Em mais uma das entrevistas com críticos de cinema, reproduzo a conversa via e-mail que tive em abril de 2011 com André Barcinski, dono de irreverência textual inconfundível, e a quem aproveito para agradecer.
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André é crítico da Folha de S. Paulo. Trabalhou no jornal Notícias Populares, Jornal do Brasil e Jornal da Tarde. Foi correspondente em Nova York e Los Angeles. Autor de “Barulho”, vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem de 1992, e co-autor de “Maldito – A Vida e o Cinema de José Mojica Marins, o Zé do Caixão”. Diretor de “Maldito” (2001), documentário vencedor do Prêmio do Júri no Festival de Sundance.
Blog de André Barcinski: http://andrebarcinski.blogfolha.uol.com.br/
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Como nasceu em você a paixão pelo cinema?
Meus pais sempre gostaram de bons filmes. Quando eu era adolescente, comecei a freqüentar cineclubes no Rio (Macunaíma, MAM, as sessões de filmes franceses na Maison de France). Depois, fui cineclubista, fundei o cineclube da minha escola.
Qual é o sentido de ser crítico nos dias de hoje?
Acho que o mesmo de sempre: tentar separar o joio do trigo; destacar quem merece e atentar para novos nomes.
Qual sua posição frente a nova crítica de cinema, que germinou na era dos blogs e das revistas virtuais?
Eu acredito que qualquer discussão sobre cinema – e arte em geral – é válida, não importa o veículo. Hoje, as pessoas parecem ter menos disposição para ler textos longos, os blogs e sites sobre cinema são bem populares.
Como vê o academicismo de certas linhas de pensamento na crítica cultural? Acredita que a dissecação de um filme, tornando a análise o mais objetiva possível, tende a enfraquecer a importância da análise subjetiva?
Eu acho que a crítica, por mais informação que possa transmitir, funciona melhor quando é subjetiva. É a análise que aquela pessoa faz da experiência de ter visto aquele filme. Claro que é importante contextualizar a obra e descrevê-la, até para o leitor ter uma idéia melhor do que vai assistir. Mas eu, como leitor, quero saber como aquele filme afetou a pessoa que está escrevendo. É óbvio que cada pessoa reage diferentemente a um filme. Isso depende de uma série de fatores e gostos pessoais. Mas a crítica que mais me toca é aquela em que a pessoa fala abertamente sobre a obra. Prefiro um texto pessoal e com lacunas de informação a uma crítica fria e “eficiente”.
Quais são seus críticos de cinema favoritos? Os de outrora, que influenciaram ou ainda influenciam seu trabalho, e os de agora, que acredita sustentarem com talento a causa da crítica de cinema.
Sempre volto a Pauline Kael, não tem jeito. Tenho todos os livros dela, é fantástico assistir a um filme e depois conferir o que ela escreveu. Ela escrevia de forma livre, como se estivesse conversando com o leitor, e era muito corajosa. Defendeu diretores execrados por muitos e destruiu alguns filmes “intocáveis”. Mesmo se você não concordasse com ela, era impossível não ver ali uma opinião forte e pessoal. Entre os brasileiros, gostava muito do Salvyano Cavalcanti de Paiva. Dos contemporâneos, gosto do David Denby, da New Yorker. E adorava o Elvis Mitchell, no NY Times, pena que durou tão pouco.
É célebre a história de Antonio Moniz Vianna parou de escrever quando da morte de seu maior ídolo, John Ford, pois acreditava que nada tinha mais a acrescentar como pensador diante da crise criativa contemporânea. Qual diretor cuja morte já lhe provocou semelhante desalento?
Nenhum, porque os diretores de que mais gosto – Pasolini, Buñuel, Satyajit Ray, Fuller, Mojica, Kurosawa – já tinham feito seus melhores trabalhos antes de eu começar a acompanhar suas obras. Fiquei muito triste com a morte de Kieslowzki, porque gosto muito dos filmes dele e acho que ainda tinha muito a oferecer.
A perda de espaço de textos críticos nos veículos impressos é sintoma da falta de interesse público, ou a busca ávida dos veículos pela adequação a tempos de pouca reflexão?
Sinal dos tempos. Tudo é mais rápido e mais curto. Às vezes, me pego relendo textos que fiz para jornais e revistas há 15 anos, e me assusta como tínhamos espaço para escrever. Hoje, o espaço reduzido nos jornais força os críticos à concisão. Fica difícil fazer grandes reflexões ou analogias quando se tem poucas linhas. Além do mais, sempre procuro lembrar que estou escrevendo em um jornal de grande circulação e para um público que, muitas vezes, só quer saber se aquele filme vale duas horas de seu tempo. É muito diferente escrever um livro sobre um cineasta ou um texto para uma revista de cinema.
Discutir “comércio versus arte” ainda é válido quando percebemos qualquer cinematografia?
Claro. Especialmente hoje, quando as fronteiras entre os dois estão tão indefinidas.
Como vê o cinema brasileiro atual?
Com preocupação. Nossos filmes são muito caros, e a forma de produção é lenta e privilegia o cinemão comercial. Um cineasta leva cinco anos para conseguir dinheiro para um filme. É muito tempo. Acho que a geração mais nova deveria buscar maneiras mais rápidas, baratas e eficientes de filmar. Acho inadmissível que as tecnologias melhorem tanto, com câmeras melhores e mais baratas, e os custos dos filmes continuem subindo.
* Entrevista concedida em Abril de 2011
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