23 nov

Loucuras de final de ano

Os Estados unidos, mais do que qualquer outro país, mantém um calendário super restrito para seus filmes. Um estúdio, antes de marcar a data de estreia de um de seus longas, analisa o público alvo, a classificação etária, quais outros lançamentos estão sendo programados para a mesma época, mas, mais especificamente, e acima de tudo, em que época do ano tal filme será lançado.

Dependendo do feriado e das festividades que cercam cada época do ano, há uma forte influência no impacto que um filme irá causar ou não nas bilheterias. É verdade que aqui nos Estados Unidos as festividades de final de ano representam, provavelmente, o período mais forte para os estúdios após o verão americano. Isso começa especialmente no feriado de Ação de Graças, quando o país inteiro tira cinco dias de folga para agradecer aos índios americanos pela terra onde eles construíram sua nação. Se você me perguntar, na verdade é um pedido de desculpa eterno pelo massacre de milhares de índios – mas tudo bem, não tenho nada a ver com isso.

O feriado de ação de graças é o que demarca o começo da mudança de temporada. É quando as cidades começam a se vestir pro Natal e quando dezenas de filmes feitos especificamente para essa época começam a ser lançados. Esses longas, em qualquer outro mês do ano, não funcionariam de forma alguma aqui nesse país. Diferente do Brasil, que não tem uma tradição tão forte em relação à essas festividades.

Nos Estados Unidos, onde as famílias se dividem em diversas fases de suas vidas – pois é tradição que os adolescentes saiam da casa dos pais depois do segundo grau para seguir seus estudos em universidades em cidades ou estados diferentes – essas datas específicas são vistas como oportunidades de reunião familiar, e as pessoas levam isso à sério.

Historicamente, filmes familiares que seriam lançados no verão americano, mas que acabam sendo transformados em filmes de ação e em comédias de grande orçamento, terminam por ser empurrados pro final de semana de Ação de Graças, pois o clima familiar está no ar e só se fala nisso durante semanas – antes e depois dele acontecer! Portanto, produtos familiares tem maiores chances de sucesso. A maior prova desse fenômeno foi Um Sonho Possível, em 2009, que viu sua data de lançamento ser empurrada por meses e meses até cair justo no final de semana de estreia de Lua Nova. A surpresa aconteceu quando Sandra Bullock derrubou todos os concorrentes e chegou em segundo lugar no primeiro final de semana, enquanto que na segunda semana levou o primeiro lugar, lugar em que permaneceu até o Natal.

Pois chegamos agora em mais uma semana de Ação de Graças: milhares de pessoas irão lotar aeroportos, supermercados e salas de cinema no país inteiro, e sabe o que eles estarão loucos pra assistir? O novo filme dos Muppets! Sim, caro amigo, Os Muppets são um fenômeno e estão mais em alta do que nunca! Pode apostar que vai ter muito marmanjo indo pro cinema sozinho só pra conferir o que essa turma de marionetes vai aprontar dessa vez.

Em baixa com o público americano há quase dez anos, os Muppets estão surpreendendo toda a mídia americana, tanto que capas de revistas e espaço nos telejornais estão sendo dados à trupe. Depois de uma repaginada na imagem dos bonecos, eles voltaram em um filme de Natal apoiado por atores que também estão muito em alta com o público local. Ou seja, chamaram a atenção mesmo!

Agora, será que esse sucesso vai conseguir se repetir em outros territórios? Tradicionalmente, o Brasil nunca foi um país que teve um relacionamento muito próximo com os Muppets. Talvez um pouco com o desenho animado Muppets Baby, que era exibido todos os dias em cadeia nacional. Mas a proximidade do Brasil com os personagens para por aí. Todos os filmes anteriores das crias de Jim Henson foram fadados à lançamentos limitados em poucos cinemas ou saíram direto em Vídeo/DVD. Imagino, portanto, que dessa vez não será diferente. Não apenas os Muppets têm um apelo limitado com o brasileiros, mas os tais atores que aqui nos Estados Unidos são tão queridos igualmente possuem pouca visibilidade com o grande público brazuca.

Muitos dos filmes de Natal lançados aqui nos Estados Unidos têm um destino triste no Brasil. Surpresas do Amor, por exemplo, teve lançamento em terras verde e amarela em janeiro e se deu mais que mal. Aqui na América do Norte esse mesmo filme, que não podia ser mais natalino – seu nome original é Four Christmases ou, Quatro Natais – teve uma repercussão genial e até hoje é considerado um dos filmes mais bem sucedidos da época.

Surpresas do Amor

Desde a semana passada foi dada a largada à temporada dos “Holidays”, como eles chamam aqui, e é nessa temporada em que todos os filmes de temática familiar, comédias românticas e desenhos animados vêm à tona. Dentro das próximas semanas os cinemas americanos irão ver o lançamento de mais de seis animações ou produções de temática infantil, incluindo As Aventuras de Tintim, Operação Presente – que está sendo super divulgado e cobre ônibus e metrôs por toda Nova York – Alvin e os Esquilos 3 e Gato de Botas. Os personagens Harold e Kumar, que nunca foram muito bem sucedidos no Brasil e aqui são uma lenda, também vão ganhar uma temática natalina e serão lançados inclusive em 3D – não me pergunte porque, garanto que nem eles tem explicação pra esse fato idiótico.

As Aventuras de Tintim

Mas aí está a fórmula: enquanto funcionar pra bilheteria, continuará sendo uma excelente forma de compartimentalizar o mercado cinematográfico e manter a vida do cidadão comum em ordem e as bilheterias cheias de dinheiro. Enquanto isso, os outros países, pobres coitados, tem que se virar pra entender certas tradições americanas que não fazem sentido em nenhuma outra parte do mundo!

Gabriel Rocha

Jornalista, trabalha na indústria da moda e entretenimento. Após experiências em renomadas agências internacionais como Ford Models e Marilyn Agency, atualmente está na Elite Models, em Nova York, Estados Unidos. Como jornalista produziu matérias de capa para revistas como Vogue, L'Officiel, Empório e Spezzato e para o site de estilo de vida brasileiro IG Gente. Aqui o autor pretende mostrar o seu ponto de vista sobre o que acontece no mundo da sétima arte em terra estrangeira.

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