Crítica


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Sinopse

O protagonista de Muito Esforçado é Benny, um jogador de futebol americano, está lutando para aceitar sua sexualidade no complexo período da faculdade. Nesse processo difícil, mas também engraçado, ele acaba descobrindo que está compensando demais ao tentar parecer algo que não é. Comédia.

Crítica

Benito Skinner é aquilo que os norte-americanos se acostumaram a chamar de “self-made man”, ou seja, um cara que meio que se fez sozinho (claro, melhor deixar de lado nessa consideração qualquer privilégio que já tenha vindo de berço). A veia artística despertou cedo, e o porte atlético se destacou no colegial. Mas o gosto de sucesso só veio com o personagem “Benny Drama”, pelo qual ficou conhecido nas redes sociais imitando celebridades como Shawn Mendes e Lana Del Rey. Lançou um podcast, fez participações pontuais em filmes e séries – como a recente versão de Queer as Folk (2022) ou o independente Idiotka (2025) – e se lançou no stand up com o monólogo Overcompensating. Foi essa apresentação, que data de 2018, que agora foi adaptada no formato de série em Muito Esforçado, produção original da Prime Video que se tornou a mais assistida da plataforma em sua semana de estreia. Mas todo esse barulho… compensa?

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A primeira impressão, logo no episódio de abertura, é de estranhamento. Afinal, trata-se de um programa sobre adolescentes no qual todos – ou ao menos os protagonistas – são interpretados por adultos que já passaram dos 25 anos (a maioria tem mais de 30). Aceitá-los como jovens de 17, 18, até mesmo 20 anos é um tanto forçado. Mas não é exatamente disso que trata a magia do cinema (ou dos seriados, no caso)? Assim, uma vez vencido esse desconforto, se torna mais fácil mergulhar no drama de um ex-jogador de futebol americano no colegial, ídolo do high school, que acaba de chegar na faculdade e começa a se perguntar se não é essa a oportunidade para, finalmente, entrar em um entendimento pessoal sobre quem ele, de fato, é. Sim, trata-se de mais uma jornada de autodescobrimento, tendo como ponto de partida questionamentos sobre identidade e orientação sexual. Ele gosta de meninos ou de meninas? Essa, enfim, parece ser a origem de todas as suas preocupações.

Skinner não apenas teve a ideia e a levou primeiro aos palcos, como é também o roteirista e intérprete do protagonista, não por acaso chamado… Benny. Ou seja, trata-se de uma ficcionalização de época por ele mesmo vivida, algo bastante pessoal e, por isso mesmo, levada às telas com uma perceptível autenticidade. Benny é bonito e atraente, mas também inseguro e facilmente influenciável – como a grande parte daqueles com a mesma idade destes personagens. Ele ouve de um veterano que a iniciação sexual pode determinar como será visto pelos colegas nos anos seguintes, e escolher a parceira certa (nem passa pela sua cabeça a coragem de se assumir com um outro rapaz logo de cara) pode ser fundamental. Esse mesmo dilema está sendo enfrentado por Carmen (uma desenvolta Wally Baram, roteirista de séries como O Que Fazemos nas Sombras, 2022, e Falando a Real, 2023, estreando como atriz). A sinergia que surge entre os dois parece ser a solução de qualquer angústia experimentada por ambos. Mas o que fazer quando o olhar dele é capturado pela presença de Miles (Rish Shah, de Ms. Marvel, 2022) ou quando ela começa a pensar em Peter (Adam DiMarco, de The White Lotus, 2022) como mais do que apenas o namorado de uma de suas amigas?

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Seria somente mais uma dramédia juvenil como tantas outras, não fosse a qualidade da escrita de Skinner – os diálogos são envolventes e, em muitos casos, naturalmente engraçados – e a desenvoltura do elenco, por mais que muitos sejam não mais do que novatos na área, se destaca. A participação de veteranos agrega valor ao conjunto. Connie Britton e Kyle MacLahan, como os pais um tanto sem noção, garantem humor na medida certa, principalmente por não tomarem as atenções para si (há apenas um episódio dedicado a eles). Lukas Gage já é quase um selo de aprovação queer, enquanto que a musa Megan Fox aparece como ela mesma num formato meio que de sonho, garantindo um toque inesperado que acaba funcionando. Cada um ao seu jeito oferece aos condutores da trama o apoio necessário, tanto para não se tornarem excessivos, mas também para fazerem uso de uma versatilidade dramática bem vinda. O show, como não poderia ser diferente, é de Skinner. E ele manda bem tanto à frente como atrás das câmeras, mas sem ânsia por aparecer, dosando sua exposição com a dos demais reunidos.

Benny gosta de Carmen, mas não como ele, ou mesmo ela, gostaria. Carmen também gosta de Benny, mas não a ponto de sofrer quando entende o que, de fato, está acontecendo. Peter gosta mais dele do que de qualquer outro, e Miles não está muito interessado em revelar quem, de fato, está interessado. Reis e rainhas da formatura, fraternidades envolvidas com provas que desafiam o bom senso e paixões tão profundas, quanto passageiras, ocupam a maior parte dos oito episódios dessa primeira temporada de Muito Esforçado – o título, é claro, é uma referência ao desgaste quase físico destes em aparentar quem não são, quando tão mais fácil seria apenas relaxar e se mostrar como de fato é. E se a irmã megera – mas emocionalmente frágil – merecia quase um spin off de tão complexa que se mostra, talvez a maior crueldade seja mesmo o desfecho inesperado, inacabado e disposto a pegar qualquer um de surpresa. Ao deixar tudo em suspenso, Skinner fez uma aposta arriscada. Afinal, os que mergulharam com tudo deverão voltar com ansiedade redobrada num segundo ano. Aos demais, no entanto, será quase inevitável um gosto de traição – afinal, custava ter entregue um pouco mais?

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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