Quem ouvir falar no nome de Maurice Joseph Micklewhite pode até estranhar, mas este é a verdadeira alcunha de Michael Caine, um dos atores britânicos mais respeitados de sua geração e que, ao longo de sessenta anos de carreira, coleciona 160 créditos nas mais variadas produções do cinema e da televisão. Das seis indicações ao Oscar, o intérprete ganhou nas duas vezes que concorreu a Ator Coadjuvante, além de ter sido premiado outras 29 vezes e lembrado em mais 42 em diversos festivais e afins.

Caine já entregou atuações marcantes em filmes como O Despertar de Rita (1983), Como Conquistar as Mulheres (1966), Laura: A Voz de uma Estrela (1998), Vestida Para Matar (1980) e Como Possuir Lissu (1966), além de se destacar com seu aguçado humor britânico em produções menores como Miss Simpatia (2000) e A Feiticeira (2005). Para homenagear uma carreira tão diversificada e celebrar o aniversário do ator, que no dia 14 de março de 2014 completa 81 anos, a equipe do Papo de Cinema resolveu eleger cinco de seus melhores filmes – e mais um papel que merece destaque.

 

Jogo Mortal (Sleuth, 1972)
Por Matheus Bonez
Em seu derradeiro filme, Joseph L. Mankiewicz, diretor de clássicos como Núpcias de Escândalo (1940), A Malvada (1950) e De Repente, no Último Verão (1959), colocou o shakespeariano Laurence Olivier ao lado de Michael Caine para um duelo perigoso de homens apaixonados pela mesma mulher. Basicamente, a trama passada em sua maior parte no mesmo ambiente trata de um escritor (Olivier) que convoca o amante (Caine) de sua mulher para fingir o roubo de sua casa e ficar com o dinheiro do seguro. Obviamente, o marido traído está mais interessado em liquidar o rival, o que é claro desde o início da história com uma interpretação soberba do sempre classudo Olivier. Porém, Caine se iguala ao seu inimigo aos poucos, revelando que, por trás da faceta do simpático maquiador de classe média, se esconde um adversário tão perigoso e manipulador quanto o escritor. Não à toa ambos intérpretes disputaram a estatueta de Melhor Ator no Oscar por seus respectivos papéis. Em 2007, Caine voltaria à mesma trama no remake Um Jogo de Vida ou Morte, desta vez no papel que pertencera à Olivier e com Jude Law em seu lugar original como o amante, porém num filme sem o mesmo brilho deste clássico que merece ser revisto como um dos suspenses mais intrigantes da história do cinema.

 

Hannah e Suas Irmãs (Hannah and Her Sisters, 1987)
Por Rodrigo de Oliveira
Deus, ela é linda. Tem os olhos mais bonitos. E fica tão sexy naquele suéter. Eu gostaria de ficar sozinho com ela e abraçá-la e beijá-la e dizer-lhe o quanto a amo e que quero cuidar dela. Pare, seu idiota, ela é a irmã de sua esposa. Mas não consigo evitar. Estou consumido por ela. Por meses. Eu sonho com ela, penso nela no escritório. Oh Lee, o que farei?” O drama de Elliott, personagem de Michael Caine em Hannah e Suas Irmãs, é colocado logo de início para o espectador, que acompanha o relato desesperado daquele homem consumido por uma paixão proibida. O texto de Woody Allen é hábil em nos dar diversas informações necessárias para entendermos o problema do sujeito em pouquíssimos minutos. E, claro, a performance do ator nos faz sermos ora cúmplices, ora apenas testemunhas de seu desejo e posterior escapada do casamento. Um trabalho ímpar tanto de Woody Allen, que recebeu o Oscar de Melhor Roteiro Original, como de Michael Caine, que também foi lembrado pela Academia por sua performance, como ator coadjuvante. Um dos trabalhos mais premiados e queridos da carreira do cineasta novaiorquino e um dos papéis mais interessantes da carreira do sempre competente Michael Caine.

