Escrever é minha grande paixão, acima de todas as outras. Depois, com uma diferença menor que um fio de cabelo, vem empatadinho cinema e música. Quem me conhece sabe que essas três coisas são a grande fundação da minha personalidade e sem elas eu não funciono direito. Minha coluna aqui no Papo de Cinema vem pra oferecer pra você, leitor, o meu ponto de vista do mundo da sétima arte, com a diferença de que sempre terei como referência o que está acontecendo AGORA na cultura norte-americana, pois a cidade onde escolhi viver é Nova York e meu meio de trabalho está diretamente relacionado ao mundo do entretenimento. Então nada melhor do que poder mostrar a minha perspectiva sobre como certas coisas que podem dar super certo no país que reinventou o cinema vêm a naufragar por outros territórios, e vice e versa.

Esse é um fenômeno bem antigo. Pra quem tem pelo menos vinte cinco ou trinta anos de idade vai ser fácil lembrar de um filme de 1997 chamado O Advogado do Diabo (acima), com Keanu Reeves. Pois no Brasil esse filme foi um mega sucesso nos cinemas, teve boa resposta da crítica e foi ainda mais bem sucedido quando chegou em vídeo. Esse mesmo longa naufragou nas bilheterias e foi alvo de chacota da imprensa nos Estados Unidos – fato que foi retratado anos depois em revisão da crítica feita por alguns autores – e é reconhecidamente no meio do cinema como a maior prova de que mesmo que um filme não se pague na sua terra natal, há esperança do outro lado do oceano. O Advogado do Diabo teve seu melhor resultado no Brasil, acima de todos outros países. Foi na terra verde e amarela onde o longa teve a melhor resposta, e foi algo tão marcante que é uma referência em Hollywood até os dias de hoje.

Pois bem, unindo o útil ao agradável nessa minha coluna, vou combinar duas grandes paixões: literatura e cinema; e junto delas trazer também esse fenômeno de territorialidade e reação do público a certas obras. Esse texto vai falar sobre o fenômeno literário e cinematográfico que se tornou The Help.

Originalmente um livro escrito por Kathryn Stockett (no Brasil chamado de A Resposta), essa obra se tornou rapidamente depois de seu lançamento um best seller e o mais novo fenômeno literário americano, recebendo inclusive comparações com um dos maiores clássicos da literatura americana de todos os tempos, O Sol é para Todos, de Harper Lee. Não demorou muito e o bem avivado estúdio Dreamworks comprou os direitos da obra pra então a transformar em um filme, também chamado The Help (mas por algum motivo bizarro, no Brasil vai ser chamado de Histórias Cruzadas), e desde o primeiro dia em que o acordo foi anunciado, houve uma grande especulação em torno da adaptação.

Não há sombra de dúvida, esse é uma obra feita para o público americano, pois trata de assuntos que são muito delicados para o país inteiro. Os dramas que o sul dos Estados Unidos passaram e passam até hoje por causa de preconceito e desigualdade social e ressoam na sociedade constantemente. E apenas são percebidos por pessoas que vivem aqui – por mais que eu sempre tenha prestado atenção nesse tipo de acontecimentos social americano através de notícias, filmes e livros, toda a situação toma outra proporção quando você vive no país e convive com pessoas que viveram aquelas histórias que até então não passavam de ficção.

Pois bem, porque The Help é um fenõmeno tão gigantesco por aqui e no Brasil se fala tão pouco sobre a obra? Precisei fazer uma pesquisa extensiva na internet pra conseguir chegar em ínfimas informações sobre o filme, que mesmo assim não me levaram muito longe; o livro, idem. Pra mim é difícil compreender porque uma obra tão delicada e profundamente bela passaria despercebida por um país como o Brasil, que também viveu conflitos e teve dificuldades com preconceito racial da mesma forma; todos somos humanos, temos os mesmos sentimentos sendo brasileiros, americanos ou angolanos, e para nós não é muito difícil entender as sensações como essas que são apresentadas na obra de Stockett.

