Crítica
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Sinopse
Procurando recomeçar sua vida após um período conturbado, Don vive com a esposa grávida. Os dois pretendem se mudar para uma antiga mansão em precárias condições. Mas, ele descobre que lá aconteceu algo macabro.
Crítica
Uma estratégia corriqueira (e geralmente boa) para construir situações de terror é colocar em dúvida se objetos/estruturas naturalmente sem vida estão mesmo inanimados. O cinema já apresentou inúmeros agressores que não deveriam se mexer sem a influência humana, tais como os bonecos Chucky e Annabelle, bem como o Plymouth Fury 1958 de Christine: O Carro Assassino (1983). O horror frequentemente está na origem da aberração: a possessão. Não são as coisas que ganharam ânimo repentinamente, mas espíritos malignos que as utilizam como veículos para materializar ira ou levar a cabo desejos de vingança. Nesse sentido, as casas assombradas são clássicas no gênero, especialmente por deixarem de ser abrigos acolhedores e se transformarem em verdadeiros pesadelos. A Garota do Terceiro Andar segue essa cartilha fartamente aproveitada para determinar a sua circunstância particular de horror. No filme de Travis Stevens, um sujeito chega a uma cidadezinha para reformar o casarão recém-comprado e assim preparar a chegada da esposa grávida. No entanto, à medida que martela paredes, fuça em encanamentos antigos e toma contato profundo com o novo lar, se depara com uma realidade no mínimo intrigante e assustadora. A casa é viscosa, constantemente vertendo gosmas, apresentando algo como fluídos humanos. Tudo é bastante estranho ali.
Ao contrário do que poderíamos esperar pelo relevo dado ao material repulsivo de aparência orgânica que escorre das paredes, o cineasta Travis Stevens não investe num horror de contornos escatológicos. Aliás, passa surpreendentemente longe de acumular as nojeiras para envolver os personagens numa conjuntura tétrica. Logo, esses líquidos pegajosos se tornam meras pontuações (reiterativas) de que há algo de podre no lugar. Os fluídos disputam o espaço de importância com o passado do local e a tentativa de consolidar um subtexto que sustente e justifique. A Garota do Terceiro Andar falha em todos esses sentidos por conta do acúmulo das fragilidades. A encenação, o texto e o trabalho do elenco são pobres. Numa cena sintomática dessa falta de consistência, o barman pergunta a Don (C.M. Punk) se ele é homossexual, arrematando a curiosidade repentina com a informação (?) de que a casa adquirida não é convidativa a homens heterossexuais. A aparente gratuidade pressupõe que em algum momento haverá explicações plausíveis sobre a aversão da morada. Algo que não vem. O que acontece no encerramento é uma elucidação insuficiente, ancorada num moralismo vulgar. O sexo e as diferentes taras são utilizados no filme como uma maneira de engatilhar a existência do malvado. Aliás, a energia libidinal é observada aqui numa chave destrutiva e nefasta.
Simultâneo às pendências da habitação de poucos cômodos efetivamente assustadores, há o desempenho abaixo da média do elenco. Pífio, melhor dizendo, a começar pelo protagonista. C.M. Punk não consegue expressar os dilemas do forasteiro, o que, somado à displicência da direção, cria um protagonista involuntariamente caricatural. O ator se esforça, faz caras e bocas de bad boy tentando se redimir para virar um pai de família respeitável. Em nenhum instante deixa a emoção brotar de um vacilo, de algo menos exagerado. Inserindo o protagonista na lógica do sexo como potencialmente transgressor e passível de acarretar punições, A Garota do Terceiro Andar o compreende como pecador inveterado incapaz de desviar do caminho do mal e, portanto, candidato à fúria dos fantasmas de plantão. Seu passaporte para a danação é sucumbir aos encantos da estranha que lhe oferece a oportunidade de um teste moralista, conforme explicado no encerramento pela pastora (outro arremedo de figura que existe para explicar os porquês de tudo aquilo). O longa-metragem, então, sustenta uma tese torta de inevitabilidade – raciocínio do tipo “pau que nasce torno nunca se endireita”. Isso, porque apresenta uma realidade em que vítimas poderiam ser poupadas, caso fossem melhores como serem humanos. O resultado é um cinema moralista que certifica os justos e os condenados.
A Garota do Terceiro Andar é previsível, sobretudo por demarcar quem está apto a sobreviver e os destinados a serem brutalmente assassinados (em cenas de gosto questionável). Curiosamente, por demonstrar tanta preocupação com a superfície – os bons efeitos práticos, os vultos passando no fundo da imagem, as bolinhas de gude rolando pelas fendas na parede –, Travis Stevens transforma as histórias dos personagens em backgrounds burocráticos e quase sem importância. Portanto, não se trata de um filme no qual as manifestações sobrenaturais sublinham atributos e conflitos humanos, tais como a culpa, a perversidade, a traição, a bondade e a maldade. O que deveria valer é a repetição fetichista dos procedimentos caros ao gênero. Mas, o resultado é um amontoado de convenções mal aproveitadas. Nem a menina-tentação vivida por Sarah Brooks convence, haja vista a pegada pudica e comportada que a condiciona. Engrenagem essencial para definir o destino das pessoas nessa história manjada, o sexo é praticamente desprovido de potência. Há apenas uma sugestão bem envergonhada ao adultério e a nudez é evitada pela câmera como o diabo foge da cruz. A violência é domesticada, as aparições pretensamente aterrorizantes rapidamente perdem a aura de pavor, seja por repetição ou falta de jeito ao introduzi-las. Portanto, um filme passível de ser esquecido logo que termina.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 3 |
Francisco Carbone | 6 |
MÉDIA | 4.5 |
Pois é, já esqueci do filme.