Crítica


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Sinopse

Oito habilidosos ladrões se trancam na Casa da Moeda da Espanha com o ambicioso plano de realizar o maior roubo da história e levar com eles mais de 2 bilhões de euros. Para isso, a gangue precisa lidar com as dezenas de pessoas que manteve como refém, além dos agentes da força de elite da polícia, que farão de tudo para que a investida dos criminosos fracasse.

Crítica

Ninguém para essa turma. A escalada de absurdos que teve início na primeira parte de La Casa de Papel dá uma alavancada bruta nesta segunda leva de episódios. A série continua a investir na tática de superar a inventividade das próprias viradas de roteiro, constantemente tentando surpreender e chocar o espectador mais que na cena anterior – prova que nem toda suposta "criatividade" é benéfica. A boa notícia é que isso torna tudo mais interessante, e agora chega num ponto em que a covardia dos roteiristas não tem mais espaço – é preciso assumir as consequências do que acontece.

A série poderia funcionar bem melhor se assumisse a caricatura como elemento narrativo, ao invés dessa insistência boba em se levar tão a sério. É embaraçoso como o projeto volta e meia emprega a câmera na mão para forçar uma urgência que jamais mascara os diálogos teatrais dos personagens. Ou o modo como tenta dramatizar certas reviravoltas com a trilha carregada – em dado momento, aliás, No Time for Caution, uma das faixas de Interestelar (2014), é plagiada na cara dura, sem créditos, inclusive. Há uma necessidade de adubar tudo com monólogos aborrecidos (que o seriado confunde com desenvolvimento de personagens), tentando, com isso, conferir maior dramaticidade e realismo a uma história cujo plano genial do tal Professor (Álvaro Morte) envolve irritar um policial treinado e contar com seu temperamento explosivo para conseguir, por tabela, desvirtuar uma prova coletada por ele (quê?).

Exatamente! As escolhas criativas, implausíveis de modo divertido, facilmente poderiam soar engraçadas e empolgantes se fossem tratadas assim. A cena da moto (você vai saber qual) é exemplo do quão mais descontraída poderia ser essa experiência – como não é, esse momento acaba sendo apenas risível. Já na reta final do assalto à Casa da Moeda espanhola, a segunda temporada não tenta mais esconder os artifícios novelescos utilizados para fisgar qualquer mínima atenção que lhe seja conferida – os ganchos a cada troca de cenário e até mesmo a mania de começar todo episódio com a última cena do anterior denunciam esse desespero.

Por outro lado, não tem mais como se esconder, os eventos finalmente passam a ter consequências reais. Mortes e desavenças começam a ser levadas a cabo, ainda que, entre os ladrões, continue existindo um inexplicável laço familiar que esvazia a tensão ou tira o peso de qualquer interação entre eles. Quando Nairóbi (Alba Flores) assume o comando do grupo e anuncia “que comece o matriarcado”, o protesto chega já banalizado, pois sabemos que aquela reviravolta não vai se manter – aliás, é impressionante a capacidade dessa gente de perdoar, dá para perder as contas das vezes que Berlim (Pedro Alonso) tenta executar um dos colegas só para que, no episódio seguinte, todos estejam do mesmo lado outra vez.

Aliás, para uma trama que bate tanto na tecla do machismo sistemático, existe um problema grave no modo como a narrativa trata o arco de Raquel (Itziar Ituño), que cada vez mais renuncia ao seu cargo, às ambições e à própria filha para seguir um homem que a enganou e humilhou. Mas, outra vez, parece fora de lugar querer cobrar coerência social de uma série que termina sem explicar porque Tóquio (Úrsula Corberó) é cooptada como narradora e protagonista – nunca fica explicado como ela tinha ciência do que houve do lado de fora, já que, em certa altura, o seriado simplesmente a abandona como fio guia. Poxa, a abandona como qualquer coisa. La Casa de Papel acaba sem se preocupar em pontuar desfecho para alguém. O que houve com os reféns? E o resto do bando? E os policiais? E o marido de Raquel?

Tudo bem que Tóquio não era a mais cativante das (anti) heroínas, mas depois de nos manter horas presos com aqueles personagens numa situação que não desenrola nunca, pelo menos poderia ter rolado uma despedida para cada um dentre os principais. Essa pressa em acabar só denota ainda mais o problema mais grave da produção: preguiça.

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é formado em Produção Audiovisual pela PUCRS, é crítico e comentarista de cinema - e eventualmente escritor, no blog “Classe de Cinema” (classedecinema.blogspot.com.br). Fascinado por História e consumidor voraz de literatura (incluindo HQ’s!), jornalismo, filmes, seriados e arte em geral.
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