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Sinopse

Sarah Winchester é a herdeira multimilionária da fortuna das Armas Winchester. Ela vive numa mansão onde supostamente habitam as almas que sofreram pelo fogo do rifle mais famoso do mundo. Apesar dos vizinhos tratarem da história como lenda, tudo muda quando Eric Price, um cético psiquiatra de San Francisco, é despachado para a propriedade a fim de avaliar o estado mental da idosa. O que ele logo descobre é que a obsessão da velha senhora pode não ser uma loucura, afinal.

Crítica

A Maldição da Casa Winchester possui boa parte dos ingredientes clássicos de filmes cujas tramas ocorrem em residências assombradas por espíritos não tão amigáveis. Antes, neste caso, surge o famigerado letreiro dando conta de que a produção é baseada em fatos, como se isso, por si, potencializasse o impacto dos eventos estranhos e macabros. Bom, temos aqui a edificação para lá de estranha, convenientemente labiríntica; o protagonista atormentado pela culpa decorrente de um acontecimento traumático do passado; a criança constantemente possuída por forças além da compreensão; os mordomos soturnos, donos de olheiras profundas e comportamentos supostamente enigmáticos; e a senhora de sanidade mental posta à prova, exatamente por agir influenciada pelos que se foram. Em virtude de tudo se passar no começo do século XX, pode contar, ainda, com aquele clima sombrio que a ausência da luz elétrica traz, e as paredes repletas de lamparinas, as mesmas que as pessoas carregam para ter clareza.

Essa verdadeira coletânea de convenções não seria, absolutamente, um problema, desde que houvesse disposição a evitar os clichês de abordagem, procedimentos medíocres à construção da atmosfera terrífica pretendida. Dr. Eric (Jason Clarke) é o protagonista, sujeito viciado em medicamentos, logo contratado pelo conselho administrativo da fábrica de armamentos Winchester a fim de fazer um relatório sobre a saúde mental de Sarah (Helen Mirren), sócia majoritária da empresa, mulher enclausurada numa casa em ininterrupta expansão, de lógica interna tão confusa quanto singular. Esse dado de ganância, já que os acionistas querem tomar o controle do império, não é aproveitado, senão como gatilho puro e simples. Michael e Peter Spierig, que assinam o filme como The Spierig Brothers, utilizam Eric de maneira ordinária, investindo pouco nas subjetividades, no mais das vezes, fazendo dele apenas o elemento estranho que descobre os mistérios, servindo, assim, como uma espécie de representante do espectador na trama. Todo mundo explica o contexto a ele.

A delineação do horror em A Maldição da Casa Winchester é pífia, obedecendo aos ditames do susto, vide a quantidade de aparições repentinas que visam manter a expectativa. Não há, porém, um esforço deliberado para estofar tudo de suspense, para nutrir um clima genuíno de medo. O resultado é a diluição do pavor como elemento de engajamento. O que sobra é um amontoado de brincadeiras sonoras e imagéticas que têm efeito (quando têm) bem imediato e perecível. Os fantasmas atacam a casa como ato de vingança contra os Winchester, já que o rifle batizado com o nome da família – que, obviamente, existe na realidade, sendo, também, artefato presente em nove de cada dez faroestes de renome –  é responsabilizado pelos mortos como causador de seus infortúnios. Tampouco os irmãos Spierig utilizam essa questão como substrato de uma possível discussão ética, relegando-a apenas a rastilho pelo qual a chama do ódio dos mortos pelos vivos transita banalmente até chegar à pólvora.

Helen Mirren, quase sempre coberta por um fúnebre vestido preto, é reduzida a mestre de cerimônias do encontro de Eric com o extraordinário. Nem o talento da britânica consegue salvar sua personagem da vala comum que os Spierig cavam. A história trepida entre incongruências e inconsistências, como a crença de alguns na possibilidade de ectoplasmas serem atingidos por munição normal. Para ter uma ideia, eles demonstram até espanto quando o tiro não abate a alma penada (?). Recheado de planos aéreos repetitivos, que intentam criar uma aura de apreensão com relação à casa da família que enriqueceu fazendo armamentos, bem como de visitas guiadas por corredores sombrios e paredes que rangem em resposta aos movimentos, A Maldição da Casa Winchester é mais um filme de horror genérico, que mistura componentes de prévio conhecimento e intimidade geral para estabelecer-se naquele incômodo espaço destinado às produções dispostas a faturar uns trocados sem ter qualidade.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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