintos. A curiosidade dura pouco, perdendo gradativamente a força em decorrência da não radicalização de certos expedientes e a sensação crescente de uma ausência de norte. É uma produção que visa testar os resultados da improvável convivência (forçada) entre documentos tão díspares quanto um filme dos anos 80 e um clipe da extinta banda NSync. Incomodamente, as relações soam muito acidentais, sendo efetivadas com mais substância apenas se levada em consideração a recorrência dos cenários concernentes a São Francisco. No entanto, segmentos impagáveis como o da colagem de expressões de preocupação de Chuck Norris, célebre como um homem de ação, aqui reduzido a um pensador, chama a atenção para esse objeto fílmico não identificado que se constrói a partir, principalmente, da montagem de fartos excertos pré-existentes.
As camadas de representação asseveram a estranheza de A Névoa Verde. Em muitos momentos as imagens e os sons são transferidos às telas de personagens que as estão acompanhando, o que estabelece estratos dentro da narrativa. Há realmente pouco a se dizer sobre o conteúdo, exatamente porque ele é submetido majoritariamente à forma, dela retirando seu sumo enquanto decurso audiovisual em que o movimento é privilegiado em detrimento de uma progressão tradicional. Na telona desfilam personalidades prontamente reconhecíveis, como Humphrey Bogart, Martin Landau, Faye Dunaway, Meg Ryan, Nicolas Cage, Harrison Ford, Glenn Close e mais um sem número de ícones aqui transformados em meras fagulhas. O saldo é negativo, não por falta de originalidade e engenhosidade, mas pela aparente contingência da comunicação entre os planos escolhidos e a traição de uma metodologia que inicialmente garantia o pleno interesse.
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