The Help se passa no começo dos anos 1960 no estado do Mississipi, no sul dos Estados Unidos, e conhecido como o estado mais
preconceituoso e cheio de violência racial de todo país. Nessa obra, a história gira em torno de uma jovem jornalista branca, conhecida como Skeeter, que está começando sua carreira em um jornal local e sonha em ser independente e morar em Nova York. Ainda presa aos preconceitos contra as mulheres, outro assunto ainda muito presente em nossa sociedade, Skeeter decide ir atrás de falar sobre algo que sempre a incomodou e escrever algo que poderia mudar a perspectiva de todo país em relação a esse assunto. O que a autora quer é mostrar pro país e pro mundo o ponto de vista das empregadas e babás negras que servem as famílias brancas, que criam as crianças pelos seus pais e que mesmo assim, geração após geração, são tratadas como animais pela sociedade branca separatista. Skeeter tem um gigantesco desafio pela frente, pois a simples interação que ela tem interesse em ter com essas empregadas domésticas e babás é contra a lei do estado. Essas mulheres é que, no caso, dão o título à obra, pois no sul eles chamavam essas mulheres de The Help, ou A Ajuda. Isso para não soar “tão ruim” frente ao resto da sociedade, e os faziam parecer mais liberais.

O filme estreou nos Estados Unidos com um grande barulho nas bilheterias e em toda a mídia; os maiores jornais americanos deram destaque de capa para o filme, bem como as revistas de entretenimento e cultura; The Help está sendo apontado como um dos mais fortes candidatos ao Oscar do próximo ano incluindo desde prêmios para o elenco até trilha sonora, aqui assinada por Mary J. Blige, direção, figurino e roteiro adaptado. Não há dúvida algum que esse filme sairá vencedor. Ele trouxe de volta aos olhos do mundo um assunto que é muito facilmente deixado de lado pela sociedade. Em 2010, Sandra Bullock nos deu um gosto desse mesmo assunto quando levou aos cinemas seu maior sucesso de público e crítica até o momento: The Blind Side (Um Sonho Possível, no Brasil). Pois bem, caro leitor, aquele filme se passava nos dias de hoje, no mesmo estado onde The Help acontece. E The Blind Side trata de um assunto ainda menos importante para o público brasileiro, que é o futebol americano, tema que na grande maioria das vezes acaba sendo motivo forte o bastante pra jogar esses títulos direto pras prateleiras das video-locadoras; pois bem, precisou uma atriz de grande renome internacional e muito barulho nas bilheterias de países ao redor do planeta pra que o Brasil finalmente lançasse aquele filme nos cinemas e desse a devida atenção à mais uma bela história, aquela que era baseada em fatos reais.

Talvez The Help vá precisar de um pouquinho mais de tempo pra receber esse mesmo tratamento. No caso dessa obra, as atrizes principais são pouco ou nem um pouco conhecidas do público brasileiro. Emma Stone teve seu maior sucesso de público e crítica americano, Easy A (A Mentira),  jogado direto pro vídeo no Brasil, e Viola Davis e Octavia Spencer, as outras duas protagonistas, são então completamente desconhecidas do grande público brasileiro, porém adoradas pelos americanos. Da mesma forma que Emma Stone, que é apontada como a mais talentosa atriz de sua geração. The Help vai precisar de muito combustível pra rodar no Brasil, talvez vá precisar mesmo esperar passar o Oscar pra ver o sucesso bater em sua porta. Aparentemente, a distribuidora no país já sabe bem disso, pois nesse momento o lançamento está previsto para março de 2012, perfeitamente cronometrado para depois de todos os prêmios. O que vai fazer com que o filme receba grande atenção da mídia local.

De uma forma ou de outra o filme vai chegar por “Terras Brasilis” e o público vai ter o prazer e deleite de ver um dos trabalhos mais lindos já feitos pelo cinema americano. Uma obra de nível intelectual e artístico superior, que dispensa efeitos especiais e explosões mas que é capaz de causar uma combustão expontânea na alma. E eu, caro leitor, vou ficando por aqui e a única dica que eu deixo é essa: anote no seu calendário, e em março de 2012 e vá ao cinema assistir Histórias Cruzadas, se é que esse nome ainda vai ser o mesmo até lá!

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Jornalista, trabalha na indústria da moda e entretenimento. Após experiências em renomadas agências internacionais como Ford Models e Marilyn Agency, atualmente está na Elite Models, em Nova York, Estados Unidos. Como jornalista produziu matérias de capa para revistas como Vogue, L'Officiel, Empório e Spezzato e para o site de estilo de vida brasileiro IG Gente. Aqui o autor pretende mostrar o seu ponto de vista sobre o que acontece no mundo da sétima arte em terra estrangeira.
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