 

Regras da Vida (The Cider House Rules, 1999)
Por Marcelo Müller
Pelo papel do Dr. Wilbur Larch, Michael Caine venceu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante. A adaptação do best-seller homônimo de John Irving, levada às telas pelo sueco Lasse Hallström, acompanha o jovem interpretado por Tobey Maguire, um garoto sem familiares que vira aprendiz do personagem de Caine, menos no que diz respeito a certas lições que apenas a vivência pode ensinar. A ligação paternal entre mestre e aprendiz torna ainda mais difícil o inevitável momento da separação, a partir do qual o rapaz parte para assimilar o que a vivência alheia apreende de maneiras distintas. Se Hallström hoje parece um cineasta acomodado na adaptação de livros melosos, num passado não muito distante ele despontou como um dos bons artesãos estrangeiros do cinema hollywoodiano. Michael Caine, por sua vez, exibe a habilidade de sempre, um senso de atuação que, a bem da verdade, passa longe dos manuais e das técnicas, pois vem tanto da profunda compreensão das motivações de quem interpreta quanto da capacidade muito particular de transformar até os menores momentos em instantes de emoção genuína.

 

O Americano Tranquilo (The Quiet American, 2002)
Por Robledo Milani
Um veterano repórter inglês entra em conflito com um jovem médico dos Estados Unidos pela disputa do amor de uma bela vietnamita. A sinopse parece simplista, mas há mais por trás desse inteligente drama construído com habilidade pelo diretor Philip Noyce. Se Brendan Fraser está esforçado, lutando o tempo inteiro para estar à altura da expectativa que lhe é depositada, o oposto se percebe em Michael Caine, seu antagonista: é impressionante perceber o quanto ele consegue com tão pouco esforço. Seu personagem, um homem calejado pela vida, muito já viu e experimentou. Agora ele vislumbra a possibilidade de uma última alegria, mas sabe que a paciência é sua aliada. Merecidamente indicado ao Oscar, ao Globo de Ouro e ao Bafta, Caine oferece aos seus colegas de elenco – e à todos nós na audiência – uma verdadeira aula de atuação, lidando com muito conforto com todos os silêncios da trama, manejando cada momento de tensão como se fosse o dono do ambiente – quando em muitas vezes estava longe disso. Se Fraser é o americano do título, sua contraparte é um inesquecível Michael Caine, que com tranquilidade rouba o filme para si, conquistando a todos em ambos os lados da tela no processo.

 

Filhos da Esperança (Children of Men, 2006)
Por Danilo Fantinel
Em um de seus melhores filmes, o oscarizado Alfonso Cuarón presenteou Michael Caine com um personagem inusitado, diverso dos tipos que normalmente interpreta – aqueles que transitam entre personas tradicionais, mentores de meia idade e figuras paternas. É verdade que por um lado seu Jasper é o que se poderia chamar de tutor paternalista de Theo (Clive Owen), o ex-ativista que se torna um burocrata na Londres caótica de 2027, imersa em terror e radicalismo depois que, por algum motivo, as mulheres já não conseguem engravidar. Por outro lado, Jasper é um riponga tardio por excelência, um neo-hipster libertário por condição, um homem livre por necessidade e um amante da cannabis por opção. Vê o fim do mundo de camarote ao lado de sua esposa catatônica, sem desespero ou preocupação. Do alto de sua sabedoria, Jasper refugia-se no interior inglês para evitar a violência e a insegurança da metrópole durante o fim dos tempos anunciado pela impossibilidade da continuação da espécie humana – sempre saboreando uma boa bebida, um bom fumo e uma boa música. É no aconchego do lar, em meio à natureza, que Jasper dá refugio a Theo e a uma adolescente que será a última esperança sobre a Terra.

 

+1

Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (The Dark Knight Rises, 2012)
Por Yuri Correa
Um trabalho de diversas maneiras admirável e repleto de talentos icônicos, a trilogia do Cavaleiro das Trevas conduzida por Christopher Nolan nos entregou em três filmes o lado humano do homem que se vestia de morcego para combater o crime e das figuras que o cercava. Uma delas, o mordomo Alfred, que vivido por Caine, equilibra-se perfeitamente entre o tom paternalista e o de amigo fiel, e sua dedicação para com seu patrão/filho de criação é tocante e um dos momentos mais tocantes do terceiro capítulo, O Cavaleiro das Trevas Ressurge. Sempre com seu sotaque cockney presente, o ator jamais deixa que a dicção torne repetitivas suas performances, e cada personagem seu é claramente uma pessoa diferente, o que pode ser exemplificado até mesmo dentro dos trabalhos que realizou em parceria com Nolan, onde Alfred é o terceiro personagem que já interpretou, e mesmo tendo funções parecidas, diferencia-se bastante dos outros dois vistos em A Origem (2009) e O Grande Truque (2006). Batman é uma realização admirável, mas já não se pode imaginar a existência do mesmo sem o personagem de Michael Caine com seu humor e conselhos incisivos.

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