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Sinopse

Durante a montagem de uma peça da Broadway, o elenco acaba se envolvendo numa ciranda amorosa. E tudo começa quando o diretor contrata uma antiga garota de programa, agora atriz, sua esposa e o ex-amante dela.

Crítica

Existe uma qualidade bastante teatral em Um Amor a Cada Esquina, novo filme de Peter Bogdanovich, o primeiro em um período de 12 anos. Esta característica não chega a ser tão exacerbada quando a deliciosa comédia que o cineasta comandou em 1992, chamada Impróprio para Menores, que usava dos bastidores da encenação de um espetáculo de teatro material para construir sua trama. Aqui, este detalhe dos bastidores continua, mas a peça é mero acessório. Apenas uma desculpa para uma gama rica de personagens – todos ligados de alguma forma – se choquem em divertidas situações.

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A trama é assinada pelo próprio diretor ao lado de Louise Stratten e nos apresenta, primeiramente, uma entrevista com a atriz em ascensão Isabella Patterson (Imogen Poots). Ela nos mostra seu amor pelo cinema e como vem galgando degraus para o estrelato enquanto conversa com a cínica jornalista Judy (Illeana Douglas). Mal a repórter sabe que esta história de Isabella envolve muitos encontros e desencontros e algumas verdades escondidas. Isabella é Izzy, uma garota de programa suburbana também conhecida por Glowstick por sua clientela e que sonha em se tornar atriz. Quando atende o chamado de um diretor de teatro chamado Arnold Albertson (Owen Wilson), ela nem imagina que sua jornada dará uma guinada. Seu cliente tem mania de transformar a vida das mulheres que encontra, oferecendo-lhes uma quantia generosa para abandonar a prostituição. Ela aceita, sem nem saber da profissão real do seu atencioso parceiro de cama.

Pouquíssimo tempo depois, Izzy se vê no palco, fazendo um teste para nova peça de Albertson – atuando frente a frente com a esposa do diretor, Delta (Kathryn Hann). O teatrólogo fica completamente desconfortável, pois detesta reencontrar as suas “mulheres salvas”. Mas Izzy é tão boa atriz que não há jeito de ele não lhe oferecer o papel. Enquanto isso, outro ator da peça, o astro Seth Gilbert (Rhys Ifans), está de olho na esposa do chefe e pretende usar o seu conhecimento deste affair para tirar vantagem. Neste interim, o roteirista do espetáculo, Joshua Fleet (Will Forte), se encanta por Izzy e a convida para sair. O problema é que ele namora a temperamental psiquiatra Jane Claremont (Jennifer Aniston), que está tratando de um caso difícil em seu consultório: um senhor de idade, o juiz Pendergast (Austin Pendleton), está completamente obcecado por uma garota de programa. Adivinhe quem ela é? Nesta Nova York fictícia, onde todos parecem se conhecer e os caminhos se cruzam, as confusões só aumentam.

O microcosmo criado por Peter Bogdanovich é o que deixa toda a história com cara de peça teatral. São poucas as locações, as ligações entre os personagens são exageradas e o senso de que tudo está conectado fica evidente a cada nova cena. Ao se entregar como uma comédia farsesca, Um Amor a Cada Esquina nos convence de que tudo isso é possível. E com um elenco cheio de nomes graúdos e defendendo bem seus papéis, fica bem fácil acreditar nesta história. Owen Wilson utiliza de sua persona simpática e mulherenga, já exibida em diversos outros filmes, para viver este homem misterioso, que sente prazer enorme em transformar a existência das pessoas. Talvez ele não consiga mudar o mundo com o seu teatro e, por isso, acaba partindo para este corpo-a-corpo – literal e figurativo. Ao lado de Wilson, temos o óbvio destaque para Jennifer Aniston, vivendo uma personagem completamente diferente do que está acostumada a interpretar. Boquirrota, mandona e bastante cínica, sua psiquiatra é terrivelmente hilariante, sempre com uma frase na ponta da língua para desarmar seu interlocutor. Uma pena que ela ganhe pouco tempo em tela para desenvolver melhor aquela persona deliciosamente diabólica.

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Por outro lado, quem tem bastante espaço e acaba se perdendo um tanto é Imogen Poots. Ela é adorável, sem sombra de dúvidas. Mas o sotaque nova-iorquino forçado não convence e ainda somos obrigados a aguentá-lo por boa parte da trama. Ela diminui o tom do sotaque durante a entrevista, que serve como moldura para a história principal do filme. Mas em um mundo onde estamos acostumados a deliciosas comédias de Woody Allen, com personagens que falam e vivem intensamente aquele lado de Nova York, conferir Poots tentando dar o seu melhor simplesmente não é o suficiente.

Mesmo há tempos sem dirigir, Bogdanovich não parece tão enferrujado, ainda que continue pagando tributo às comédias do passado, como fazia quando estava ativamente envolvido com seus longas-metragens. Como bom cinéfilo que é, além de ser crítico de cinema, o autor acaba por preencher seu filme com diversas referências à sétima arte e ainda incluindo algumas participações que farão seus fãs vibrarem. Não só Cybill Shepherd tem seu papel garantido, mas algumas pontas surpresa deixam o programa todo bem divertido.

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Rápido e agradável, ainda que não tão engraçado quanto poderia ser, Um Amor a Cada Esquina mostra um Peter Bogdanovich deveras sereno. É o retrato daquele mestre que há tempos não dava o ar da graça e, por sentir saudades do cheiro do set, retorna para mais um passeio tentando apenas se divertir e, por tabela, fazer o mesmo com seu público. Por boa parte deste longa-metragem, ele consegue exatamente isso. E mais: coloca no espectador mais cinéfilo a vontade de rever alguns dos seus trabalhos mais antigos.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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